Políticas sociais garantem a proteção dos direitos constituídos

Renata Bichir diz que é necessária uma comunicação clara sobre o que são políticas públicas para propiciar a integração social

 06/12/2023 - Publicado há 5 meses

Da Redação
Arte:
Carolina Borin*

Políticas mais clássicas, como Previdência, Saúde, Educação e algumas transversais, como as de cuidado e de cotas são apresentados em livro que tem como uma das autoras, a professora Renata Bichir da USP - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: Freepik, amonrat rungreangfangsai/Flaticon, small.smiles/Flaticon, Smashicons/Flaticon, kerismaker/Flaticon e Becris/Flaticon

Políticas mais clássicas, como Previdência, Saúde, Educação e algumas transversais, como as de cuidado e de cotas são apresentados em livro que tem como uma das autoras, a professora Renata Bichir da USP - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: Freepik, amonrat rungreangfangsai/Flaticon, small.smiles/Flaticon, Smashicons/Flaticon, kerismaker/Flaticon e Becris/Flaticon

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O terceiro volume da coletânea Descomplicando as Políticas Sociais no Brasil, intitulado de As Políticas Sociais por Elas Mesmas: Por Que Importam para Você e para a Sociedade como um Todo?, apresenta as políticas mais clássicas, como Previdência, Saúde, Educação e algumas transversais, como as de cuidado e de cotas.

Renata Bichir, professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo, pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) e uma das autoras do capítulo que aborda a importância da assistência social, discorre: “A gente precisa conseguir comunicar direitos com uma linguagem simples e acessível, como é que a gente pode reivindicar os nossos direitos se a gente nem os conhece?”.

Importância das políticas sociais

Segundo a pesquisadora, apesar de o Brasil possuir a Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, que garante uma série de direitos aos cidadãos, muitos deles não são compreendidos pelo povo. Além disso, ela indaga sobre como melhorar a qualidade do debate público acerca das políticas sociais e como alocar o recurso estatal para aqueles que mais precisam, a fim de criar uma sociedade mais justa e igualitária.

Na coletânea, de acordo com a autora, uma série de políticas públicas é tratada – como assistência social, transferência de renda e habitação – e não define especificamente o que seria uma ação social. “Existe na Constituição o tripé da Seguridade Social: Previdência Social, Saúde Pública e Assistência Social. Mas, além desses direitos, existe uma série de outros.” Ela complementa que, para efetivar a integração do cidadão no bem-estar social, a riqueza deve ser socialmente redistribuída por meio desses benefícios e serviços.  

Renata afirma que os direitos sociais não são imutáveis e se transformam à medida que a sociedade demanda por novas formas de inclusão e diversificação. Dessa forma, ela diz que o debate sobre equidade deve se sobrepor e a sociedade deve focalizar nos grupos vulneráveis, a fim de combinar a ideia de proteção universal à ideia de que existem pessoas fora dessa proteção.

Renata Bichir - Foto: Arquivo pessoal

Origem no Brasil

Conforme a professora, a estrutura da proteção social começou a ser instaurada no Brasil nos anos 1930 em um contexto bipolar, no qual houve a expansão de direitos sociais ao mesmo tempo no qual houve retração de direitos políticos. Isso ocorreu na chamada Era Vargas, quando foram criados os direitos trabalhistas, o Ministério da Educação e outras estruturas institucionais que estabelecem pilares do amparo coletivo, ou seja, o movimento era feito do Estado para a população.

Nesse cenário, a Constituição de 1988 foi responsável pela expansão da cidadania política, dos direitos sociais, dos direitos civis, os quais eram restritos a uma pequena parcela da população, e da incorporação de demandas populares — mediante a Assembleia Nacional Constituinte. “Quando tem essa política pública, a gente não está pensando só em um Estado em ação, estamos pensando em um conjunto de atores, movimentos sociais, organizações do terceiro setor, que se organizam para demandar que novos direitos sejam incluídos e para participar da provisão desse serviço”, discorre.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Tendo como princípio fundamental a proteção integral desse público, o marco legal garante direitos como o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização e à proteção ao trabalho, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar - Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Para ela, além da transição demográfica e do ciclo econômico, outros temas pautados na sociedade são responsáveis por modificar as políticas públicas, como o meio ambiente e os direitos da população LGBTQIA+ — os quais não eram pensados como assuntos de dever estatal. Ela também cita a temática da primeira infância, período de 0 a 6 anos do indivíduo, que deve ser particularmente protegido por um conjunto de obras coletivas.

Renata comenta que a proteção social implica integração entre várias políticas, não sua segmentação, e isso é feito mediante ações que visam a públicos específicos, os quais devem ser priorizados. “Todos aqueles chamados temas complexos, como população em situação de rua ou uso abusivo de álcool e outras drogas, não são facilmente contidos pelos setores governamentais”; ela questiona, então, como devem ser reorganizadas as políticas do Estado, em parcerias profissionais, civis e sociais, para que o direito seja garantido por lei.

Desafios

De acordo com a professora, a assistência social está deixando de ser uma ação descontínua e está atingindo o horizonte de serviços e benefícios estruturados, os quais possuem uma lógica territorial focada em um público específico. Por exemplo, é mencionado o Bolsa Família como um programa de transferência de renda já consolidado, que atinge populações em diferentes localidades por meio de estruturas das ciências sociais.

Renata afirma que uma sociedade complexa exige demandas específicas e exemplifica: “Uma família pobre, que mora numa área de risco e tem muitas crianças, possui necessidades de proteção específicas e está submetida a riscos diferentes de uma família de idosos em uma região central de cortiço, como São Paulo”. Para combinar indicadores e leituras de território com o objetivo de planejar políticas efetivas, conforme a pesquisadora, devem ser analisados profissionais que aprendam a cada urgência, pois as demandas públicas são transversais, isto é, são integradas e ultrapassam fronteiras administrativas. 

Usuários de drogas e moradores em situação de rua são deslocados da praça Júlio Prestes para a praça em frente à estação Julio Prestes, conhecida como praça do Cachimbo, na região da Cracolândia - Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Usuários de drogas e moradores em situação de rua são deslocados da praça Júlio Prestes para a praça em frente à estação Julio Prestes, conhecida como praça do Cachimbo, na região da Cracolândia - Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Caso isso não seja realizado, a segmentação dessas ações irá gerar um ônus que recairá sobre as famílias que, nesse caso, é um público vulnerável. “A pandemia resultou no aumento significativo da população em situação de rua, que tem uma nova demografia. Não é mais uma população majoritariamente masculina acima de 40 anos, agora são famílias inteiras na rua.” Ela ainda completa que está voltando a existir na sociedade a situação do trabalho infantil, temática que estava relativamente superada. Por fim, a autora ressalta que o papel do conhecimento na universidade é decompor as dimensões de complexidade dessas políticas públicas, por meio de uma comunicação mais clara e acessível.

*Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado


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