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Como a pandemia afetou e continua expondo nossas fragilidades
Neste período de quarentena, fizemos um balanço do que nos tocou mais profundamente, expondo os benefícios, assim como as mazelas, advindos do isolamento social, com dicas importantes de especialistas da Universidade, conforme a relação de matérias que você poderá seguir abaixo
Arte sobre foto: Cleber Siquette/Jornal da USP
Num ano em que o mundo parou em consequência da pandemia de coronavírus e da contaminação e morte de centenas de milhares de pessoas em todo o planeta, a questão de como sobreviver à covid-19 passou a reger as relações entre as pessoas, que passaram então a adotar as regras prescritas pelas autoridades como forma de prevenção à crise sanitária que se instalava, a saber: o uso de máscaras, a higienização rigorosa e sistemática das mãos com álcool em gel e, sobretudo, o isolamento social. As pessoas foram obrigadas a trocar a vitalidade pujante das ruas pela privacidade dos lares, num movimento de enclausuramento e confinamento a que foram levadas pela necessidade do momento. Era isso ou a vida estaria em risco.
Enquanto nos hospitais a intensa luta para salvar vidas seguia seu caminho, muitas vezes com insucesso, o isolamento no interior das residências nem sempre significou segurança. Interiorizadas dentro de si mesmas e em suas residências, as pessoas passaram a viver dramas pessoais que talvez já existissem, mas que foram exacerbados pela pandemia. A violência doméstica, uma triste realidade já existente, sobretudo contra as mulheres, aumentou durante o período de quarentena. Quadros de insônia se agravaram devido às incertezas do amanhã, configurando um quadro de insegurança psicológica que não poupou nem crianças nem adolescentes, tanto que as buscas sobre transtorno mental na internet bateram recordes.
Não era para menos. As pessoas se sentiam acuadas, temerosas, incapazes de fazer planos para o futuro e, principalmente, encaravam a morte de uma forma como nunca acontecera até então. A ameaça de contrair o coronavírus rondava a vida de todos nós e estava à espreita toda vez em que éramos forçados a sair de nossas casas para cumprir atividades cotidianas e rotineiras, como a de fazer compras, por exemplo. O home office tornou-se norma, mas até essa alternativa possuía vantagens e desvantagens, como você poderá acompanhar pelo roteiro de matérias que preparamos abaixo.
A Rádio USP não deixou em nenhum momento de informar sobre o que estava acontecendo lá fora, nas ruas, nos hospitais, valendo-se para isso de professores, pesquisadores e cientistas de renome internacional. Acompanhe o que foi feito durante o período de quarentena, ao longo do qual tentamos mostrar como a pandemia afetou a todos e a cada um de nós em particular. Para tanto, trouxemos à luz os temas os mais variados, buscando dar conta da complexidade gerada pela crise sanitária em nossas vidas, em seus múltiplos aspectos, tanto físicos como psicológicos e emocionais.
Aumenta preocupação com consumo de alimentos ultraprocessados durante pandemia
Os brasileiros estão consumindo mais alimentos ultraprocessados durante a pandemia. Conforme estudo realizado pelo Datafolha, sob encomenda do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o consumo de ultraprocessados na faixa etária dos 45 a 55 anos saltou de 9% em 2019 para 16% durante a pandemia, neste ano, o que é desaconselhável por ser essa faixa etária a que mais sofre com sobrepeso e obesidade. Já o estudo NutriNet Brasil aponta que o consumo desse tipo de alimento aumentou nas regiões Norte e Nordeste e no estrato de menor escolaridade da pesquisa. Quem trata desse tema é a professora Renata Bertazzi Levy, da Faculdade de Medicina da USP e integrante do estudo NutriNet Brasil.
Violência contra a mulher vai muito além da agressão física
“No começo era tudo perfeito. Ele era uma pessoa incrível e maravilhosa com quem eu queria me casar.” Essa é uma memória comum de inúmeras mulheres que, assim como a estudante de psicologia Alana Vieira, sobreviveram a um relacionamento abusivo. Na maioria dos casos, essas histórias começam bem, mas terminam em agressões físicas, psicológicas, sexuais ou morte. Segundo a médica Renata Abduch, responsável pelo Serviço de Atenção à Violência Doméstica e Agressão Sexual (Seavidas) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP, a violência traz marcas que essas vítimas não carregam apenas na pele, mas também na saúde física e mental.
