O Brasil produz mais de 150 filmes por ano, com grande diversidade regional e temática. Segundo dados da Ancine, no ano de 2017, por exemplo, o público de filmes nacionais ultrapassou 17 milhões de espectadores, gerando uma renda de R$ 240 milhões. Entre os 463 longas-metragens lançados no País, 160 eram brasileiros. Ainda assim, há pontos que precisam ser mais bem entendidos no atual cenário de produção cinematográfica brasileiro, como o financiamento das produções, a distribuição dos filmes, a recente censura velada a produções como Aquarius e Marighella e o papel da Ancine.
Para debater sobre os dilemas do cinema brasileiro e suas possíveis soluções, o Diálogos na USP, apresentado por Marcello Rollemberg, recebeu o professor Roberto Franco Moreira, da Escola de Comunicações e Artes da USP, diretor de cinema e de séries de televisão, e o cineasta David Schurmann, diretor de vários filmes, entre eles Pequeno Segredo, selecionado para representar o Brasil no Oscar em 2017.
Roberto Moreira afirmou que “tivemos esse surto de produção, alguns filmes que conquistaram e vêm conquistando cada vez mais espaço nos festivais internacionais, então, este ano, foi muito importante a participação do Bacurau, de Uma Vida Invisível, no Festival de Cannes”. Ainda assim, no mercado, os nossos filmes estão com dificuldades. O professor explicou que, na verdade, “a gente não tem a presença que os filmes dos anos 70 tiveram no mercado. Naquela época, tínhamos mais de 30% de marketshare e hoje a média é em torno de 13%”.
David Schurmann relembrou que, naquela época, “não tínhamos streaming, cabo, televisão, enfim, outras formas de as pessoas consumirem cinema ou cultura audiovisual”. Dessa forma, o desafio de dialogar com o público fica maior. “Os grandes filmes da Marvel e desses grandes impérios conseguem arrastar a juventude para assistir ao filme. Eu acho que nós, como cineastas brasileiros, não estamos conseguindo dialogar através do cinema, mas sim através de outras plataformas”, afirmou o cineasta.
Moreira recordou alguns casos de censura velada do governo e afirmou que “existe um limite para a ação do governo, que é dado pela Constituição, e a gente tem que lutar para garantir que não haja censura no Brasil. Dito isso, é claro que o governo federal tem condições, sempre teve e sempre as exerceu, de controlar mais ou menos a produção cinematográfica. É assim desde a ditadura militar”. O professor ainda complementou que, “enquanto a produção cinematográfica estiver atrelada ao financiamento estatal, do jeito que ele é, vai passar por essa censura”.
O caso do filme Bruna Surfistinha é um exemplo, para Schurmann, de uma hipocrisia crescente não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro. “O caso da Bruna Surfistinha é fantástico. Se o brasileiro tem curiosidade de assistir, e é uma vida, uma realidade de muita gente, tentar censurar isso é como esconder o sol com a peneira”, disse. O cineasta ainda disse acreditar que “tentar limitar a arte é um perigo enorme, porque você cria robôs, pessoas pensando da mesma forma sem poder ser expostas a coisas diferentes”.