A empresa estadunidense ExxonMobil, ainda uma das maiores produtoras de petróleo dos Estados Unidos, foi criada a partir da divisão da famosa Standard Oil Company. Um artigo publicado pela Science revelou que essa empresa, desde 1977, sabia do aquecimento global de origem antrópica, mas seu posicionamento sempre foi como se este e as mudanças climáticas fossem apenas especulações.
“Esse tema vem sendo pesquisado desde o início dos anos 70, então, esse artigo publicado vem dentro de um conhecimento que já existia na época e os cientistas da ExxonMobil foram muito precisos em modelar as consequências das mudanças climáticas, os achados foram muito parecidos aos verificados em pesquisas realizadas em universidades americanas, pesquisas independentes e levantamentos feitos por órgãos governamentais americanos“, diz o professor Pedro Luiz Côrtes, titular da Escola de Comunicações e Artes e também do Instituto de Energia e Ambiente da USP. Os estudos da ExxonMobil, conforme o artigo, eram tão bons quanto os de origem acadêmica e até utilizavam modelos computacionais para prever as consequências de tais problemas.
Estudos
“Eles foram precisos ao indicar quando o aquecimento global causado pelo homem seria detectado, quando se tornaria mais evidente a ponto de suscitar preocupações na sociedade. Enquanto os cientistas e acadêmicos trabalhavam para comunicar o que sabiam sobre isso ao público, nas suas atividades de relações públicas, a ExxonMobil trabalhava para negar o aquecimento, ou seja, ela sabia de tudo e passou décadas negando”, coloca Côrtes. Isso é o que se chama de negacionismo climático, quando se crê, erroneamente, que a mudança climática e o aquecimento global não existem ou que os seres humanos não estão diretamente ligados ao problema.
Com o vazamento dos dados de que a ExxonMobil tinha consciência da problemática climática, podem ficar questionamentos sobre quem de fato sabia dessas informações, mas o professor explica: “Uma coisa é uma pessoa, dentro da empresa, ter consciência do que está acontecendo; outra coisa é a empresa publicamente ter desenvolvido relatórios que mostravam isso e ter adotado uma posição oposta à opinião pública. Ela sabia o que aquilo que ela estava produzindo causava e se posicionou publicamente, não no sentido de falar ‘Olha, nós estamos produzindo petróleo e a queima do petróleo pode causar danos ambientais significativos, leva ao aumento do efeito estufa’, ela simplesmente negava tudo”.
Estratégia
Algumas empresas lucram em cima da crise climática e esse é um dos principais motivos para a manutenção de uma estratégia de desinformação. “A indústria do tabaco utilizou muito essa estratégia no século passado. Durante muitos anos, ela financiou pesquisas que disseminavam a dúvida sobre a capacidade de o cigarro causar dependência, embora ela soubesse que cigarro vicia”, compara Côrtes, com a estratégia utilizada pela ExxonMobil.
No caso da ExxonMobil, a empresa negava, em seus pronunciamentos e atitudes, o que seus próprios estudos haviam comprovado: “O artigo mostra que ela sabia das consequências da queima dos combustíveis fósseis, embora negasse isso em seus pronunciamentos. É uma estratégia muito parecida [com a da indústria do tabaco]”. A prática de financiar cientistas contrários ao que foi comprovado para que não haja mudanças no status quo é uma das atitudes tomadas nessa estratégia, além do também financiamento de pesquisas que duvidam da real proporção negativa, nesse caso, do aquecimento global.
Mas, mesmo com essa estratégia de desinformação e disseminação da dúvida, Côrtes analisa: “Vai chegar um momento, como aconteceu com o cigarro, que as evidências são tão grandes, o acúmulo de evidências científicas é tão grande, que não tem como chegar e defender. A mesma coisa vem acontecendo em relação às mudanças climáticas, e esse artigo deixa isso muito claro e ainda cita outras empresas, de outros setores, que já sabiam disso também, mas nunca se posicionaram em relação a tentar fazer alguma coisa para combater as mudanças climáticas, isso já há mais de 40 anos”.
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