O campus é nosso: como a participação no Plano Diretor pode criar uma Cidade Universitária melhor

Prefeitura do Campus da Capital da USP vai realizar oficinas participativas para mobilizar a comunidade e construir soluções coletivas para influenciar o futuro da Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira, no bairro do Butantã

 11/03/2024 - Publicado há 4 meses     Atualizado: 04/04/2024 as 9:54

Texto: Denis Pacheco

Vista aérea do campus da USP no bairro do Butantã - Foto: Felipe Seriacopi / USP Imagens

Quantas vezes paramos para pensar em como o ambiente urbano ao redor influencia nosso dia, nosso trabalho e até mesmo o nosso humor? Muito do stress com o qual lidamos diariamente emerge diante dos desafios que enfrentamos nas nossas cidades. 

Das crescentes dificuldades no trânsito até a solidão que sentimos pela ausência de espaços públicos de qualidade, os problemas urbanos são muitos e surgem até mesmo em lugares que emulam uma cidade como, por exemplo, a Cidade Universitária da USP, no bairro do Butantã, em São Paulo.

Por isso, com o objetivo de solucionar os problemas urbanos que também afetam o campus, a Prefeitura do Campus, a Superintendência do Espaço Físico e o Conselho Gestor do Campus USP da Capital lançaram o Plano Diretor Participativo em outubro de 2023.

Não por acaso, a ideia por trás do novo plano para a Cidade Universitária a partir de 2024 é que ele não seja apenas um instrumento pensado de forma fechada pelas respectivas autoridades, mas sim, o resultado de muita conversa. Ou seja, como o nome já enuncia, que ele seja verdadeiramente participativo, mesclando ideias de toda a comunidade formada por alunos, professores e funcionários que vivem o campus.

O que é um Plano Diretor?

O Plano Diretor é uma espécie de “mapa” que as cidades grandes precisam ter. Ele mostra o que é importante para organizar a cidade e melhorar a vida das pessoas. 

Esse “mapa” envolve várias coisas, como cuidar do meio ambiente, proteger lugares culturais, planejar o transporte, organizar terrenos e garantir água limpa e outros serviços públicos. 

Modelo rodoviarista e dispersão das construções são exemplos de decisões que ainda influenciam o campus hoje, segundo a prefeita do campus - Foto: USP Imagens

Pensando o futuro da Cidade Universitária

De acordo com a professora Raquel Rolnik, atual prefeita do Campus USP da Capital, a base do novo plano será focada nos princípios de cuidado ambiental, equidade social, transição de energia e enfrentamento das mudanças climáticas. A ideia é “repensar o campus em direção aos desafios futuros”, afirma. 

Quanto ao processo participativo, a professora expressa a importância de envolver a comunidade universitária em todas as etapas. “Não queremos apenas uma discussão técnica, mas uma participação efetiva”, afirma. 

De acordo com a prefeita, a participação contará com três fases neste ano. A primeira rodada está agendada para abril, onde será apresentada uma leitura da situação atual. Oficinas presenciais e on-line serão realizadas, abertas para toda a comunidade. A segunda rodada, em agosto, se concentrará em propostas, com Grupos de Trabalho (GTs) elaborando e lançando mais oficinas.

Ao abordar as experiências dos Planos Diretores anteriores, Rolnik reconhece o impacto duradouro das escolhas feitas no passado. “O modelo rodoviarista e a dispersão das construções são exemplos de decisões que ainda influenciam o campus hoje”, lembra ela ao reforçar que o último Plano Diretor, feito em 2013, especificamente, desempenhou um papel crucial na definição das áreas restritas para construção.

Como participar?

  • participe das oficinas presenciais e on-line que serão anunciadas pela Prefeitura do campus a partir do mês de abril
    .
  • envie sugestões para os grupos de trabalho do plano diretor: no site https://planodiretor.cb.usp.br clique no ícone do grupo para acessar a página e clique no botão que leva ao formulário on-line
    .
  • acompanhe o site do Plano Diretor e as redes sociais da Prefeitura do campus no Instagram, Facebook e Twitter

Processo participativo - cronograma

Desde que foi lançado, o processo incluiu a formação de GTs com diferentes focos: Mobilidade, Energia, Água, Resíduos, Patrimônio, Convivência, Áreas Verdes e Fauna, além de um GT de Coordenação de Equipe Interdisciplinar. Os grupos contam com membros da comunidade como professores, funcionários, alunos de graduação e pós. Suas atividades incluem pesquisas, reuniões, elaboração de propostas, registros, palestras, monitoramento de fauna e flora, diagnósticos, aplicação de métodos, questionários, coleta de dados e propostas para promover sustentabilidade no campus.

