O Centro de Sismologia da USP conseguiu detectar, por intermédio da Rede Sismográfica Brasileira (RSBR), uma redução do ruído sísmico na estação de Canela, no Rio Grande do Sul, após adesão da população à quarentena seguindo um decreto do prefeito da cidade. Houve aproximadamente uma redução de 50% do nível do ruído das amplitudes dos sinais observados por esta estação, em média. O centro é mantido pelo Laboratório de Sismologia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) e pelo Grupo de Tecnologia de Petróleo, Gás Natural e Bioenergia, do Instituto de Energia e Ambiente (IEE), ambos da USP.
Os ruídos sísmicos, que são pequenas oscilações e vibrações do chão que acontecem a todo tempo, possuem diversas origens. Podem ser causados pelos oceanos, ventos, tempestades e também pela atividade humana. Grandes aglomerações, indústrias, tráfego de automóveis e outros elementos que compõem a cidade são responsáveis por gerarem ruídos sísmicos para o planeta.
O pesquisador do centro Marcelo Bianchi conta ao Jornal da USP que a partir do trabalho remoto começou, juntamente com os outros pesquisadores, a analisar as estações da rede. Eles notaram que na cidade de Canela houve uma mudança no padrão de ruído sísmico antes e depois da pandemia. Essa estação consegue detectar bem a movimentação do chão proveniente da atividade humana por estar localizada próxima às cidades de Canela e Gramado, ambas no Rio Grande do Sul.
Mudança de padrão
Segundo Bianchi, que é professor do IAG , o ruído sísmico proveniente da atividade humana afeta um intervalo de frequência específica, entre 5 e 15 Hertz. “Foi nessa frequência que observamos maior redução desse ruído. Nós notamos que na estação de Canela houve uma mudança no padrão de ruído antes e depois da pandemia, e essa mudança se deu juntamente com o decreto de fechamento do Parque do Caracol, no dia 20 de março, local onde o sismógrafo está localizado”, explica.
Os pesquisadores compararam a atividade sísmica no período antes do fechamento do parque (dia 1º até 15 de março) e durante o início do fechamento (21 de março até 5 de abril). O gráfico abaixo mostra que, com a quarentena em vigor, o nível de ruído da estação sofreu uma queda significativa no intervalo de frequência para atividade humana.
A partir da diferença entre as curvas de atividade sísmica antes e depois do fechamento do parque, Bianchi explica que foi feita uma estimativa de quanto foi essa redução. A diferença chegou a pouco menos de 5 decibéis (dB) e representa, aproximadamente, uma queda de 50% no nível do ruído em média.
“Nós também olhamos a amplitude média de vibração do chão por tempo”, contou o pesquisador. Para isso, foram usados os dados contínuos de vibração do solo captados pela estação de Canela. A amplitude do movimento do chão foi analisada em função do tempo.
“Cada pico e vale representam os períodos do dia e da noite, respectivamente. De dia há mais ruído e de noite, menos. É possível notar que, a partir do dia em que a quarentena foi declarada no parque, houve uma queda no movimento do chão. As pessoas conseguiram manter um isolamento efetivo”, explicou Bianchi. Houve uma queda de aproximadamente 50% em relação aos valores das semanas anteriores.
Análises semelhantes à feita na estação do Rio Grande do Sul foram realizadas em outras da Rede Sismográfica Brasileira. Bianchi conta que no Rio de Janeiro, por exemplo, pesquisadores também observaram uma redução do ruído sísmico em estações próximas a cidades. Ele explica que enxergar a diminuição do ruído sísmico causado pelo ser humano depende da localização do equipamento, o sismógrafo. “Em algumas dá para notar e em outras não, como as do Pantanal e do Mato Grosso que ficam dentro de fazendas, por exemplo.”
Além de ser possível detectar a adesão à quarentena por meio da atividade sísmica humana, o que não é tão viável em função do custo dos equipamentos e dificuldades de operação, essa redução também abriu espaço para detecção, com mais clareza, de microtremores e outros movimentos que são mais relevantes para o estudo do interior da Terra. “Quando temos menos ruído humano, o sinal que queremos observar, que são os terremotos, fica melhor”, finalizou Bianchi.
Mais informações: e-mail m.bianchi@iag.usp.br, com Marcelo Bianchi