O Observatório de Inteligência Artificial e Mundo do Trabalho, em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), lançou um relatório abrangente que analisa as políticas relacionadas à IA no Brasil e seus impactos no mercado de trabalho. A pesquisa, coordenada por um grupo de acadêmicos de instituições renomadas, destaca a necessidade de regulamentação, desenvolvimento e governança no cenário atual da tecnologia. Sobre esse assunto, a professora Roseli Figaro, coordenadora do Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, comenta: “Esse relatório trata de uma visão geral sobre a IA no Brasil e está estruturado em três itens: regulamento, desenvolvimento e governança, e nós fazemos então um panorama geral sobre o desenvolvimento dessa temática no Brasil e é bem interessante o quanto, nesses últimos anos, o Brasil tem se proposto a avanços nessa área. De maneira geral, nós estamos bastante preocupados com a regulamentação, ou seja, a legislação capaz de dar um pouco mais de estabilidade jurídica, não só para investidores, mas sobretudo para a governança mesmo do País”, explica.
No que diz respeito à regulação, o relatório destaca a importância de se criar um arcabouço legal que ofereça segurança jurídica para investidores e proteção para os trabalhadores. O Projeto de Lei 23/38, que tramita no Senado, é um dos principais esforços nesse sentido. No entanto, a professora Roseli observa que as propostas ainda são tímidas em relação à proteção dos direitos trabalhistas, especialmente em um contexto onde a transformação digital traz desafios significativos. “Na parte do trabalho, dos direitos trabalhistas, o projeto tem se mostrado ainda bastante tímido, porque sabemos que essa transformação digital traz impactos bastante importantes na estrutura do trabalho, no funcionamento das empresas e com certeza no novo perfil profissional que se necessita”, afirma.
O desenvolvimento de tecnologias de IA no Brasil também é abordado no relatório. Apesar de o País estar em uma posição de liderança na América Latina, quando comparado a países como México e Chile, a professora aponta que o Brasil ainda tem um papel modesto no cenário internacional, especialmente em comparação com potências como os Estados Unidos e China. Iniciativas recentes visam a aumentar investimentos em pesquisa e formação profissional na área, com planos concretos para o período de 2024 a 2028.
Mobilização social e direitos trabalhistas
A questão da governança é igualmente crucial. Roseli menciona o aumento da mobilização da sociedade civil e dos Sindicatos nos últimos anos, buscando garantir que os interesses dos trabalhadores sejam considerados nas discussões sobre IA. Exemplos de setores como o audiovisual mostram como a tecnologia pode impactar negativamente a carreira e os direitos dos profissionais, gerando uma necessidade urgente de diálogo e regulamentação. “Nos últimos dois anos, tem crescido bastante essa mobilização da sociedade civil, das organizações, dos sindicatos, no sentido de colocar as suas reivindicações em pauta, tanto no Congresso Nacional quanto também para o governo, para o Poder Executivo e, sobretudo, se posicionar diante da sociedade, esclarecendo os impactos que a IA terá na vida das pessoas”, discorre.
“A sociedade civil precisa se mobilizar e conhecer melhor, não só com a questão do medo de perder emprego, mas no sentido de que é possível implantar uma nova matriz tecnológica sem que os custos, o resíduo, os malefícios caiam nas costas daqueles que trabalham”, acrescenta a pesquisadora.
Um ponto destacado por ela é a importância de priorizar os direitos dos trabalhadores na implementação de novas tecnologias. Ela alerta que a introdução de IA não deve resultar em precarização do trabalho, mas sim em uma melhoria nas condições laborais. Para isso é fundamental que haja um esforço coletivo, envolvendo tanto a sociedade civil quanto as instituições governamentais.
O relatório e a discussão em torno dele são apenas o começo de um debate necessário e complexo. A professora Roseli enfatiza que, embora haja desafios, a adoção de uma nova matriz tecnológica pode ser feita de forma que beneficie a todos, desde que os direitos e a qualidade de vida dos trabalhadores sejam preservados. A luta por um futuro mais justo e equitativo no mercado de trabalho, frente aos avanços da IA, está apenas começando e exige atenção contínua.
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