No encerramento das etapas, as propostas consolidadas serão submetidas ao Conselho Gestor do Campus e, posteriormente, ao Conselho Universitário. “O objetivo é finalizar o ano com a aprovação do conselho”, esclarece ela. 

Raquel Rolnik - Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Raquel Rolnik, prefeita do campus - Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Grupos de trabalho do Plano Diretor Participativo do campus da capital

O que é a Cidade Universitária?

De acordo com dados da Prefeitura do Campus, a Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira é o principal campus da USP em São Paulo, localizado na zona oeste, no bairro do Butantã. Nomeado em homenagem ao fundador da Universidade, Armando de Salles Oliveira, o campus abriga 63 unidades de ensino, sendo 23 exclusivas do campus, juntamente com 27 órgãos centrais da USP e 11 condôminos em uma extensão de mais de 3,7 milhões de metros quadrados.

A diversidade arquitetônica e urbanística do campus é resultado da presença de diferentes unidades ao longo dos anos. Sua história remonta à década de 1930, mas a ocupação efetiva começou nos anos 1950.

Atualmente, o campus recebe uma quantidade significativa de pessoas, variando de 80.000 a 100.000 indivíduos. A infraestrutura viária e de trânsito abrange 60 km de malha viária, aproximadamente 130 km de calçadas, 50 faixas de pedestres, oito semáforos, seis portarias de pedestres e quatro portarias de veículos, todos sob responsabilidade da Prefeitura do Campus.

Além disso, há vários restaurantes, lanchonetes e uma rede de transporte público com diversas linhas de ônibus. Por fim, a Cidade Universitária conta com 924.836 m² de áreas verdes, incluindo cerca de 33.000 árvores e reservas ecológicas que ultrapassam os 10 hectares.

Um esforço colaborativo inédito

Até sua quarta edição, em 2013, o Plano Diretor do Campus USP da Capital era elaborado exclusivamente pela Superintendência do Espaço Físico (SEF), órgão ligado à Reitoria que é responsável pela expansão física da Cidade Universitária. Nesta quinta edição, pela primeira vez, o esforço de elaboração será compartilhado entre a SEF, a Prefeitura do Campus e o Conselho Gestor, que decide sobre as atividades, uso de áreas, mobilidade, trânsito, eventos e segurança na USP.

“Anteriormente, a SEF era a única responsável pela condução dos planos diretores. No entanto, este é o primeiro em que estamos trabalhando em conjunto com a Prefeitura e o Conselho”, confirma o professor Miguel Buzzar, superintendente da SEF. Contudo, ele relembra que, nos planos anteriores, a SEF já havia criado estruturas para a colaboração interna, envolvendo diversos profissionais e especialistas no campus.

Para o professor, a estratégia participativa do novo plano reflete a mudança cultural na vida universitária: “O novo Plano Diretor busca a participação ativa de docentes, discentes e servidores, por meio de grupos de trabalho e oficinas abertas”. O ponto principal é criar um espaço de diálogo, não apenas para ensinar sobre o plano, mas para promover a troca de ideias e perspectivas.

Miguel Buzzar – Foto: Reprodução/Facebook

Miguel Buzzar, superintendente da SEF – Foto: Reprodução/Facebook

Queremos criar espaços de interlocução para que as pessoas absorvam e ajudem a construir um plano que não é só para elas, mas é delas também"

Miguel Buzzar, superintendente da SEF

Atual presidente do Conselho, o professor Ricardo Trindade ressalta a necessidade de uma discussão ampla que transcenda as unidades individuais do campus. Dividir o espaço em diferentes setores geográficos foi a estratégia para pensar na utilização do espaço físico de forma abrangente. “E o Conselho Gestor é um foro ideal para a discussão”, afirmou.

Com isso em mente, o docente pontua que o brilho da iniciativa está na participação significativa dos diferentes públicos que vivem a Cidade Universitária. Ele reforça a importância de abordar questões práticas que impactam diretamente a vida diária dos membros da comunidade, como mobilidade, uso de energia, gestão da água e resíduos. “Essas decisões definirão o futuro da Cidade Universitária”, alertou o professor.

