A situação atual no Oriente Médio é muito grave e deixa pouca margem para otimismo. Diante do horror de um conflito que se arrasta por muitas décadas, a proposta de coexistência de dois Estados, o Estado de Israel e o Estado da Palestina, é a mais relevante e consistente que já surgiu para a obtenção e consolidação da paz. Mas, atualmente, não soa nem um pouco promissora. Derivada dos chamados acordos de Oslo, celebrados entre israelenses e palestinos na capital da Noruega em 1993, essa proposta prevê o reconhecimento universal do território concedido em 1948 ao Estado de Israel pela Organização das Nações Unidas, a ONU. E, também, o reconhecimento universal das regiões da Cisjordânia e da Faixa de Gaza como territórios do Estado da Palestina.
O problema é que setores extremistas dos dois lados se opõem a essa proposta de dois Estados e buscam inviabilizá-la. O grupo palestino Hamas, que controla a região da Faixa de Gaza, defende a extinção do Estado de Israel e, por meio dos ataques que realizou no início deste mês de outubro, voltou a deixar evidente essa posição. De extrema violência, esses ataques tiveram por alvo não instalações e forças militares, mas a população civil israelense e até mesmo a população palestina, dada a certeza de que haveria retaliação por parte de Israel. Essa violência indiscriminada contra a população civil é que permite caracterizar o Hamas como um grupo terrorista. Do lado de Israel, as forças de extrema-direita, que já há vários anos vêm tendo ampla hegemonia política, atuam claramente para sabotar a viabilidade de um Estado palestino. Seja pela instalação forçada de assentamentos judaicos na região da Cisjordânia, seja por submeter a população da Faixa de Gaza a condições de vida atrozes. Essa postura, assim como a sistemática violação das Convenções de Genebra em suas ações militares, tornaram Israel destinatário de críticas contundentes por parte da ONU e da comunidade internacional.
É claro que, diante de uma realidade marcada por extrema violência, que ainda perdurará por um bom tempo, fica difícil imaginar uma saída. Por outro lado, esse quadro radicalizado, com a crescente interferência de outros países, serve para evidenciar que a paz só será possível se houver a acomodação entre israelenses e palestinos. Nenhum dos dois lados poderá pura e simplesmente eliminar o outro. Essa constatação traz de volta a percepção de que a existência de dois Estados que possam conviver é a única possibilidade para a conquista da paz.
É preciso que o Estado de Israel e a comunidade internacional deem passos concretos para viabilizar e reconhecer um Estado palestino efetivamente soberano, com fronteiras preservadas e capaz de assegurar direitos fundamentais e condições adequadas de vida a seu próprio povo. Isso exigirá o enfrentamento das forças políticas que, dos dois lados, se opõem a essa solução. Cabe observar que o Brasil já reconhece os dois Estados, acolhendo, inclusive, os respectivos embaixadores em Brasília. Poderá, assim, ter papel importante nesta grave conjuntura, tanto para ajudar na superação da seríssima crise humanitária como para contribuir na retomada de negociações que possam ter alguma chance de êxito.
Globalização e Cidadania
A coluna Globalização e Cidadania, com o professor Pedro Dallari, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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