A humanidade deve abandonar a ideia de moldar a natureza segundo suas necessidades

Ricardo Abramovay explica artigo desenvolvido pela Cátedra Josué de Castro, que vai compor obra do G20 sobre problemas contemporâneos, entre os quais a relação entre a destruição ambiental e os sistemas agroalimentares

 Publicado: 09/05/2024     Atualizado: 13/05/2024 as 12:18
A humanidade já conheceu 25 mil produtos comestíveis na natureza, dos quais 7 mil já foram cultivados ou coletados – Foto: investeceara.adece.ce.gov.br
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A presidência indiana do G20 recebeu 320 papers em 2023, dos quais 27 foram escolhidos para compor livro com uma síntese de artigos sobre os mais importantes problemas contemporâneos (Diversity in Agriculture and Consumption: The Basis for Healthy and Sustainable Eating). Entre os artigos selecionados, está o trabalho elaborado pela Cátedra Josué de Castro, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, e o do Instituto Comida do Amanhã. 

O professor Ricardo Abramovay, titular da Cátedra Josué de Castro, explica o trabalho desenvolvido e os problemas enfrentados atualmente na produção agroalimentar. Além dele, os outros membros da Cátedra que participaram do projeto são Ana Paula Bortoletto Martins, Nadine Marques Nunes-Galbes, Estela Catunda Sanseverino, Luisa Gazola Lage e Juliana Tangari.

O especialista conta que a Índia, como presidente do G20, deu muita ênfase a questões relativas à revolução digital, as quais não foram bem recepcionadas. No entanto, a cúpula está debatendo temas referentes a modalidades de crescimento econômico e transição energética. O Brasil, segundo ele, está exercendo um papel fundamental na tentativa de equacionar a transição para o desenvolvimento sustentável e na luta contra as desigualdades, a partir da proposta de taxação de grandes fortunas.

Ricardo Abramovay – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Projeto 

Segundo o professor, a obra possui como um de seus objetivos reorientar as indústrias agroalimentares e os padrões de consumo da população global. Ele explica que é necessário reconhecer a complexidade dos processos evolutivos naturais e, portanto, renunciar à ideia de que a humanidade tem que moldar a natureza segundo as suas necessidades, como ocorreu durante grande parte do século 20.

De acordo com o especialista, esse movimento foi impulsionado pela Revolução Verde, quando a indústria da agricultura passou a utilizar sementes geneticamente modificadas, fertilizantes químicos e pesticidas, além de promover maior investimento no maquinário agrícola. Essa simplificação dos processos rurais é o contrário da complexidade da natureza e acarreta monotonia das paisagens agropecuárias, bem como no empobrecimento do solo e da biodiversidade.

“Algumas pesquisas publicadas mostram uma exaustão das reservas de água, inclusive dos aquíferos, como é o caso no Cerrado brasileiro e essa monotonia das paisagens agrícolas é correlativa à monotonia na alimentação. Essa monotonia na alimentação mostra que as pessoas se alimentam a partir de uma variedade menor de produtos”, explica.

Alimentação

Conforme Abramovay, a humanidade já conheceu 25 mil produtos comestíveis na natureza, dos quais 7 mil já foram cultivados ou coletados, mas, desse número, apenas 400 são cultiváveis. Além disso, ele explica que 75% da alimentação no mundo é composta de apenas seis alimentos básicos: batata, arroz, trigo, milho, soja e cana-de-açúcar.

No âmbito da produção animal, o docente destaca que a monotonia genética também afeta os animais, que se tornam alvos mais fáceis para vírus e bactérias e, por isso, cerca de 70% dos antibióticos produzidos são destinados aos animais. Ele destaca que essa prática gera um problema grave para as organizações de saúde, pois esses remédios são vazados para o meio ambiente e provocam uma maior resistência aos antimicrobianos.

“Todos esses sistemas estão interligados, quando destruímos a água ou a terra, isso vai influenciar no tipo de alimentação, que vai gerar problemas de saúde ou uma questão epidemiológica. Ou seja, as pessoas têm que entender de uma vez por todas os caminhos da ciência apontando que há bastante tempo que essas questões estão interligadas”, conta.


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