A gravidez de adolescentes é um problema alarmante no Brasil há anos, mas esse cenário começa a mudar. Recentemente, um estudo da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo revelou que o número de casos de gravidez precoce em adolescentes de 10 a 19 anos no Estado, entre 1998 e 2021, se reduziu em 65,3%, ou seja, de 141 mil casos/ano caiu para 49 mil/ano. Já a taxa de redução geral do País fica em 37%. Uma justificativa plausível para esse número seria a falta de métodos contraceptivos de longa duração disponíveis.
A gravidez precoce é um problema de saúde pública e acarreta riscos de vida para a mãe e para o bebê, além de problemas sociais, maior grau de vulnerabilidade, entre outras consequências. Mas, com os avanços nos métodos contraceptivos e maior incidência da disseminação do assunto, o Estado de São Paulo teve uma queda significativa. A professora Carolina Sales Vieira Macedo, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, comemora os números alcançados, mas aponta que, em comparação com o restante do Brasil, as taxas não se equivalem.
“Essa redução no Estado é um fato que temos que comemorar. No Brasil, a queda foi de 37%. É claro que os períodos não foram semelhantes, mas eles se sobrepõem. Isso quer dizer que provavelmente as adolescentes tiveram mais acesso à informação, métodos de prevenção, talvez também o aumento da escolaridade”, explica.
Métodos contraceptivos
Em relação à contracepção, a professora comenta que é possível melhorar ainda mais os resultados obtidos em São Paulo e, também, no Brasil. Como exemplo de políticas públicas bem-sucedidas, Carolina cita um projeto realizado pelo Reino Unido para reduzir a gestação na adolescência em dez anos.
Segundo ela, nos primeiros anos, foram trabalhados planos e objetivos de vida. Já nos últimos seis anos, o projeto instituiu os contraceptivos reversíveis de longa ação, o implante e o Dispositivo Intrauterino (DIU). “Quando eles colocaram esses métodos gratuitamente para todas as pessoas, incluindo adolescentes, eles tiveram, só em seis anos, uma queda de 42%. Isso é muito relevante”, declara.
Em contrapartida, Carolina aponta que no Brasil são mais usados os métodos de curta ação, como a pílula contraceptiva e a injeção anticoncepcional. E, apesar de eficazes, na prática, esses métodos acabam tendo mais falhas devido a questões como o esquecimento, por exemplo. Dessa forma, a especialista chama a atenção para o fato de que, por melhor que tenha sido essa redução, poderia ser melhor se tivessem mais métodos de longa ação disponíveis.
“Embora essa queda no Estado tenha sido muito importante, muito maior do que a do País, também temos que pensar que as adolescentes se apoiaram em métodos que são sujeitos a falha. O único método que tem, e que não precisa lembrar, no Sistema Único de Saúde (SUS) é o DIU, mas existem muitas barreiras para a colocação por profissionais do SUS. Na população geral do Brasil, apenas 4% usam métodos de longa ação.”
Considerações necessárias
Muitas vezes, a falta de prevenção da gravidez tem origem em importantes circunstâncias que devem ser levadas em consideração. A coordenadora Albertina Duarte Takiuti, do Programa do Adolescente da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo e do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP), lista a falta de autoestima, tendência grupal e atemporalidade como exemplos. “Se ela se sente com uma imagem negativa, que ela é muito pouco importante na relação, ela não vai impor nada no relacionamento. E a desvalorização, a falta de autoestima nessa relação implica muito na questão da não prevenção”, comenta.
Sobre a tendência grupal, Albertina afirma que o adolescente que não se sente pertencente a certo grupo social, que fica muito dependente da relação desse namoro, da aprovação desse relacionamento, fica extremamente limitado nos seus desejos. Além disso, de acordo com ela, a atemporalidade tem muita relevância. “O adolescente tem muita dificuldade de lidar com o tempo e tem sentimentos mágicos. ‘Não vai acontecer comigo, pode ter acontecido com a minha irmã, com a minha amiga, mas não vai acontecer comigo’.”
Entendendo essas situações, a secretária conclui que é assim que as políticas públicas devem atuar, além da distribuição de métodos contraceptivos. “Vamos trabalhar com o grupo, com a melhora da autoestima, melhora da relação e entender que a adolescente não é culpada porque engravida, a culpa é do Estado, da sociedade, da família, que não lhe deram opções para que ela pudesse ter um projeto de futuro, além do projeto da gravidez”, pontua.
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