A Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) promoveu nesta quarta-feira, dia 8 de maio, o encontro Fórum do Ecossistema de Inovação Paulista, que reuniu, no auditório do Centro de Difusão Internacional (CDI), representantes de governos, institutos de pesquisa e empresas para debater diferentes aspectos relacionados ao ecossistema de inovação paulista. O evento fez parte da programação especial comemorativa dos 90 anos da USP.
Para a vice-reitora da Universidade, Maria Arminda do Nascimento Arruda, é simbólico que esta discussão aconteça na USP e sua importância está ligada à necessidade de uma visão crítica na ciência: “Só há produção de conhecimento se tivermos uma inconformidade com o que já é existente. Esta gestão agregou a área de Inovação à Pró-Reitoria de Pesquisa, o que é um amadurecimento das políticas que a USP vem desenvolvendo neste campo. Agora, a Universidade trabalha para pensar e propor uma política estruturada, no sentido completo, o que envolve uma articulação de meios dirigidos a um mesmo fim”.
Maria Arminda lembrou que, como vice-reitora, preside a Comissão Permanente de Avaliação da Universidade, instância incumbida de fazer uma reflexão propositiva sobre as atividades acadêmicas e que tem como uma de suas vertentes o estímulo à pesquisa e à inovação. “Foi feito um diálogo profundo com avaliadores externos, que nos entregaram pareceres valiosos para pensar nossa política de inovação. Eles chamam a atenção sobre os instrumentos que estamos construindo, como centros de inovação e transferência de tecnologia, escritórios de fomento e proteção intelectual, além de uma regulação institucional adequada”, afirmou.
Por fim, a vice-reitora fez uma avaliação sobre momentos históricos que o País já viveu nesta área: “Em um livro de 1964, sobre o empresariado brasileiro [Empresário industrial e desenvolvimento econômico no Brasil], Fernando Henrique Cardoso, que é docente aposentado da USP, fez uma análise sobre a indústria paulista e revelou antecipadamente algo que veio a ficar claro muito depois. Em sua minuciosa pesquisa, ele percebeu que a questão da inovação era descartada pelo empresariado por motivos estruturais. De um lado, porque o próprio Estado acabou sendo um agente, e, por outro, porque o Brasil estava num ritmo de crescimento tão rápido que se entendia não valer a pena inovar, mas sim importar. Naquele momento, não se incorporou ao processo produtivo aquilo que hoje chamamos de inovação. Depois, tivemos um outro momento, nos anos de 1990, em que a dinâmica do mundo global afastou a solidificação de oportunidades neste campo. E, hoje, vivemos uma nova oportunidade, ímpar, que não podemos perder, ligada a uma consciência fundamental de construção de uma política ambiental e uma economia verde”.
O pró-reitor adjunto de Inovação, Raul Gonzalez Lima, salientou que “nas celebrações de 90 anos da USP, não poderia faltar uma discussão visando tornar mais visível o ecossistema paulista de inovação, que é considerado, por alguns estudos internacionais, o maior da América Latina e, como organismo complexo e vivo, requer cuidado refletivo e personalizado, pois, apesar de vibrante e pujante, ele precisa ser cuidado”.
Lima explicou as nuances que envolvem essa discussão: “Existe uma granularidade que a gente precisa perceber e cada ator do sistema precisa olhar e entender para que tudo funcione bem. Existe um conceito interessante a respeito da ideia de ética que diz que a maior parte dos erros éticos que são cometidos acontecem pela falta de percepção dos bens sociais e coletivos, que são geralmente abstratos e, por isso, acabam não sendo notados e, assim, são ofendidos sem intenção. O ecossistema é um desses bens que, apesar de ser muito concreto em cada um de seus aspectos, é parcialmente abstrato como conjunto. Por isso, precisamos tê-lo em mente para não o afrontarmos”.
O papel dos governos e empresas
O secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação de São Paulo, Vahan Agopyan, que já foi reitor da USP, afirmou considerar de suma importância que todos os envolvidos possam trabalhar conjuntamente na construção de modelos: “É importante aprender com os outros para não cometermos os mesmos erros, mas os ecossistemas são peculiares a cada região. Por isso, precisamos ter a coragem de desenvolver o nosso próprio”.