Consequências da pandemia agravam quadro da insônia no Brasil
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, cerca de 40% dos brasileiros sofrem de algum distúrbio de sono. E a pandemia e suas consequências pareceram piorar o quadro. Entre abril e maio, quando começavam as medidas mais rígidas de isolamento, a palavra “insônia” foi a mais procurada no Google. Já a pesquisa por “remédio para insônia” aumentou 130%. O professor Alan Luiz Eckeli, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, comenta como a insônia se relaciona com o surto de coronavírus.
Efeitos da pandemia em crianças e adolescentes preocupam especialistas
Os efeitos da pandemia e da quarentena nas crianças e nos adolescentes se manifestam de formas diversas, porque esses grupos estão em momentos diferentes da vida e da sua própria construção como indivíduos. No caso dos jovens e adolescentes, é no grupo social, na convivência com os amigos, que o desenvolvimento da identidade acontece. “Por isso, vemos adolescentes sofrendo bastante, apesar de vermos também muitos não ligando para esse quadro. Há situações mais dramáticas”, diz Guilherme Polanczyk, professor associado do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina (FM) da USP.
Buscas sobre transtornos mentais no Google apresentaram alta de 98%
A pandemia trouxe uma grande insegurança e questionamentos para a população. Buscas sobre transtornos mentais na internet bateram recorde. Os números em 2020 apresentaram uma alta de 98% se comparados aos últimos dez anos, segundo dados fornecidos pelo Google ao jornal O Estado de S. Paulo. No entanto, na opinião de Christian Dunker, psicanalista do Instituto de Psicologia da USP, o aumento pode estar associado à covid-19 e à pandemia, mas outros fatores também podem ter contribuído para esse resultado.
Novos usuários de internet são mais propensos a cair em golpes virtuais
A necessidade de distanciamento social causada pela pandemia tornou a internet o principal meio para dar continuidade ao trabalho ou estudos, o que revela a cibersegurança como fundamental para que a navegação ocorra sem qualquer prejuízo aos usuários. Segundo Marcos Simplício, do Departamento de Engenharia da Computação da Escola Politécnica, os golpes aumentaram devido à maior quantidade de pessoas on-line, portanto, é essencial pensar em ferramentas de segurança que antecedam a criatividade dos fraudadores e protejam os usuários.
Pandemia agravou os riscos da pornografia e do vício em sexo pela internet
Carmita Abdo, professora associada da Faculdade de Medicina (FM) da USP, fundadora do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Departamento de Psiquiatria (IPq) da mesma faculdade, revela que há uma preocupação dos especialistas em relação aos riscos da pornografia on-line e do vício em sexo pela internet, em especial com aqueles que já possuem uma predisposição a tornarem-se adictos a essa situação. “As pessoas vão perdendo o controle aos poucos e só o percebem quando de fato não conseguem mais seguir com seu cotidiano”, explica. Ela observa que a pandemia agravou os riscos, o que pode ser percebido pela procura por tratamento a partir da consciência das pessoas.
A difícil arte de se tornar adulto faz adolescência se prolongar
A saída da casa dos pais e a busca por independência financeira, afetiva e emocional têm acontecido cada vez mais tarde. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o prolongamento ou o retorno da convivência familiar entre pais e filhos adultos apresentaram aumento de mais de 25% em 2015. Quem fala sobre o tema é Lucas dos Santos Lotério (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP).
Arte sobre foto: Cleber Siquette/Jornal da USP
Sintomas desencadeados pelo cansaço visual têm impacto direto na qualidade de vida
Passar horas em frente ao computador, celulares e aparelhos eletrônicos faz parte da rotina de muitas pessoas. Por meio deles, é possível trabalhar, estudar e também se divertir. Porém, o uso prolongado dessas ferramentas pode causar a Síndrome Visual Relacionada a Computadores (SVRC), um conjunto de sintomas desencadeados pelo cansaço visual. As vítimas da SVRC têm sensação de areia, ardência, embaçamento e vermelhidão nos olhos, além de dores de cabeça, sonolência, mal-estar, tontura e cansaço de forma geral. É o que nos conta a médica oftalmologista Cassia Senger, do curso de Medicina da USP em Bauru.
