Lutas das mulheres não brancas na América Latina e no Caribe celebram seus 30 anos

No ano de 1992, mulheres de 32 países fundaram a Rede de Mulheres Afro-latino-americanas, Afro-caribenhas e da Diáspora (Rede Afro) e estabeleceu-se o 25 de julho como o Dia Internacional da Mulher Afro-latino-americana, Afro-caribenha e da Diáspora

 25/07/2022 - Publicado há 2 anos
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A falta de espaço em organizações feministas e no movimento antirracista para discutir reivindicações alinhadas à realidade de mulheres motivou a fundação da Rede de Mulheres Afro-latino-americanas, Afro-caribenhas e da Diáspora (Rede Afro). A iniciativa tem o objetivo de tornar visíveis lutas e resistências e definir estratégias para enfrentamento do racismo a partir de uma perspectiva de gênero.

Para entender o contexto de criação desta data, recorremos à tese de doutorado Vozes Insurgentes: O discurso do feminismo negro na América Latina e Caribe, em que a jornalista Tatiana Botosso conta a história de mobilização de mulheres na América Latina. Ela narra que a organização de um movimento pautado na questão racial começou, em certa medida, em função da falta de diversidade nas discussões e do público que frequentava eventos como o Encontro Feminista da América Latina. O estudo foi defendido no Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (Prolam) da USP e teve a orientação do professor Dennis de Oliveira, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.

Na década de 1980, esses eventos passaram a sofrer fortes críticas em razão da homogeneidade de suas discussões e altas taxas de inscrição, que faziam com que as participantes fossem predominantemente brancas e de classe média. Aos poucos, as lideranças negras identificaram a necessidade de criar um mecanismo capaz de agregar a luta antissexista e antirracista. Assim, de 19 a 25 de julho de 1992 aconteceu o primeiro Encontro de Mulheres Negras Latino-Americanas e Caribenhas na República Dominicana, que criou a Rede Afro e instituiu o Dia Internacional da Mulher Afro-latino-americana, Afro-caribenha e da Diáspora.

Tatiana Botosso – Foto: 

Interseccionalidade

Marcha das Mulheres negras de 2015 em Brasília. Da esquerda para a direita: Luciana Araújo, do Movimento Negro Unificado, Nilza Iraci, do Geledés, Tatiana Botosso e Thayná Maria Lemos, da Rede Mulher Empreendedora

A demanda por uma luta particular das mulheres afro-latino-americanas e afro-caribenhas surge no contexto de crítica às agendas políticas que não consideram a diversidade nas experiências dos indivíduos. Tratando da luta contra a discriminação de gênero, Tatiana lembra dos problemas identificados no feminismo clássico, produzido por mulheres brancas e burguesas de países centrais: “Quando essas feministas consideram que o sistema de gênero é universal em todas as culturas e sociedades, estão incorrendo no mesmo erro do universalismo androgênico que criticam.”

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Novos Cientistas - USP
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Rede de mulheres fortalece o feminismo negro na América Latina e no Caribe
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Nesse cenário, ainda que esses movimentos consigam defender determinadas pautas de inclusão, eles próprios geram uma relação de hierarquia interna. A jornalista explica: “Isso resulta, tanto para a teoria feminista, quanto para a política antirracista, na equação de que só mulheres brancas sofrem sexismo e somente homens negros ou a classe média negra sofre racismo”. Por essa razão, Tatiana lembra que levar qualquer prática que não considere a interseccionalidade não poderá abordar de forma suficiente a maneira peculiar na qual estão subordinadas as mulheres negras, pois a prática interseccional é maior do que a soma do sexismo e do racismo.

Mais informações: profa.tatianaoliveira@gmail.com

 


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