Glaucius Oliva: nenhum estudo similar ao da Bial reportou resultados tão dramáticos

Uma semana após a morte de um participante de testes clínicos da empresa farmacêutica Bial, na França, as autoridades ainda não chegaram a uma conclusão sobre o que deu errado. Segundo o coordenador do CIBFar, moléculas como a utilizada pela farmacêutica têm sido estudadas e desenvolvidas por outras empresas, mas não há nenhum outro caso no qual o estudo clínico gerou efeitos tão graves.

 28/01/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 05/08/2019 as 9:34
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Uma semana após a morte de um participante de testes clínicos da empresa farmacêutica Bial, na França, as autoridades ainda não chegaram a uma conclusão sobre o que deu errado. A nova droga estava na primeira fase de testes e era indicada para tratamento de doenças neurodegenerativas. Além de uma morte, outros cinco voluntários que tomaram a molécula ficaram hospitalizados; quatro deles com problemas neurológicos e, desses quatro, três podem ter danos irreversíveis.

A pesquisa da farmacêutica portuguesa Bial estava testando a segurança da nova droga em desenvolvimento

A pesquisa da farmacêutica portuguesa Bial estava testando a segurança da nova droga em desenvolvimento

Segundo Glaucius Oliva, coordenador do Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão em Biodiversdade e Fármacos (CIBFar), a droga em testes é um composto conhecido que atua como inibidor da enzima FAAH (da sigla em inglês, hidrolase de amida de ácido graxo). Esta enzima é responsável por quebrar um neurotransmissor chamado anandamida em outros subprodutos. “Inibidores da FAAH têm sido estudados e desenvolvidos por outras empresas, e nenhuma delas tinha reportado um efeito tão dramático” quanto o teste clínico da Bial, afirma o professor e pesquisador.

Os seis voluntários participavam de uma etapa da pesquisa chamada estudo clínico fase 1. Esta etapa reúne voluntários sadios para testar a nova droga e tem como objetivo principal dar segurança para a utilização do composto. É a terceira etapa de pesquisa no desenvolvimento de um novo medicamento: primeiro, é necessário passar por ensaios pré-clínicos – in vitro e, depois, em vários modelos animais.

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Entendendo a molécula

A anandamida é um endocanabinoide. Mas não tem nada a ver com a maconha: é uma substância sintetizada pelo corpo humano, que se conecta aos mesmos receptores de neurotransmissores que o princípio ativo da Cannabis sativa. A molécula do estudo clínico da farmacêutica Bial tem a propriedade de inibir a enzima que degrada a anandamida. Isso aumenta o nível de anandamida no organismo.

“Se você inibe essa enzima, ela não quebra a anandamida e, então, aumentam os níveis desse endocanabinoide próprio nosso, e ele começa a atuar nesses receptores canabinoides nossos. Pode ter aí uma liberação de vários neurotransmissores – que são as formas de transmissão dos neurônios: a serotonina, o glutamato, a dopamima. Acaba tendo efeitos como analgesia, anti-inflamatório, ansiolítico ou antidepressivo”, conta Glaucius Oliva.


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