Estratégia do governo para reduzir emissões de metano não é efetiva, avalia especialista

Pedro Luiz Côrtes explica que, na prática, a medida transforma o gás metano em CO2, que precisaria ser recapturado

 25/03/2022 - Publicado há 2 anos
A alternativa do etanol é relevante, pois o País tem a infraestrutura, a distribuição e o mercado consumidor  – Foto: Reprodução/Wikimedia Commons
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No dia 22 de março, foi publicado o decreto nº 11.003, que institui a Estratégia Federal de Incentivo ao Uso Sustentável de Biogás e Biometano. Esse decreto tem como objetivo contribuir com os compromissos assumidos pelo País no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima do Pacto Climático de Glasgow e também o Compromisso Global de Metano. O governo sinalizou com a redução, ou ao menos a suspensão de impostos, de linhas específicas de financiamento. Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, o professor da Escola de Comunicações e Artes da USP e também do Instituto de Energia e Ambiente da USP, Pedro Luiz Côrtes, explica a ideia do governo de que o metano seja utilizado em substituição aos combustíveis fósseis, especialmente o diesel. 

O biometano é gerado a partir dos resíduos de origem do meio urbano e rural, como no tratamento de esgoto e na cadeia do agronegócio. O metano é o principal componente do gás natural, ou seja, ao reduzir esse gás, diminui o gás estufa. Apesar de o metano ser mais potente que o dióxido de carbono (CO2), ele permanece menos tempo na atmosfera.

Pedro Luiz Côrtes – Foto: IEA USP

O Brasil é o quinto maior produtor de metano, mas se comprometeu em minimizar a emissão desse gás ao assinar o Pacto Global na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas – COP26. O professor descreve que a intenção do governo é que o metano seja utilizado em substituição ao diesel e ao óleo combustível (ambos derivados do petróleo). Nesse balanço, deve ser considerado que a queima do metano gera CO2 para geração de energia. O dióxido de carbono é um gás menos intensivo para a geração de efeito estufa, porém ele permanece muito mais tempo na atmosfera e não é recapturado, de acordo com Côrtes. Por exemplo, com a queima do biocombustível, como o etanol, é eliminado o CO2 na atmosfera. Entretanto, pelo processo da fotossíntese, no plantio da próxima safra, esse CO2 é recapturado. No etanol, esse ciclo é praticamente fechado, e isso não acontece com a queima do metano, seja de origem fóssil ou de material orgânico.

O governo tem a intenção de que o metano seja utilizado no lugar do diesel, seja para movimentar tratores ou caminhões, assim criando uma independência do diesel. Entretanto, essa estratégia não considera a recaptura do CO2 emitido. “Na prática, não estamos reduzindo a geração de metano, estamos transformando metano em CO2. Não é uma política efetiva de fato”, relata o professor.

Outras alternativas

“Já a alternativa do etanol é relevante, já que temos a infraestrutura, a distribuição e o mercado consumidor. Entretanto, o governo esquece da parte de biocombustíveis, embora seja um grande defensor do agronegócio. A única medida recente foi a redução do imposto do etanol para tentar reduzir o preço na bomba, mas não há política de difusão do etanol em todo o País. Não há uma perspectiva de solução”, explica Côrtes.

Ele conta que, na prática, com o aumento da emissão de CO2, não haverá a recuperação desse gás, porque o governo não regulamenta o crédito de carbono, o que seria baseado, principalmente, na recuperação florestal. “Um programa efetivo será um mercado de metano associado com a recuperação florestal, já que as árvores capturam o CO2”, acrescenta o professor.


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