“Muitas pessoas pensam que os jogos olímpicos se resumem a um campeonato de disputa de medalhas. No entanto, é possível ver o esporte sob diversos pontos de vista, como os da física, fisiologia, história, política, entre outros”, afirma o professor Otaviano Helene, do Instituto de Física (IF) da USP. “No caso da física, por exemplo, os esportes olímpicos podem demonstrar que os conceitos ensinados na escola não são abstratos e estão presentes em ações do cotidiano, como as práticas esportivas.”
O professor mantém o blog Ciências Olímpicas, onde escreve sobre a relação entre os fenômenos físicos e as modalidades esportivas, como atletismo, saltos ornamentais, vela e ciclismo. Junto do doutorando Viktor Jahnke, da área de Física Matemática, que realiza seminários sobre a física dos esportes, Helene explica como os atletas aplicam a energia de corridas, saltos e pedaladas para ir mais alto ou conseguir maior velocidade. Também demonstra a influência de fatores como a resistência do ar na performance dos atletas e na quebra de recordes.
Força e movimento
Ao manejar as velas de seu barco, um atleta consegue alcançar velocidades maiores do que as do próprio vento. “No fundo do barco há uma quilha, uma peça que dificulta o deslocamento da embarcação para os lados”, explica o professor. “Quando o vento incide lateralmente sobre a vela, formando um ângulo de 45 graus, o barco começa a se movimentar para a frente. Nesse momento, o velejador muda o ângulo da vela conforme a direção do vento até chegar à velocidade máxima.” Um veleiro de competição pode alcançar o dobro da velocidade do vento e um ice boat, que navega sobre o gelo, consegue ser quatro vezes mais veloz.
No salto com vara, o atleta corre com a vara antes de saltar e produz energia cinética. “No momento do salto, a vara é fixada no chão e se entorta, e a energia cinética se acumula na vara na forma de energia potencial elástica, o que impulsiona o atleta para cima”, descreve Jahnke. “Quando a vara se desentorta, a energia potencial elástica converte-se em energia potencial gravitacional. Ao atingir o ponto mais alto do salto, o atleta empurra a vara para baixo e consegue subir aproximadamente mais um metro de altura.”
O professor aponta que quanto maior a velocidade da corrida, mais alta será a subida. “Como os atletas precisam correr com a vara, a velocidade típica fica em torno de 9 metros por segundo (m/s) para os homens e 8 m/s para as mulheres”, afirma. “Assim, é possível alcançar uma altura ao redor de 6 metros, no caso dos homens, e 5 metros, no das mulheres.” O atual recorde mundial masculino, obtido pelo francês Renaud Lavillenie, é de 6,16 m. O recorde feminino pertence à russa Yelena Isinbayeva, que saltou 5,06 m. No Brasil, a melhor marca pertence a Fabiana Murer, que saltou 4,85 m em competições realizadas na Espanha (2010), Coreia do Sul (2011) e China (2015).
Um atleta do salto em distância consegue ser mais veloz na corrida, cerca de 10 m/s entre os homens e 9 m/s para as mulheres. “No momento do salto, o atleta dá um impulso para cima, de modo a aumentar seu tempo de voo”, explica o doutorando do IF. “O ângulo ideal para esse salto seria de 45 graus. Entretanto, como o atleta está em movimento, com o impulso ele consegue saltar formando um ângulo de aproximadamente 22 graus com o corpo na horizontal.”
Há outros fatores que influenciam a performance nos saltos em distância e nas corridas curtas, como a velocidade dos ventos e a densidade do ar. “No caso dos 100 metros rasos, por exemplo, a Federação Internacional das Associações de Atletismo (IAAF) não considera como recorde mundial as marcas estabelecidas com uma velocidade dos ventos maior que 2 m/s”, lembra o professor. “Outro efeito, ainda, é que em locais mais altos, a densidade do ar é menor do que em cidades situadas ao nível do mar, como o Rio de Janeiro, o que favorece o deslocamento dos atletas e o estabelecimento de recordes duradouros.”
