Imposto sobre bebidas ultraprocessadas pode ser uma maneira efetiva de saúde pública

Mas a taxação por si só não basta e a pesquisadora Luíza Gazola explica como essa medida deve ser abordada

 30/07/2024 - Publicado há 5 meses
Em 2017, um relatório da OMS recomendou que os países adotassem um imposto sugerido de 20% sobre bebidas açucaradas – Fotomontagem com imagens: rawpixel.com no Freepik e Quebrando a imagem/Pexel via Wikimedia Commons
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Uma das discussões que surgiram em meio à reforma tributária é a taxação de bebidas açucaradas/ultraprocessadas. Aumentar o imposto delas pode, segundo o projeto, significar uma oportunidade de reduzir doenças, mortes evitáveis e melhorar a qualidade de vida da população. Na última década, o custo atribuído à obesidade de crianças e adolescentes para o Sistema Único de Saúde (SUS) foi de R$ 213 milhões. Já em 2017, um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que os países adotassem um imposto sugerido de 20% sobre bebidas açucaradas.

Luíza Gazola, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública da USP, comenta a questão, explicando primeiro o termo “bebida ultraprocessada”: “De acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, as bebidas adoçadas – como refrigerantes, chás, sucos e bebidas lácteas – que possuem ingredientes industriais, como frutose, polidextrose e maltodextrinas, e também têm a presença de aditivos alimentares, como aromatizantes, corantes e edulcorantes, são consideradas bebidas ultraprocessadas”.

Impactos das bebidas ultraprocessadas

Luisa Gazola Lage – Foto: Nupens/USP

Há aproximadamente 15 anos foi criada a classificação nova como um instrumento para avaliar padrões de consumo alimentar, e com ela surgiu o termo “ultraprocessado”. Há dez anos, o Guia Alimentar passou a utilizar esse termo e recomendar que as pessoas evitassem esse tipo de alimento. Luíza explica que, por ser um campo recente, ainda não se tem todas as respostas sobre os efeitos dos ultraprocessados à saúde, mas que “já existem evidências suficientes que apontam que o consumo de ultraprocessados aumenta o risco para o ganho de peso, doenças crônicas não transmissíveis, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer”.

Consequentemente, é fato que os alimentos ultraprocessados e com muito açúcar causam um impacto direto na qualidade de vida da população, tendo se tornado uma questão de saúde pública. Para se ter mais informações, o Guia Alimentar para a População Brasileira está disponível gratuitamente na internet, e oferece orientações sobre como se nutrir melhor. A pesquisadora complementa que desenvolver a habilidade de diferenciar alimentos ultraprocessados dos não já é uma ótima forma de se regular nas compras.

Taxação como política pública

Luíza defende que aumentar os impostos pode ser uma medida efetiva, mas deve compor “um pacote de intervenções, não pode ser feito de maneira isolada”. O que ela afirma é que a taxação por si só não terá um efeito tão positivo, e que deve ser aliada a outras formas de propostas de redução. “Um exemplo de sucesso, semelhante ao que está sendo proposto para as bebidas adoçadas, foram as políticas antitabaco, em que foram realizadas a sobretaxação dos produtos, a proibição de fumar em lugares específicos, a proibição de propagandas, entre outras medidas”, diz a pesquisadora.

Políticas públicas aliadas a essa medida podem ser, por exemplo, a regulação do marketing. Luíza aprofunda: “A desassociação de personagens em embalagens como estratégia de marketing, a regulação do marketing para o público infantil em outros meios de comunicação, como na internet, que é bastante liberado”. Além disso, accrescenta que é preciso disseminar a informação sobre os danos à saúde e alternativas de uma dieta saudável: “As crianças são muito beneficiadas quando têm acesso à informação, então é uma medida que também pode ser aplicada”.

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Há também a valorização de cadeias curtas de produção de alimentos, ou seja aquele, alimentos que não viajam muito para chegar à mesa do consumidor. “Políticas de incentivo fiscal para agricultura familiar, para agricultura agroecológica; já existem várias medidas que estão sendo apresentadas que são efetivas e que podem ser aplicadas juntamente com a tributação”, diz Luíza.

Impacto no consumidor

Apesar dos benefícios de tornar isso uma questão de saúde pública, novos impostos sempre são motivo de desgosto por parte da população. Um argumento é que isso aumentaria o custo de vida e afetaria justamente a população mais pobre. Sobre isso, Luíza apresenta dois contrapontos.

O primeiro é que as bebidas adoçadas não são produtos essenciais para o consumo humano. A pesquisadora explica: “Se deixarmos de consumi-las, essa já é uma medida positiva para a saúde, não precisamos substituir um refrigerante por uma outra bebida, simplesmente deixar de consumi-lo”. Ela afirma que, desde a pandemia, os alimentos ultraprocessados como um todo se tornaram mais baratos do que os in natura (minimamente processados), o que é algo preocupante.

Já o segundo ponto é o resultado de um estudo recente que simulou alguns cenários de tributação de alimentos ultraprocessados no Brasil. O estudo concluiu que a melhor proposta seria o cenário combinado, que se resume na sobretaxação de alimentos ultraprocessados e a isenção das alíquotas para frutas e verduras. “Assim, nesses cenários, alimentos saudáveis ficariam mais baratos e mais acessíveis, principalmente para as populações mais vulneráveis, e teria também o maior impacto na qualidade da alimentação”, afirma ela. Essa seria uma forma de incentivar uma melhor nutrição da população e até barateando uma dieta equilibrada.


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