Ativismo digital é novo tipo de participação e transformação política

O professor Massimo Di Felice diz que são movimentos temporários advindos da interação entre pessoas e dados que rompem com as formas tradicionais de participação política

 11/08/2020 - Publicado há 4 anos
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Esses movimentos não são produtos de ideologias, são produtos de interações com dados. Esta é uma qualitativa diferença que marca também a característica da participação e, portanto, o futuro da participação na democracia como entendemos até agora no âmbito ocidental – Foto: Tumisu/Pixabay

 

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Recentemente, fãs de k-pop e usuários da rede social TikTok se juntaram numa ação on-line para boicotar o comício do presidente Donald Trump na cidade de Tulsa. Os ativistas coordenaram uma campanha on-line para se inscreverem massivamente no evento sem a intenção de ir e, consequentemente, esvaziá-lo. Os fãs da música pop sul-coreana também agiram durante os protestos da #BlackLivesMatter e inundaram o aplicativo da polícia de Dallas, no Texas, com fotos e vídeos de seus ídolos a fim de dificultar as denúncias de supostos atos de vandalismo cometidos por manifestantes. Segundo especialista, essas movimentações on-line constituem um novo tipo de ativismo, que é transformador e usar a internet para impulsionar protestos e alcançar grande adesão.

O professor Massimo Di Felice, do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo da Escola de Comunicações e Artes da USP e diretor do Centro Internacional de Pesquisa sobre Redes Digitais Atopos, explica que a utilização das redes sociais criam debates públicos importantes e tiram o monopólio da grande mídia. A participação on-line, portanto, não é necessariamente organizada por grupos ou movimentos políticos, mas é resultado da interação entre as pessoas, dados, algoritmos, plataformas on-line e acompanha o desenvolvimento da tecnologia, o que ele chama de net ativismo: “É  a percepção de pensar uma ideia, uma ecologia da ação e uma ideia de ação cognitiva completamente diferente da ideia de ação social, do ator social de Marx Weber, e completamente diferente de uma ideia de ação política no sentido ocidental e moderno. Esses tipos de ativismo, este último exemplo do pop coreano e de fãs que participaram através de algumas plataformas sociais na compra desses ingressos para boicotar o comício do Trump, são mais um exemplo de uma longa história, que começa exatamente com Silvia Parker nos anos 90, no começo da internet”.

O professor acredita que o ativismo digital é feito por movimentos temporários, não visa fundar instituições duradouras, partidos e não é alinhado com objetivos políticos tradicionais, como a militância, apesar de também ser transformador: “São movimentos temporários, não obedecem à lógica das ideologias de fundar, por exemplo, um movimento, partido, instituições que durem no tempo e que levem para frente uma batalha ligada a uma visão de mundo, uma ideologia geral. Esses movimentos não são produtos de ideologias, são produtos de interações com dados. Esta é uma qualitativa diferença que marca também a característica da participação e, portanto, o futuro da participação na democracia como entendemos até agora no âmbito ocidental”. 

A ação dos fãs de k-pop de inundar o aplicativo da polícia de Dallas tem sido cada vez mais comum na internet e é popularmente conhecida por “floodagem”, capaz de inverter o intuito e diminuir o alcance de uma hashtag. Para Di Felice, há originalidade na forma de ativismo contemporâneo. Essa chuva infinita de informações para boicotar a disseminação de uma manifestação é um fenômeno ligado não somente às novas modalidades de protesto, mas a um outro tipo de participação que acontece numa nova ecologia.

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