Peça “Calmaria” reflete sobre encontros e conflitos familiares

Em cartaz nesta semana no Teatro da USP, espetáculo foi produzido por estudantes da Universidade Federal de São João del-Rei

 19/02/2024 - Publicado há 2 meses     Atualizado: 21/02/2024 as 16:28
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Estudantes de Licenciatura e Bacharelado em Teatro da Universidade Federal de São João del-Rei, que produziram a peça Calmaria em parceria com professores e profissionais da área – Foto: Divulgação/Priscila Natany

 

Após o sucesso de suas duas temporadas na cidade de São João del-Rei, em Minas Gerais, a peça Calmaria será exibida nesta semana no Teatro da USP (Tusp). A montagem possui roteiro original, escrito por Maria Clara Ferrer e Thiago David, e foi produzida por alunos e alunas do Departamento de Artes da Cena da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Em cartaz de 22 a 25 de fevereiro, o espetáculo mineiro tem entrada franca.

O enredo acompanha a família Maranhão, composta de 14 personagens pertencentes a quatro gerações diferentes, e seu cotidiano vivido num barco em alto-mar, o Calmaria. O conflito inicial da peça se dá na expectativa da chegada de Simone, filha do patriarca Alcino, que decidiu abandonar o barco para viver em terra firme. Dividido em quatro atos, o espetáculo se aprofunda nas tensões familiares e traz à tona segredos e ressentimentos, resultados de uma estrutura familiar patriarcal em colapso. A peça explora sentimentos como o luto, a maternidade e as questões sexuais e afetivas que surgem da convivência em um espaço limitado. “É uma peça que fala muito sobre os ‘ditos’ e os ‘não ditos’, aquelas coisas que não somos capazes de colocar para fora e que acabam ficando entaladas. Todos esses sentimentos guardados eventualmente geram uma série de conflitos”, conta Maria Clara Ferrer ao Jornal da USP.

Maria Clara Ferrer e Thiago David, criadores e diretores da peça – Foto: Divulgação/Instagram/@calmariaespetaculo

Professora do Departamento de Artes da Cena da UFSJ, que atuou como diretora e dramaturga do espetáculo, Maria Clara explica alguns dos simbolismos e significados ocultos dos elementos da obra: “A figura do barco é uma metáfora para uma célula familiar, a ideia de que estão todos ‘no mesmo barco’”. Outro elemento cenográfico importante para a trama é a mesa de jantar. “Ela é um símbolo da união familiar, do encontro dos membros e onde tudo acontece. Nossa mesa é suspensa, então desde o início passa uma sensação de instabilidade, e ao longo da peça é possível ver sua estrutura física se deteriorando à medida que as relações familiares se abalam.”

Maria Clara conta ainda sobre a relevância de figuras que reforçam a falta de comunicação e os relacionamentos conturbados: “Um dos personagens mais interessantes é o Julinho, uma criança que morreu aos 45 dias de vida e que atua como uma espécie de fantasma da família, aparecendo em certos momentos para revelar ao público segredos e devaneios que são intrínsecos à trama, assumindo um papel similar ao de um narrador”.

A luz e sonoplastia também são essenciais para a caracterização da peça e seu andamento. No terceiro ato, quando os conflitos estão no auge e o público penetra na subjetividade dos personagens, a iluminação mais escura — com poucos refletores e muitos jogos de sombra — reforça a impressão de se estar realmente no coração do conflito. Dessa mesma forma, os sons não se limitam à música e ruídos de mar, mas constantes rumores e vozes abafadas, que representam “os sons inconscientes da família, os gritos não dados, os segredos escondidos”, conta a diretora.

A peça se originou em uma disciplina acadêmica sobre montagem, a partir de um processo artístico-pedagógico idealizado por Maria Clara, e envolve 30 alunos do curso de Teatro, divididos em cinco núcleos diferentes, cada um contando com um mentor profissional: direção, atuação, plasticidades, VLS (vídeo, luz e som) e produção. A divisão em núcleos é fruto de um viés mais amplo do curso, que procura formar não apenas atuantes, mas profissionais com conhecimento das diferentes áreas que estão envolvidas na montagem de uma peça, e foi essencial na trajetória de diversos alunos, segundo Maria Clara. “No começo todo mundo queria atuar, mas depois foram descobrindo novas facetas da produção. Teve gente que se apaixonou por iluminação e hoje está criando coisas lindas, ou que descobriu um dom para direção.” 

A iluminação mais escura ajuda o público a imergir no conflito – Foto: Divulgação/Gustavo Travenisk

 

Calmaria estreou em julho de 2023, no prédio do curso de Teatro da UFSJ, em cinco dias consecutivos de apresentações que lotaram o espaço. A segunda temporada, em dezembro de 2023, também foi um sucesso de audiência. O êxito do espetáculo se deve em grande parte às estratégias de divulgação, não apenas as virtuais, mas também a tradicional “boca a boca” e a distribuição de panfletos na cidade, destaca Maria Clara. 

O elenco foi convidado a se apresentar no Teatro da USP pela repercussão positiva na cidade natal, confirmando sua participação no final do ano passado. Segundo Maria Clara, a vinda para São Paulo representa um aumento da visibilidade da realidade e das experiências de uma universidade federal do interior de Minas Gerais. Os ingressos já estão esgotados no site, mas uma quantidade foi reservada para venda na entrada do Tusp, por ordem de chegada.

A peça Calmaria fica em cartaz entre 22 e 25 de fevereiro, de quinta a sábado, às 20 horas, e domingo, às 19 horas, no Teatro da USP (Rua Maria Antonia, 294, Vila Buarque, em São Paulo, próximo às estações Santa Cecília e Higienópolis-Mackenzie do metrô). Os ingressos são gratuitos. Duração: 120 minutos. Os ingressos podem ser adquiridos na bilheteria, uma hora antes dos espetáculos. Mais informações estão disponíveis pelo telefone (11) 3123-5222.

*Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro


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