Interesse por orgânicos pode estar desacelerando consumo de ultraprocessados

Kamila Tiemann Gabe revela, contudo, que a procura pelo alimento orgânico esbarra na pouca oferta e no alto custo, situação que pede política de incentivo à produção

 14/09/2021 - Publicado há 3 anos
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Alimentos – Fotomontagem por Rebeca Alencar com imagens de Unsplash

 

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O consumo de alimentos ultraprocessados vem perdendo força e a busca pelos orgânicos está aumentando no País. Pelo menos é o que indicam pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Associação de Promoção da Produção Orgânica e Sustentável (Organis). Mas o problema para os orgânicos, analisa Kamila Tiemann Gabe, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública da USP, está na distribuição e no alto custo dos alimentos saudáveis.

Kamila Tiemann Gabe – Foto: Faculdade de Saúde Pública

“Apesar de existir interesse da população, no Brasil o alimento orgânico é ainda pouco acessível”, afirma a pesquisadora, já que existem poucas feiras orgânicas, nem todo supermercado oferta esse tipo de alimento e também pelo alto custo que apresentam em relação ao tradicional. Com o aumento da demanda, Kamila vê possibilidade de o mercado ser pressionado para uma maior oferta do orgânico a um preço acessível, o que, segundo a pesquisadora, não dispensa a criação de políticas de “incentivo e estímulo dessa produção por parte dos agricultores”.

Quanto aos ultraprocessados, a pesquisadora afirma que “houve uma desaceleração no consumo desses alimentos”. Na última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), realizada pelo IBGE em 2017-2018, o consumo de ultraprocessados foi de 18,4% das calorias consumidas pela população, enquanto na POF 2008-2009 o porcentual estava em 16%. “Foi um aumento muito menor em um período de dez anos”, avalia Kamila, comparando os 2,6% de aumento contra os 3,4% do período anterior de apenas seis anos – na POF 2002-2003 o consumo de alimentos ultraprocessados era de 12,6%.

Quanto à possível influência da publicação do Guia Alimentar para a População Brasileira de 2014, Kamila acredita que  pode ter contribuído para a desaceleração do consumo de alimentos ultraprocessados, já que a publicação ocorreu na metade do período que separou as duas últimas POFs (2008-2009 e 2017-2018). A pesquisadora conta que o Nupens foi o parceiro científico do Ministério da Saúde na confecção do documento, com “a responsabilidade de verificar as principais evidências científicas sobre alimentação e saúde disponíveis e propor recomendações apropriadas para a nossa população”.

Por que reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados?

Kamila relaciona o alto consumo de ultraprocessados com doenças como a obesidade, por exemplo, e diz que o baixo poder de saciedade desses alimentos faz o indivíduo consumir mais calorias para compensá-la. Outro fator que contribui para o aumento do consumo é a hiperpalatabilidade dessas dietas. “São feitos para serem consumidos em excesso porque são hiperpalatáveis. Eles estimulam o comer compulsivo”, alerta.

O alto consumo de alimentos ultraprocessados está ligado a doenças como a obesidade – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Além das doenças causadas pela obesidade, dietas com alimentos ultraprocessados também contribuem para “um microbioma pró-inflamatório do sistema gastrointestinal” e ainda reduzem a ingestão de “compostos bioativos” importantes ao bom funcionamento do organismo. Compostos esses “muito presentes em alimentos in natura e minimamente processados, mas que não estão presentes nos ultraprocessados”, garante a pesquisadora.

Colheitas partilhadas, sem atravessadores

Em Cravinhos, cidade da região metropolitana de Ribeirão Preto-SP, o estímulo à alimentação saudável vem da estreita relação das famílias consumidoras com o agricultor. É que, desde 2011, funciona na cidade um projeto das Comunidades que Sustentam a Agricultura (CSA-Brasil) e, segundo seu cofundador, Pedro Sanchez, além da alimentação saudável, o projeto “promove a prática agrícola mais sustentável, colaborativa e regenerativa”, em que “as colheitas são partilhadas, sem atravessadores, criando conexão entre agricultores e as famílias” da comunidade.

A proposta, adianta Sanchez, é mudar o conceito de consumidor para o de coagricultor. As famílias vivem, juntamente com o agricultor, “os desafios e benefícios da abundância que o sistema agrícola proporciona”. Dessa forma, participam na prática da produção de alimentos livres de agrotóxicos, que respeita estações do ano, ciclos naturais da planta e colheita.

Conta Sanchez que se trata de um processo produtivo humano e ecológico do campo à mesa, com agricultura que regenera, protege o solo e a água, atrai a fauna. Cuidado que “ao longo do tempo faz uma grande diferença no meio ambiente”.

Colaboração: Robert Siqueira


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