Terapia e manifestações criativas podem ajudar a lidar com os pensamentos intrusivos

O psicólogo Sérgio Kodato (FFCLRP) fala que os pensamentos intrusivos são universais e não estão, necessariamente, relacionados a algum problema de saúde mental

 15/08/2023 - Publicado há 1 ano
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Os pensamentos intrusivos têm sua origem no subconsciente e é por isso que eles aparecem de forma aleatória e indesejada – Foto: Freepik

 

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Imagine que enquanto assiste a uma apresentação importante no trabalho, você é surpreendido por um pensamento: começa a se ver levantando no meio da sala e gritando coisas inapropriadas e constrangedoras para seus colegas e superiores. E é tão real que é possível visualizar a expressão de choque e desaprovação, sentir a tensão no ar e a vergonha subsequente. E você entende que é um comportamento inadequado para um ambiente profissional, então luta para afastar esse pensamento.

Essa é uma situação familiar, muitas pessoas têm esses pensamentos involuntários e indesejados que ocorrem repetidamente, trazendo desconforto e angústia. Esse fenômeno é chamado de pensamento intrusivo. O professor de Psicologia Sérgio Kodato, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP de Ribeirão Preto, explica que esses pensamentos podem variar desde agressivos e violentos até pensamentos de natureza sexual ou mesmo perturbadores sobre eventos futuros.

Raízes do subconsciente

Sérgio Kodato – Foto: FFCLRP/USP

O professor comenta que os pensamentos intrusivos têm sua origem no subconsciente e é por isso que eles aparecem de forma aleatória e indesejada. O subconsciente é a esfera da mente que abriga conteúdos recalcados, esquecidos ou não plenamente conscientes. “O subconsciente é um vasto depósito de experiências, emoções e desejos que não estão imediatamente acessíveis à nossa consciência”, esclarece Kodato. “Esses conteúdos podem ser elementos reprimidos ao longo de nossas vidas, como memórias traumáticas ou desejos que ressurgem na forma de pensamentos intrusivos”, prossegue.

“Assim, a mente parece trair-nos com ideias que desafiam nossa compreensão racional.” Mas, para Kodato, é importante entender que a ocorrência de pensamentos intrusivos não está necessariamente relacionada a algum problema de saúde mental: “Esses pensamentos são universais e podem afetar qualquer pessoa”.

Controle da mente

Embora esses pensamentos surjam de forma imprevisível, o professor diz que podem ser controlados. “A primeira etapa para lidar com os pensamentos intrusivos é permitir-se expressá-los, seja através da fala, da escrita ou de outras formas de arte. Essa expressão pode ajudar a compreender o que esses pensamentos significam e porque estão surgindo”, aconselha Kodato.

Além disso, o tratamento terapêutico pode ser uma ferramenta eficaz para trabalhar com pensamentos intrusivos persistentes. O acadêmico comenta que, em um ambiente terapêutico, “a pessoa pode explorar a origem desses pensamentos, bem como aprender estratégias para enfrentá-los e desafiá-los. A terapia, por exemplo, tem se mostrado útil no tratamento de pensamentos intrusivos associados a transtornos de ansiedade e obsessivo-compulsivos, o TOC”. 

Kodato dá um exemplo: “Pensamentos intrusivos no âmbito da ansiedade podem se desdobrar em cenários mentalmente exaustivos, como a convicção persistente de que um resfriado comum vai se transformar em uma doença grave, ou a perspectiva de perder o emprego, precipitando uma sucessão interminável de inquietação. Com o TOC, o indivíduo ter preocupações de sujar ou desorganizar o ambiente ao seu redor”.

O professor observa que esses pensamentos, embora inevitáveis em certas ocasiões, podem ganhar terreno e se tornar uma presença constante e, portanto, sugere, além da busca por terapias, outros canais de expressão, como a criação de ilustrações, produções artísticas ou manifestação criativa como meio de abordar, confrontar, canalizar e reestruturar esses padrões de pensamento.

Quando a mente trai 

Retrato de Fiódor Dostoiévski, em 1860 – Imagem: Wikimedia Commons

Kodato também correlaciona a quantidade de pensamentos intrusivos com o nível de agressividade em indivíduos. O professor analisa que pessoas agressivas e violentas tendem a acumular ideias de agressividade desde a infância, o que pode levar ao recalcamento dessas ideias. “Essas mentes sobrecarregadas podem levar a atitudes violentas. É como se houvesse uma força dentro da pessoa que a impulsiona a praticar tais atos”, pontua.

Para ilustrar, o professor cita o caso de Fiódor Dostoiévski, escritor, filósofo e jornalista russo, que teve um pai cruel e violento e que, portanto, era sobrecarregado de ideias agressivas, “mas que, ao invés de cometê-las, ele as transformava em literatura”

Kodato ressalta que isso pode funcionar como uma válvula de escape saudável. “Há casos em que pessoas com ideias violentas ou sexuais proibidas utilizaram a arte para processar e transformar esses pensamentos intrusivos em expressões criativas e, assim, encontraram um meio de lidar com suas inquietações internas.”

*Estagiária sob supervisão de Ferraz Júnior


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