Legislação sobre home office expressa que acordos devem ser feitos entre trabalhador e empregador
Com o crescimento do teletrabalho na pandemia, cresceu também o número de ações judiciais em relação ao também chamado home office. Segundo levantamentos feitos pelo Consultor Jurídico (ConJur), por meio da seção Termômetro Covid-19 de dados de tribunais, de quase 130 mil processos trabalhistas relacionados ao coronavírus, pelo menos 5 mil citam o termo home office. Otávio Pinto e Silva, professor do Departamento de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito (FD) da USP, trata desse tema.
Estresse causado pela pandemia pode ser atenuado com técnicas de relaxamento
A rotina moderna envolve diversas atividades, obrigações e prazos a serem cumpridos em um curto período de tempo. Esse excesso de afazeres acaba gerando consequências negativas como o estresse, procrastinação, falta de foco e até mesmo ansiedade. Situações que se acentuam com a pandemia e o isolamento social. Por conta desses efeitos colaterais da realidade agitada em que vivemos, a busca por técnicas que promovam a melhora da concentração e o relaxamento se tornam cada vez mais comuns. Esse é o caso do mindfulness, uma prática que busca ampliar a atenção no momento presente. Sobre ele falam Melissa Melchior (Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto), Fernando Zagatti, mestrando em Ciência da Computação, e Kranya Victoria Diaz Serrano (Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto).
Atendimento pediátrico por telemedicina é possível?
Pela necessidade de distanciamento social, por conta da pandemia, a telemedicina tem sido uma solução para garantir atendimento aos pacientes. Na pediatria, apesar de o primeiro contato necessitar ser presencial para avaliar a saúde das crianças, os médicos podem responder posteriores dúvidas e orientar a família por atendimento virtual ou telefônico. Segundo Ana Escobar (Faculdade de Medicina da USP), o tema ainda é discutido nos conselhos de medicina, principalmente com o foco de regulamentação, mas a telemedicina, amplamente difundida na pandemia, pode se tornar uma prática recorrente.
Transtornos mentais podem ter maior recorrência pós-pandemia
na qualidade de vida
Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) realizado na USP avalia a saúde mental de dois mil participantes durante a pandemia. O objetivo é observar quais impactos mentais o distanciamento social tem causado, como o surgimento ou a piora da ansiedade e da depressão, por exemplo. As avaliações ocorrem de forma virtual, por meio de questionários, e são periódicas. Assunto para o professor André Russowsky Brunoni, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP.
Como evitar a fadiga provocada pelas reuniões virtuais
Depois de meses de quarentena, o uso constante de plataformas de encontros virtuais tem apresentado efeitos prejudiciais à saúde. É a chamada fadiga de Zoom. Segundo Antonio Herbert Lancha Júnior, professor titular da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP, a forma de trabalho remoto exige mais atenção e, consequentemente, um gasto de energia muito maior. Assim, ele define a fadiga de Zoom como um esgotamento das vias neurológicas, que recebem muita informação e podem responder de forma inferior à sua capacidade real por conta desse cansaço.
Pandemia interfere na rotina de crianças com autismo
Com a pandemia, as dinâmicas da vida doméstica tiveram que ser adaptadas para o cumprimento da necessidade de isolamento social. No entanto, os impactos dessas mudanças podem ter sido ainda mais difíceis de lidar para alguns. Esse é o caso das pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), principalmente as crianças. A professora Patrícia Braga, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, explica como a instituição de uma rotina fixa pode amenizar os traços do TEA que possam inibir o aprendizado.
Nutrição energética de idosos requer controle rigoroso
Um estudo publicado na Nature avalia o desempenho de métodos para estimar as necessidades energéticas em idosos e testar a validade de novas equações para essa faixa etária. Em vista do aumento do número de idosos nos últimos anos, Laís Duarte Batista, mestranda em Nutrição em Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP e integrante do Grupo de Pesquisa de Avaliação de Consumo Alimentar (GAC), compartilha que o estudo visa a trazer a esse grupo um envelhecimento adequado e saudável. Os métodos permitem mensurar o gasto energético de indivíduos e a ideia do projeto de mestrado é “corrigir esses erros e discutir um pouco sobre como podemos melhorar a pesquisa em nutrição e o atendimento clínico também nessa área”.
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