Isto aconteceu nos Jogos Olímpicos da Cidade do México em 1968, disputados numa altitude de 2.250 m, com densidade do ar cerca de 25% menor que ao nível do mar, quando Bob Beamon (Estados Unidos), no salto em distância, conseguiu a marca de 8,90 m, superada apenas em 1991, quando Mike Powell (Estados Unidos) saltou 8,95 m em Tóquio (41 m de altitude) e estabeleceu o atual recorde mundial. A marca de Beamon ainda é o recorde olímpico. Entre as mulheres, Galina Chistyakova, que já representou a União Soviética e a Eslováquia, alcançou 7,52 m em 1988. O recorde brasileiro masculino é de Douglas de Souza, que saltou 8,40 m em 1995. O feminino é de Maurren Maggi, com 7,26 m, estabelecido na Colômbia, em 1999.
Os atletas do salto em altura, na corrida, atingem uma velocidade um pouco menor, em torno de 7 m/s. “Eles correm em curva e no instante do salto fixam um dos pés no chão, inclinam o corpo, fazendo com que a velocidade inicialmente horizontal ganhe uma pequena componente vertical”, explica Helene. “Nesse instante, os atletas usam as pernas para jogar o corpo para cima, ganhando altura durante o salto. Esse impulso é essencial para um bom desempenho nas competições.”
Os atletas do salto em altura, na corrida, atingem uma velocidade um pouco menor, em torno de 7 m/s. “Eles correm em curva e no instante do salto fixam um dos pés no chão, inclinam o corpo, fazendo com que a velocidade inicialmente horizontal ganhe uma pequena componente vertical”, explica Helene. “Nesse instante, os atletas usam as pernas para jogar o corpo para cima, ganhando altura durante o salto. Esse impulso é essencial para um bom desempenho nas competições.”
De acordo com o professor, “a desaceleração dos atletas ao fixarem o pé no solo na última passada é tão intensa que é preciso usar sapatilhas com cravos para garantir que o pé se fixe no chão”. O recorde mundial masculino no salto em altura é do cubano Javier Sotomayor, que saltou 2,43 m. No feminino, a recordista é a búlgara Stefka Kostadinova, com 2,09 m. No Brasil, os recordistas são Jessé de Lima (2,32 m) e Orlane Maria dos Santos (1,92 m).
No arremesso de peso, a distância percorrida pelo objeto a ser lançado aumenta quanto maior for a velocidade horizontal e o tempo em que ele permanecer no ar antes de cair no chão. “Por essa razão, os atletas colocam sua força no arremesso, lançando o peso para a frente e para cima”, descreve o doutorando do IF. “O ângulo ideal do lançamento, se este ocorresse no nível do chão, seria de 45 graus. Como o peso é lançado de uma certa altura, os lançamentos são realizados com ângulos entre 34 a 41 graus, conseguindo alcançar uma distância de aproximadamente 23 metros.”
O recorde mundial masculino é de 23,12 m (Randy Barnes, Estados Unidos 1990) e o feminino, de 22,63m (Natalya Lisovskaya, União Soviética, 1987). As melhores marcas de brasileiros são de 20,90 m no masculino (Darlan Romani, 2015) e 19,30 m (Elisângela Adriano, 2001).
No lançamento de martelo, na verdade o que é lançado é uma bola de aço presa a um cabo de metal. “Para fazer o lançamento, o atleta gira o cabo de quatro a seis voltas, em velocidade máxima, e realiza o arremesso”, diz o professor. “Isso acontece em um intervalo de tempo curto, de 5 a 6 segundos, que é o máximo que um atleta consegue acelerar o peso. A partir desse tempo, eles não conseguem acelerar mais.” A distância alcançada pode chegar a mais de 80 metros. O recorde mundial masculino é de 86,74 m (Yuriy Sedykh, União Soviética, 1986) e o feminino, de 81,08 m (Anita Wlodarczyk, Polônia, 2015).
O recorde brasileiro masculino é de 78, 63 m (Wagner Domingos, 2016) e o feminino, de 64,58 m (Katiuscia de Jesus, 2006).
O grande desafio do ciclismo de velocidade é vencer a resistência do ar. “Quando o ciclista atinge velocidades superiores a 50 quilômetros por hora, ele é obrigado a produzir uma potência mecânica muito grande ao pedalar, para afastar o ar de sua frente”, afirma o professor Helene. A potência pode chegar a cerca de 500 watts, similar a de um liquidificador doméstico. “Vencendo a resistência, o atleta consegue manter uma velocidade constante.”
Mais informações: emails otaviano@if.usp.br, com o professor Otaviano Helene e viktorjahnke@gmail.com, com Viktor Jahnke