Tarcísio Pereira: todos os livros do mundo

O orgulho de ter sido livreiro de três gerações literárias: a geração 45, a geração 65 e a geração dos Independentes, que seria, teoricamente a geração 85

 13/10/2023 - Publicado há 9 meses     Atualizado: 16/10/2023 as 11:11
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Eu acabo de ler um livro muito interessante sobre a trajetória de Tarcísio Pereira, livreiro que marcou data na vida cultural do Recife entre as décadas de 60 e 90. O trabalho é assinado pelo jornalista Homero Fonseca e foi publicado no ano passado, ou seja, em 2022, pela Cepe (Companhia Editora de Pernambuco). Conheci o Recife na poesia de Manuel Bandeira e depois, em 98 ou 99, quando visitei a cidade, já tinha todo um repertório literário pronto na minha cabeça […] digo isso porque o livro de Homero Fonseca me fez pensar que, de fato, eu também gostaria de ter visitado aquele mega galpão com seus 1.200 metros quadrados na rua Sete de Setembro. E há fotos interessantíssimas, que mostram a livraria abarrotada de gente – aliás, depois da vivência com os livros, as pessoas costumavam se reunir no Bar 7, uma extensão da livraria.

Na verdade, a afluência de escritores, pesquisadores, políticos, profissionais liberais e artistas não se restringia às famosas sessões de autógrafos. A Livro 7, fundada primeiramente numa loja modesta, como escreve o autor, em um cubículo de 20 metros quadrados, em meados dos anos 60, portanto, em plena ditadura, mudou-se em poucos anos para um casarão para, finalmente, tornar-se a maior livraria do Brasil. Podemos concluir que, desde o início, o poder de atração de Tarcísio Pereira era muito forte: vemos fotografias de Miguel Arraes chegando do exílio, de Gilberto Freire, de Ariano Suassuna, e até uma fila imensa de leitores que aguardavam o autógrafo de Sidney Sheldon, ou seja, apesar da presença de um público de esquerda, o que levou a ditadura a vigiar de perto o movimento da livraria, a 7 se tornou um espaço de sociabilidade, vivência literária, muito heterogêneo; além de tudo, o ‘senhor 7’ era um grande inovador de suas práticas livreiras.

Para citar dois exemplos: primeiro, ele enviava aos clientes fiéis amostras de livros recém-chegados. O cliente tinha total liberdade para escolher seus títulos, devolver os demais e, ainda por cima, pagava tudo no final do mês. Ele também criou um serviço de crédito vinculado à livraria; no entanto, as crises econômicas que tomaram de assalto o País ao longo dos anos 90 fragilizaram de tal modo a saúde financeira da livraria, que o seu proprietário foi acumulando muitos calotes dos seus clientes. Em 1999, a Livro 7 fechou as portas.

Seu proprietário, longe de cair no ostracismo, manteve-se firme no mundo dos livros. Este cidadão potiguar, que mais tarde receberia o título de Cidadão Honorário do Recife, no dia 25 de janeiro, aos 73 anos, foi vitimado por complicações da covid-19.  Como ele mesmo disse, ‘uma coisa de que tenho orgulho é de ter sido livreiro de três gerações literárias: eu servi a geração 45, a geração 65 e, depois, a geração dos independentes, que seria, teoricamente, a geração 85.

Foi ele, sobretudo, o livreiro de todo o mundo.


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