Pesquisadores negros podem concorrer a bolsas de pós-doutorado de R$ 8.479 mensais

Direcionado exclusivamente a pós-doutorandos negros, o edital da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento oferece 50 bolsas de pesquisa, no valor de R$ 8.479 mensais

 06/04/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 11/04/2023 as 14:41
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Programa de bolsas da USP visa contribuir para a diversificação racial do contingente de pós-doutores negros na Universidade - Foto: Pexels

Pesquisadoras e pesquisadores negros de todo o Brasil têm até o dia 10 de maio para se inscrever no Edital Bolsas de Pós-Doutorado para Pesquisadoras e Pesquisadores Negros, que disponibilizará 50 bolsas no valor de R$ 8.479,20 mensais, com duração de 12 meses, com possibilidade de prorrogação por igual período.

As bolsas são oferecidas pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP), em parceria com a Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI). Para se inscrever, o candidato deve ser brasileiro, ter concluído o doutorado e possuir traços fenotípicos que o caracterizem como de cor preta ou parda.

“Nosso objetivo com esse programa é contribuir para a diversificação racial do contingente de pós-doutores negros, aumentando as chances de diversificação racial e de gênero dos docentes não só na USP, mas em todas as universidades brasileiras”, explicou a pró-reitora de Inclusão e Pertencimento, Ana Lucia Duarte Lanna.

Serão selecionados projetos que visem à ampliação e à ressignificação de temas, problemas e abordagens relacionados a todas as áreas do conhecimento. A seleção de bolsistas será feita mediante avaliação do Plano de Trabalho, por mérito acadêmico, pela contribuição para o desenvolvimento da pesquisa e avanço do conhecimento em sua área de incidência, e por avaliação curricular/experiência na área escolhida para desenvolvimento do projeto. 

O bolsista também receberá um valor adicional de 10% do valor da bolsa referente à reserva técnica, que poderá ser utilizado em pagamento de diárias e passagens aéreas, participação em eventos, publicação de artigos e compra de material de consumo para pesquisa.

A inscrição pode ser feita até o dia 10 de maio, com o preenchimento do formulário on-line e envio do currículo Lattes atualizado, fotografia recente, autodeclaração racial, projeto de pesquisa e plano de trabalho. O edital completo está disponível na página da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento.

Primeiro edital

Esta não é a primeira iniciativa desse tipo na Universidade. Em setembro do ano passado, foi lançado um edital direcionado exclusivamente a pós-doutorandas negras, que despertou o interesse de pesquisadoras de todo o País. Ao todo, 268 projetos foram inscritos e três foram selecionados.

Conheça um pouco da vida e da pesquisa das três pós-doutorandas selecionadas na primeira edição do edital Bolsas de Pós-Doutorado para Seleção de Pesquisadoras Negras.

“Esse tipo de iniciativa dá visibilidade ao potencial dos pesquisadores negros na sociedade brasileira e espero que possibilite também a nossa inserção como pesquisadores e professores titulares, ampliando a diversidade de saberes, de corpos e de culturas nas universidades públicas.”

Valdirene Rosa de Souza

Projeto: “Visibilização de saberes e culturas afrodiaspóricas e africanas no ensino de matemática: uma proposta decolonial”

Unidade: Faculdade de Educação (FE)

“Sou uma mulher preta, periférica, professora e pesquisadora na área de Educação Matemática e Etnomatemática. Meu projeto de pesquisa, supervisionado pela professora Mônica do Amaral, pretende analisar os saberes de culturas afrodiaspóricas e africanas na formação docente e na prática pedagógica da educação básica.

Nasci em Araçatuba, interior de São Paulo, segunda filha da baiana Rosa e do paulista Edson. Nós nos mudamos para a capital paulista quando eu e meus irmãos, Vitor, Valdinês e Valquiria, ainda éramos pequenos. Aqui, nasceram a minha querida irmã Vilmara e, depois o pequeno Edson Victor.

Fiz a graduação em Economia na PUC/SP e em Matemática na Faculdade Teresa Martin, o mestrado em Educação Matemática na PUC/SP e o doutorado na Unesp em Rio Claro.

A bolsa permite que utilizemos o tempo com qualidade e tranquilidade para desenvolver nosso trabalho de pesquisa, viabilizando a dedicação exclusiva exigida, uma vez que não necessitamos trabalhar em outras atividades para sobreviver.”

“A bolsa é um suporte financeiro importante por possibilitar a dedicação exclusiva à pesquisa. Fortalece a compreensão de que pesquisa em universidade pública é ciência de ponta, é um trabalho sério e árduo, que necessita de reconhecimento e investimentos.”

Alessandra Tavares de Souza

Projeto: “Masculinidades negras: entre as representações da malandragem e os modos de vida de homens negros no Rio de Janeiro do pós-abolição”

Unidade: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH)

“Mulher negra, filha e neta de empregadas domésticas, nascida no subúrbio do Rio de Janeiro. Fiz minha graduação em História pela Universidade Gama Filho (2004), o mestrado em História Social pela UERJ/FFP (2012) e o doutorado em História pela UFRRJ/PPHR (2018). Sou professora da rede pública de Educação Básica do Rio de Janeiro e do Programa de Pós-Graduação em História e Cultura da África e Afro-brasileira da IPN/FatecPR. 

A iniciativa de criar editais com enfoque em ações afirmativas que incluem o recorte racial e de gênero é muito importante. No entanto, faz-se necessária sua ampliação em ações permanentes que observem o acesso a diferentes setores e níveis dentro das universidades e, sobretudo, em quantitativos com reais impactos na promoção da diversidade. 

No caso desse primeiro edital, tivemos a inscrição de 268 doutoras negras do Brasil inteiro, com pesquisas de ponta em relações raciais nas mais diversas áreas de pesquisa. Um indício muito nítido sobre uma categoria profissional qualificada muito específica, que não está sendo absorvida pelas universidades.”

“Incluir doutoras negras na condição de pesquisadoras na USP propicia representatividade e inspiração para outras acadêmicas negras que tencionam seguir este caminho, além de colaborar para aumentar a presença de docentes negras nas universidades, o que é especialmente importante em áreas como saúde coletiva, em que essa representatividade chega a ser irrisória.”

Francine Silva dos Santos

Projeto: “Alimentação e incidência de hipertensão: uma análise da interseccionalidade de gênero e raça/cor da pele no Estudo de Coorte NutriNet Brasil”

Unidade: Faculdade de Saúde Pública (FSP)

“Sou natural de Porto Alegre (RS). Realizei a graduação em Nutrição (2014), o mestrado em Nutrição e Alimentos (2016) e o doutorado em Epidemiologia (2021) pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), com período sanduíche no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, em Portugal. No ano passado, atuei como professora substituta no Departamento de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

A bolsa de pós-doutorado tem contribuído para que eu possa realizar a pesquisa com dedicação exclusiva e participar de forma plena das atividades acadêmicas que envolvem a formação de um pesquisador.

Iniciativas como esta permitem que pesquisadores negros ingressem no espaço acadêmico, um ambiente que, historicamente, é marcado pelo racismo institucional. Ainda, por ser destinada a pesquisadoras negras, a iniciativa evidenciou as iniquidades de gênero e étnicas no quantitativo de discentes, docentes e pesquisadores nas universidades brasileiras.

Por fim, ressalto que há um longo e tortuoso caminho para que negros ingressem nas universidades e concluam um doutorado. Portanto, todas as etapas que antecedem o pós-doutorado merecem atenção de ações de inclusão similares a esta.”


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