Do texto ao bordado. Paisagens da obra Grande Sertão: veredas: pássaros, flores, folhagens, peixes, bichos e borboletas – Foto: Elizabeth Ziani
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O sertão de Minas Gerais recria a obra de um dos maiores escritores brasileiros. Guimarães Rosa é reverenciado, experimentado e sentido em diversas formas e linguagens pelos moradores de três regiões sertanejas. É o Rosa em prosas, cantos, pinturas e bordados. Os projetos socioculturais de Cordisburgo, Morro da Garça e Andrequicé, que envolvem toda a população, revitalizam a região, valorizam a cultura e estabelecem vínculos a partir da literatura. O escritor, que nasceu e viveu parte de sua vida em Minas, teve sua trajetória estudada em tese defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP em parceria com o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP.
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Em referência a um menino, personagem extraído do conto Campo Geral – Manuelzão e Miguilim, Miguilim foi o nome dado a um grupo de contadores de histórias da terra natal de Guimarães Rosa, a cidade de Cordisburgo, localizada a 118 quilômetros de Belo Horizonte. Utilizando como forma de expressão a oralidade, meninos e meninas do sertão mineiro, com sotaque regional bastante carregado, têm a incumbência de difundir a vida e obra de Guimarães Rosa. Quem chega à cidade para visitar o acervo do Museu Casa Guimarães Rosa, “se encanta com os Miguilins”.
Na voz desses jovens, a história e os personagens se tornam vivos e os detalhes descritivos das paisagens dos contos ficcionais podem ser imaginados com formas, cores e cheiros”, relata Elizabeth Maria Ziani, pesquisadora e autora da tese. Os Miguilins se sentem orgulhosos por pertencerem ao grupo. Falam das coisas do sertão: das veredas, do vaqueiro, dos ventos verdes, dos buritis e das terras batidas. Com isso, preservam as tradições regionais e trazem identidade à cidade mineira, explica a pesquisadora.
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Ouça a narrativa da morte de Dito (irmã de Miguilin) na voz de uma componente do grupo Miguilim.
Formado por jovens entre dez e 17 anos, selecionados das escolas públicas da cidade, o grupo foi criado há mais de 20 anos pela prima de Guimarães Rosa, Calina Guimarães, com o objetivo de oferecer aos jovens novas perspectivas que fossem além das montanhas de Cordisburgo. Calina atingiu os resultados que desejava. Entre os ex-Miguilins, hoje são encontrados médicos, engenheiros, assistentes sociais, biólogos, professores e muitos outros seguindo a carreira acadêmica.
Além dos contadores de histórias, outros projetos mostram a literatura de Guimarães Rosa como mobilizadora de vivências em Cordisburgo, Morro da Garça e Andrequicé, cidades por onde o escritor em vida buscou inspirações para suas obras. Entre os projetos, Elizabeth destaca a pintura do artista plástico José Murilo, o bordado consolidado na região por grupos de mulheres e a “Semana Roseana”, que acontece em julho, em comemoração ao nascimento do escritor.
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Sobre a obra de José Murilo, Elizabeth traça uma relação da pintura com o texto, apontando os processos de adaptação da obra literária a partir da linguagem da pintura. O artista plástico, já falecido, deixou dez telas prontas a partir da leitura de “Grande Sertão: veredas”. No bordado, a autora faz um percurso pelo coletivo Teia de Aranha, que começou em São Paulo e foi até os grupos mineiros. O projeto Manto do vaqueiro – bordado itinerante, sob curadoria da pesquisadora em parceria com Joana Salles, tem destaque pela participação de mais de 200 pessoas, bordadeiras, homens, jovens, crianças da região e por integrar literatura, bordado e pintura.
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A tese As dobras do texto – trajetória da obra de Guimarães Rosa pelo sertão foi apresentada no Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH, sob orientação de Benjamin Abdala Jr.
Confira também a participação de Elizabeth Ziani em programa da TV Cultura: Manto do Vaqueiro
Mais informações: e-mail bethziani@gmail.com,com Elizabeth Ziani
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