Agopyan apontou, também, aspectos que ainda demandam maior atenção: “É necessário, ainda, conseguir maior segurança jurídica para um uso efetivo de leis como a Lei do Bem ou a Lei de Inovação, que são pouco utilizadas, além de trabalhar a mudança cultural nas empresas, pois não adianta recorrer às pesquisas das instituições científicas sem ter, internamente, pessoal capacitado a dialogar com esses dados”.
Dois Ministérios do Governo Federal estiveram representados nas discussões. A assessora técnica do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Fabiana Villa Alves, afirmou que “os ecossistemas de inovação são um assunto importante no ministério por causa de pautas emergentes e inovadoras que hoje são prioritárias para o Brasil, como bioenergia, descarbonização, bioindústria, selos verdes, biomassa, bioinsumos, questões climáticas e outros. Nós, da esfera executiva do governo, temos abordado esses temas sob a ótica conhecida como ‘tripla hélice’, ou seja, com participação ativa do setor público, do setor privado e a academia com um papel crucial, trazendo os elementos fundamentais para permitir o desenvolvimento de políticas públicas que sejam efetivamente embasadas em ciência”.
Já o secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), Guila Calheiros, destacou a importância de um debate como este na USP: “Em seus 90 anos de história, esta Universidade tem sido protagonista do desenvolvimento dos ecossistemas de inovação e tecnologia. Ela é fundamental não só do ponto de vista de pesquisa, ciência e desenvolvimento tecnológico, mas também para levar esse conhecimento e essa tecnologia para a sociedade, com serviços, produtos e com a cooperação que mantém junto a instituições e empresas. O que garante que um ecossistema seja pujante, como é o paulista, vai além de estruturas disponíveis, mas passa principalmente pelos seus agentes e sua capacidade de integração, compartilhamento e articulação de uma estratégia comum, com clareza do papel de cada um”.
A presidente da Associação Brasileira de Startups (ABStartUp), Ingrid Barth, avaliou que os ecossistemas de tecnologia e startups brasileiros são muito bons em relação ao cenário mundial: “Somos pioneiros em vários temas e frentes, mas ainda precisamos aprender a mostrar nossa face de vanguarda, que é o lugar que merecemos. Isso será muito relevante nos próximos anos, nas discussões mundiais sobre temas como clima, bioenergia e transição energética. Podemos ter bastante autoestima nessa área e, principalmente, liderar processos”.
A programação do dia contou, ainda, com a participação on-line de Maria Sobron Bernal, da Entrepreneurship Education, Collaboration and Engagement Network, um braço da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que vem estudando os ecossistemas de inovação da América Latina. “Estamos muito impressionados com o que temos visto em São Paulo e estamos trabalhando com parceiros daqui para testar novas diretrizes mundiais neste ambiente, sempre atuando com diversos tipos de atores, como a sociedade civil, empresas, governos e universidades em prol de uma política internacional que estimule uma cultura empreendedora”.
Grupos de discussão
Após a abertura, o público se dividiu em reuniões paralelas, em quatro salas, para discussões sobre temas específicos, que geraram reflexões e propostas.
Um dos grupos analisou o ambiente jurídico de inovação, tendo como principal abordagem a discrepância entre leis de diferentes níveis, além de gargalos e dificuldades relacionadas à insegurança jurídica e à aplicação das leis, concluindo por uma necessidade de maior diálogo institucional para a construção de soluções conjuntas com legisladores e, especialmente, com os órgãos de controle.
Outra equipe, incumbida de discutir o porquê de o número de doutores contratados pelas empresas do setor privado ser baixo no Brasil, comparativamente a outros países que apresentam bom desempenho em inovação, chegou à conclusão de que parte do problema está relacionada aos altos custos que esse tipo de contratação implica dentro do contexto tributário brasileiro, além das características da formação acadêmica, direcionada à docência.
Entre os temas, também foram discutidos os escritórios de integridade na pesquisa e segurança cibernéticas. Neste caso, os debatedores apontaram a urgência de serem criadas ferramentas que ajudem a mitigar o conflito de interesses, especialmente nos momentos de transferência do conhecimento.
Já o assunto “modelos teóricos de ecossistemas de inovação” foi desenvolvido de forma a pontuar a importância da diplomacia científica e da retroalimentação e propagação como modelos, nos quais governos atuem como “pedras no lago” e academia e empreendedores estejam próximos, em constante interação e relação de disponibilidade.
Assista, a seguir, à gravação da abertura do evento e das relatorias das discussões paralelas: