A fascinante jornada musical de Bach: a tessitura celestial

Por Sérgio Carvalho, pianista do Coral da USP

 Publicado: 05/07/2024
Homem branco, com cabelos curtos grisalhos e barba grisalha. Usando óculos com armação arredondada e trajando camiseta branca.
Sérgio Carvalho – Foto: Arquivo pessoal

 

 

Na última década de vida, Bach revisou alguns prelúdios-corais anteriormente compostos, que se tornaram os mais longos de sua obra sacra para órgão. São conhecidos como 18 Leipziger Grosse Choralbearbeitungen (18 Grandes Corais de Leipzig). Bach recapitula as maneiras de tratar a melodia coral ao órgão, levando o prelúdio-coral à sua máxima expressividade.

A coleção se inicia com duas invocações para o período de Pentecostes, com o tema de Komm, Heiliger Geist (Vem, ó Espírito Santo): BWV 651, fantasia em organo pleno, cantus firmus no baixo, em estilo concertante, e BWV 652, melodia coral ornamentada, em que o acompanhamento da mão esquerda a 2 vozes tece extensos interlúdios preparando as entradas da melodia coral.

An Wasserflüssen Babylon BWV 653 (À beira dos rios da Babilônia), melodia coral ornamentada no tenor.

Schmücke dich, o liebe Seele BWV 654 (Adorna-te, ó alma querida), melodia coral ornamentada, muito apreciado por Robert Schumann.

Herr Jesu Christ, dich zu uns wend BWV 655 (Senhor Jesus Cristo, inclina-te a nós), paráfrase em forma de trio.

O Lamm Gottes, unschuldig BWV 656 (Ó, inocente Cordeiro de Deus), para a Semana Santa, com uma longa introdução nos manuais que prepara a entrada do tema na pedaleira.

Nun danket alle Gott BWV 657 (Agradeçam todos a Deus), cantus firmus no soprano.

Von Gott will ich nicht lassen BWV 658 (Nunca abandonarei a Deus), cantus firmus no baixo.

Segue-se um tríptico sobre o tema de advento Nun komm, der Heiden Heiland (Eis que vem o Salvador dos pagãos): BWV 659, melodia coral ornamentada; BWV 660, em forma de trio (a mão esquerda e o pedal se equivalem em dificuldade), melodia coral ornamentada; e BWV 661, uma fuga coral em organo pleno, cantus firmus no baixo.

A seguir, mais um tríptico, Allein Gott in der Höh sei Ehr (Glória a Deus nas alturas): BWV 662, melodia coral ornamentada; BWV 663, cantus firmus no tenor; e BWV 664, tipo paráfrase em forma de trio.

Jesus Christus, unser Heiland (Jesus Cristo, nosso Salvador), tema para a Santa Ceia, em duas versões: BWV 665 e BWV 666.

Komm, Gott Schöpfer, Heiliger Geist BWV 667 (Vem, Deus criador, Espírito Santo), em organo pleno, versão estendida do prelúdio-coral com o mesmo tema contido no Pequeno Livro de Órgão (esta versão estendida faz parte da trilha sonora de Deus e O Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha).

E para fechar a coleção, o prelúdio-coral que Bach, no leito de morte, ditou para seu genro Altnikol: Vor deinen Thron tret ich BWV 668 (Perante Teu trono compareço), em forma de moteto-coral.

Ainda das últimas composições sacras de Bach para órgão, devemos citar as variações canônicas sobre o hino Vom Himmel hoch (Dos altos céus), como uma forma de partita-coral. Como o nome indica, Bach compõe cânones, que são imitações estritas, em intervalo de oitava (variação 1), em intervalo de quinta (variação 2), em intervalo de sétima (variação 3), por aumentação em intervalo de oitava (variação 4) e em vários intervalos retrógrados, sucessivamente: em sexta, em terça, em segunda e em nona (variação 5).

Para encerrar a nossa série de textos sobre a fascinante jornada musical de Bach, citamos os seis corais que foram publicados por Schübler, em 1736, que são movimentos extraídos de Cantatas e transcritos para órgão.

No catálogo BWV temos a relação de obras sacras para órgão do número 599 ao número 771. Mas nos anos oitenta foram descobertos mais três dezenas de arranjos corais, a chamada Coleção de Neumeister. Assim, podemos avaliar a produção sacra para órgão de Bach em cerca de duas centenas de peças. Nelas, a mais variada elaboração contrapontística se molda ao texto de cada coral, criando uma constelação musical inesgotável.

________________
(As opiniões expressas nos artigos publicados no Jornal da USP são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem opiniões do veículo nem posições institucionais da Universidade de São Paulo. Acesse aqui nossos parâmetros editoriais para artigos de opinião.)


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.