Ricardo Trindade, presidente do Conselho Gestor - Foto: Academia Brasileira de Ciências

Ricardo Trindade, presidente do Conselho Gestor - Foto: Academia Brasileira de Ciências

Áreas das oficinas territoriais para elaboração de propostas

Mapa elaborado pela PUSP-C com dados obtidos através do portal Geosampa da Prefeitura Municipal de São Paulo (SMUL; FCHT) em out./2023

O campus é nosso

De acordo com Marina Grinover, pós-doutoranda e responsável pelo Grupo de Trabalho (GT) de Coordenação Técnica Interdisciplinar, “o Plano Diretor é, de fato, bastante participativo”. Ela explica que a composição da equipe técnica de cada GT conta com pesquisadores, estudantes, voluntários e professores especialistas, todos envolvidos na elaboração do projeto. “Estamos nesse esforço de encontrar convergências e conflitos entre os conteúdos dos GTs, tratando o plano de forma interdisciplinar e transversal”, esclarece.

Com oficinas abertas a partir de abril, Grinover defende a importância da coordenação técnica na articulação entre os diversos assuntos, destacando a abertura para o diálogo com a comunidade da USP. Ela enfatiza que “o objetivo é evitar que o plano se torne uma soma isolada dos conteúdos dos GTs, promovendo um diálogo mais amplo”. 

Ao discutir sobre a participação ativa da comunidade, a pesquisadora lembra o momento significativo que nossa sociedade vive, reforçando a importância de uma abordagem coletiva para resolver problemas locais e reconhecer virtudes.

O Plano Diretor é um instrumento que não apenas identifica deficiências, mas estabelece ações concretas, sendo essencial para todos os habitantes da USP"

Marina Grinover, pós-doutoranda e responsável pelo Grupo de Trabalho (GT) de Coordenação Técnica Interdisciplinar

Membro da equipe do GT de Coordenação, Caique Bodine, estagiário e aluno do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, participa ativamente de reuniões dos grupos, auxiliando na identificação de temas comuns e conflitos.

Sobre a importância do Plano Diretor Participativo, Bodine salienta a necessidade de dar voz aos estudantes em decisões cruciais para o campus. Ele critica a falta de representatividade em espaços democráticos e defende a inclusão dos alunos na elaboração de planos, não apenas na universidade, mas em toda a sociedade.

“Os alunos nem sempre são chamados a tomar voz nos espaços, seja nos planos da cidade de São Paulo ou na representatividade histórica dos estudantes”, opina Bodine. Por isso, o estudante defende que é vital considerarmos a realidade do dia a dia dos estudantes, como as dificuldades de locomoção enfrentadas por vários deles, por exemplo.

Para ele, o novo Plano Diretor Participativo é uma oportunidade para a geração atual, especialmente em um momento decisivo envolvendo as mudanças climáticas, atuar em um “laboratório vivo” que pode influenciar mudanças significativas, inclusive na capital paulista.

Comunidade universitária pode ser agente ativo na definição dos espaços - Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Cem anos da USP em 2034

Em relação à dimensão ambiental e climática, a professora Raquel Rolnik sublinha a urgência de transformações abrangentes, desde mobilidade até questões relacionadas a áreas verdes e emergência da água. “Temos que pensar como nos organizar para enfrentar esses aspectos”, afirmou a professora. Ela alerta que o campus não é apenas um espaço físico, mas um patrimônio cultural material e imaterial que deve ser considerado em qualquer decisão.

Com o objetivo de traçar os rumos da Cidade Universitária pelos próximos dez anos, o projeto pretende culminar em um marco histórico para a USP, seu centenário. 

Para Miguel Buzzar, o Plano Diretor é uma oportunidade para a comunidade universitária não ser apenas agente passivo, mas se tornar agente ativo na definição dos melhores espaços para ensino, pesquisa e convívio. A partir de 2025, as discussões sobre o plano serão direcionadas para cada unidade, possibilitando a reavaliação dos espaços de aprendizagem e convívio.

Ao destacar a coincidência do centenário da USP com a projeção mais longa para o campus, o presidente do Conselho Gestor Ricardo Trindade também reflete sobre o que se espera para o futuro da instituição: “Participar do Plano Diretor definirá os usos dos espaços e influenciará a qualidade de vida de todos”. Por isso, de acordo com o professor, “precisamos falar com todos os grupos para criar algo que abrace as diferentes visões”, conclui.

Divulgar as oficinas participativas, diz Marina Grinover, é parte da “força-tarefa” deste mês de março, já que o objetivo é mobilizar a comunidade para participar ativamente do processo. Para ela, o Plano Diretor da USP representa “uma oportunidade única para os membros da comunidade universitária influenciarem o futuro do campus, promovendo a democratização do conhecimento e a construção de soluções coletivas”.

Acompanhe o andamento do Plano Diretor Participativo do Campus USP da Capital neste link e acompanhe a Prefeitura do campus no Instagram, Facebook e Twitter.


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