Era uma vez um menino chamado João, que gostava de escalar uma árvore de palavras – batizada por ele de “linguageira” –, surgida misteriosamente em seu quintal. Esse é o ponto de partida para o universo literário do escritor mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967), explorado no livro João e o Pé de Sertão – O Infinito de Rosa pela Linguageira, que será lançado neste sábado, dia 3, às 11 horas, na Livraria Mandarina, em São Paulo. A edição é da Editora Miguilim, de Belo Horizonte (MG).
Escrito por Marcílio Godoi – doutorando em Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP – e ilustrado por Cláudio Reis, o livro é voltado para o público infantojuvenil e foi lançado originalmente em julho passado no Museu Casa de Guimarães Rosa, em Cordisburgo (MG), cidade natal do escritor mineiro.
João e o Pé de Sertão não pode ser descrito como um romance, dicionário ou coletânea de contos e poesias, mas sim como uma “fantasia escrita e ilustrada”, escreve Godoi na apresentação da obra. O texto divide suas páginas com os desenhos rabiscados de Cláudio Reis, que exibem os cenários e personagens das várias obras de Rosa.
“João foi subindo, montando, narrando aquele infinito de nunca dizer chega, escalando, topando com palavra pra todo lado, pro alto, pra fora, sertão adentro. Ao notar que as folhas os frutos os galhos as galhadas as aves a paisagem, tudo era feito de palavra, João viu que morava em sua própria língua. Um exemplar notável, único, de um dicionário vivo, nascido bem no centro geométrico do sertão.”
A gramática “retorcida” de Rosa é desvendada aos poucos pelo garoto, que de galho em galho encontra definições lúdicas para palavras marcantes da literatura rosiana. Além de aprender o significado de termos como saudade, luta, infinito, jagunço e sagarana, João também é apresentado a diversos personagens do autor, como Miguilim, Augusto Matraga, Nhinhinha e Diadorim, protagonistas dos livros Campo Geral (1964), Sagarana (1946), Primeiras Estórias (1962) e Grande Sertão: Veredas (1956), respectivamente.
“Todos julgavam que Miguilim via mal, via errado. Depois caíram do cavalo ao saber que ele via era diferente, tomando lição das plantas e dos bichos. Fora as muitas coisas que só Miguilim podia ver, feito o amor da mãe ao irmão morto, lágrima imensa. João afastou muitas galhadas, muitas camadas da sua árvore de palavras e viu um Joãozito em Miguilim. João sorriu quando soube que ele ganhou do doutor uns óculos de ver enxergando.”
Do alto da árvore, João também consegue ver Mutum, cidade do interior de Minas Gerais que é palco da história de Miguilim em Campo Geral. “Mutum é onde só se ouve o mu quieto dos bois e o tum do fruto caído na terra”, escreve o autor.
O modo como Godoi brinca com as palavras também é uma referência direta à obra de Rosa, fato que ele explica na apresentação do livro: “Guimarães Rosa gosta de aprontar as palavras para o mistério, o enigma, a aventura. Seu dizer veste uns panos escuros, outros muito brancos. Às vezes usa couros selvagens, sem enfeites, pensados na simplicidade. Mas eis que, de repente, viram mantos riquíssimos em fios de ouro, cravejados de estrelas e conchas e pérolas e diamantes. Esse é o pulo do gato, quer dizer, da onça. Ler o Rosa é flagrar o momento exato do passe da mágica em que se dá essa transformação na cabeça e no peito”, diz.
Em São Paulo, o livro será lançado neste sábado, dia 3, das 11 às 14 horas, na Livraria Mandarina (Rua Ferreira de Araújo, 373, bairro de Pinheiros). Mas informações estão disponíveis neste link.
