“Os museus são uma espécie de oásis, onde podemos nos reinventar e ter uma interação mais criativa com o mundo”. É assim que Ana Gonçalves Magalhães, diretora do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, define essas instituições culturais. Durante parte da pandemia, esse “oásis” teve seu funcionamento restringido. Segundo a Unesco, apontando levantamento realizado a partir de dados colhidos em 87 países, os museus tiveram, em média, uma queda de 70% no número de visitantes durante o ano 2020 em comparação com 2019. Essa mudança acabou colocando novos desafios e exigindo novas soluções para os gestores desses espaços culturais.
O MAC, por exemplo, ficou fechado de março a dezembro de 2020. A economia com gastos em limpeza e segurança realizada nesse período possibilitou o financiamento de novas exposições no museu. Foi o caso da mostra Regina Silveira: Outros Paradoxos, que contou com 180 trabalhos da artista visual gaúcha.
Esse esquema de financiamento foi viabilizado pelo programa USP Eficiente, que permitiu a flexibilização do uso da economia orçamentária em investimentos estratégicos e emergenciais.
Crise na cultura
Ainda assim, no que concerne a investimentos financeiros, a realidade de museus brasileiros não é das mais favoráveis. Esses espaços culturais podem estar entre os beneficiados pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC), ou Lei Rouanet. A lei em questão dispõe de vários mecanismos de fomento a atividades culturais. Independentemente deles, quem tem a função de apreciar projetos culturais com incentivos fiscais é a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC).
A CNIC não tem poder decisório definitivo, mas é uma instância importante no processo de analisar projetos culturais brasileiros. Contudo, em julho de 2021, através do decreto 10.755, a CNIC perde sua importância ao passar a ser acionada somente na instância recursal da análise de projeto. Especialistas já indicaram preocupação, pois o caráter democrático do colegiado é minimizado.
Ana Maria também percebeu que as atividades do museu foram prejudicadas por um represamento de recursos vindos da LIC. “Isso certamente vai ser um desafio para o museu enfrentar, porque nós pensávamos em planos de captação de recursos que já desde o ano passado demonstraram que não vão funcionar”, afirma.
Segundo dados consultados no portal Salic, que afirma garantir transparência às atividades do extinto Ministério da Cultura (atualmente a pasta corresponde à Secretaria Especial de Cultura, localizada no Ministério do Turismo), o valor captado via Lei Rouanet em 2021 até outubro está em R$ 460 milhões. Para se ter uma ideia, 2020 terminou captando quase R$ 1,5 bilhão.
Novas possibilidades
Em meio a um cenário de dificuldades, seja com aquelas impostas pelo isolamento social, seja com as atreladas aos incentivos financeiros, gestores de museus precisaram buscar novas soluções. Sem o público frequentando esses espaços, a saída foi investir no ambiente virtual.
“A pandemia acelerou um processo que já vinha sendo explorado ainda lentamente pelos museus, que é a sua mediação com o público através da dimensão digital”, afirma Ana Gonçalves, lembrando do uso mais intenso do site dos museus e das redes sociais. Nesse último caso, o Instagram do MAC chegou a ser “invadido” por intervenções de diversos artistas, como foi o caso de Gustavo von Ha, que deve ter uma exposição presencial no primeiro semestre de 2022.
O uso do ambiente virtual para mediar a relação com o público dos museus já é amplamente difundido ao redor do mundo. A professora Ana lembra de dois casos emblemáticos: o do Rijksmuseum, em Amsterdam, na Holanda, que investiu em uma curadoria digital enquanto passava por reformas, de 2003 a 2013; e o Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque, que conta com ferramentas de ensino online da história da arte.
Essa extensão dos museus, porém, requer investimentos diversos, isto é, “exige do museu um aporte financeiro imenso, e toda uma equipe contratada só para isso. Não basta você querer fazer as ações na rede social, você precisa ter infraestrutura para isso”, afirma Ana. “E isso nem sempre está previsto nos orçamentos (dos museus)”, complementa.
Museus como refúgio cultural
Apesar dos pesares, os museus ainda se apresentam como espaços culturais importantes dentro da sociedade e podem atender a perspectivas diversas, que vão desde uma ação educativa até o entretenimento. “A arte e a cultura são fundamentais para a vida humana. A nossa vida fica muito pobre sem elas”, analisa Ana.
Na retomada das atividades presenciais, a diretora do MAC notou que muitos ainda priorizam frequentar museus: “Com a reabertura para o público, percebemos a saudade das pessoas e a falta que isso (museus) fazia na vida delas. Então, de fato, os museus pós-pandemia têm esse papel muito importante”, relata.
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