As apresentações das óperas Gota Tártara: Uma Ópera-Pesadelo; Entre-Veias: Uma Ópera de Entranhas e Casa Verdi: Meta-Ópera em Ato Único, produzidas pelo Atelier de Composição Lírica do Theatro São Pedro, acontecem nos dias 26, 27, 28 (às 20 horas) e 29 (às 17 horas), no Theatro São Pedro (Rua Barra Funda, 171, Barra Funda, em São Paulo). Os ingressos podem ser adquiridos on-line. Mais informações estão disponíveis no site do Theatro São Pedro.
Theatro São Pedro apresenta três óperas brasileiras inéditas
Com direção da doutoranda da USP Ines Bushatsky, obras serão exibidas nesta semana
Texto: Rebeca Fonseca*
Arte: Carolina Borin**
Cena de Entre-Veias: Uma Ópera de Entranhas - Foto: Divulgação/Theatro São Pedro
A rotina de Ines Bushatsky nos últimos meses foi intensa. A doutoranda em Artes Cênicas pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP assina a direção cênica de três óperas inéditas, que serão apresentadas nesta semana no Theatro São Pedro, em São Paulo. A estreia das três peças – cada uma com cerca de 20 minutos de duração – acontece nesta quinta-feira, dia 26, às 20 horas. Depois, elas voltam a ser exibidas na sexta-feira, dia 27, no sábado, dia 28 – sempre às 20 horas -, e no domingo, dia 29, às 17 horas.
A primeira ópera a ser apresentada é Gota Tártara: Uma Ópera-Pesadelo, composta por Franciele Regina, com libreto de Sofia Boito. A história acompanha uma mãe e seu filho vivendo em uma situação de insegurança alimentar extrema. A realidade e o sonho se confundem e a mulher nunca consegue fugir do pesadelo da fome.
“Na encenação, nós escolhemos dividir o espaço da cena entre o inconsciente-pesadelo e o espaço do presente, onde ela vive a tragédia”, explica Ines. Os cenários têm simbologias opostas: um supermercado, que representa a bonança, se opõe ao espaço de dúvida e desafio sobre o que fazer diante da fome. A diretora antecipa que a ópera tem um desfecho trágico.
A diretora Ines Bushatsky, doutoranda na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP - Foto: Nicolle Comis
Em seguida, será encenada Entre-Veias: Uma Ópera de Entranhas, composta por Giovanni Porfirio, com libreto de Jaoa de Mello. Aqui, um vírus ganha vida através dos diferentes cantores solistas e acompanhamos suas tentativas de comunicação com os espectadores.
“A ópera tem um movimento de corporificação; é algo que vai ganhando corpo e voz”, afirma Ines. A encenação segue a proposta do enredo de dar substância a um ser inanimado. “As materialidades da cena seguem o mesmo caminho, vão ganhando forma para trazer à tona a comunicação que o vírus quer fazer”, detalha a diretora.
Por último, será apresentada Casa Verdi: Meta-Ópera em Ato Único, de Caio Csizmar e libreto de João Crepschi. A obra recupera figuras históricas da ópera em um embate entre tradição e contemporaneidade. Grandes cantores de ópera, como Maria Callas, Renata Tebaldi, Luiza Tetrazzini e Luciano Pavarotti, são alguns dos personagens.
O título dessa ópera faz alusão a um retiro para cantores aposentados criado pelo compositor italiano Giuseppe Verdi, no século 19. Antes de abrigar os cantores, a Villa Sant’Agata, no norte da Itália, era a moradia de Verdi, que determinou que os direitos autorais de suas obras fossem utilizados para a criação do retiro após a sua morte.
O local se tornou um museu com documentos pessoais, instrumentos musicais e fotografias, mas hoje está fechado por uma disputa de herdeiros. Na encenação, um teatro foi criado para representar o retiro. “Há um borrão entre lembrança e realidade, os artistas lembram as suas grandes carreiras e começam a ter devaneios”, explica Ines. Há ainda uma crítica sobre a especulação imobiliária na cidade de São Paulo, com a iminente demolição do teatro em que, na ópera, os cantores estão abrigados.
“O processo da ópera é mais rápido e mais intenso, tem menos tempo para ensaios e eles acontecem todos os dias”, explica a diretora sobre a diferença entre dirigir peças operísticas e teatrais. “Eu fico em constante comunicação com o diretor musical para entender o que fica mais legal na música e na cena.” Ines já dirigiu quatro espetáculos teatrais, sendo Dr. Anti, que trata de negacionismo e da ascensão da extrema-direita ao poder, seu trabalho mais recente.
Segundo a diretora, o processo de direção cênica das óperas se inicia com o levantamento da cena, ou seja, o entendimento e a criação das ações, para depois unir o trabalho com a orquestra. Ines esclarece que a parceria com o diretor musical é fundamental para aliar o drama à música.
Giuseppe Verdi (no centro, sentado), em sua casa na Villa Sant’Ágata - Foto: domínio público
Atelier de Composição Lírica estimula produção de óperas
Ines Bushatsky começou a trabalhar com ópera em 2021, mas já dirigia teatro desde 2017. Ela fez estágio em direção cênica no Theatro São Pedro, onde, em 2021, acompanhou a primeira edição do Atelier de Composição Lírica, que agora promove as três óperas em uma segunda rodada do programa.
Mantido pelo Theatro São Pedro, o Atelier de Composição Lírica estimula a composição de óperas inéditas e oferece aulas teóricas e práticas como parte do programa de formação. Os selecionados participam de orientações com especialistas, workshops com a orquestra do teatro e encontros para discussão das obras operísticas. Como estímulo, os participantes recebem uma bolsa de R$ 6 mil.
As inscrições para a terceira edição do Atelier de Composição Lírica estão abertas até esta quarta-feira, dia 25, no site do Theatro São Pedro. Serão selecionados três compositores e três libretistas, sendo que duas vagas estão reservadas para mulheres.
Para Ines, a ópera está ganhando mais atenção recentemente. A diretora nota que grandes instituições culturais, como o Theatro São Pedro e o Theatro Municipal, também de São Paulo, estão elaborando programações especialmente voltadas para a formação de um público mais jovem, com a perspectiva de atrair novos espectadores.
Além de se dedicar ao trabalho de direção, Ines pesquisa a pedagogia das artes cênicas há dez anos. No seu doutorado, na ECA, ela analisa o entrecruzamento do teatro e do cinema. O conceito do falso também faz parte de sua pesquisa e é o centro do núcleo F de Falso, coordenado por Ines como extensão da Cia. Extemporânea de Teatro e Cinema, fundada por ela em 2015 no Departamento de Artes Cênicas (CAC) da ECA.
*Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro
**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado
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