Maria Hermínia Tavares de Almeida recebe título de Professora Emérita

Na USP, a pesquisadora teve papel essencial no Departamento de Ciência Política da FFLCH e na formatação do Instituto de Relações Internacionais; fora da Universidade, destacou-se ainda na Unicamp, no Cebrap e em veículos de comunicação

 25/03/2024 - Publicado há 1 mês     Atualizado: 02/04/2024 as 18:00
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(Da esq. p/ dir.) Paulo Martins, Rafael Duarte Villa, Maria Hermínia Tavares de Almeida, Maria Arminda do Nascimento Arruda e Fernando Papaterra Limongi – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens


A última sexta-feira, 22 de março, foi um dia de muita emoção para a comunidade da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e em especial para Maria Hermínia Tavares de Almeida, que nessa data, em cerimônia realizada no Conselho Universitário (Co), recebeu o título de Professora Emérita da faculdade. 

Seu papel, no entanto, ultrapassa os limites daquela unidade de ensino, da qual Maria Hermínia é docente aposentada. Sua atuação passou ainda pela docência e direção do Instituto de Relações Internacionais (IRI), além de ser pesquisadora sênior do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), destacada autora de livros, colunista do jornal Folha de S. Paulo e pesquisadora nas áreas de políticas públicas, opinião pública e política externa.

A entrada da professora na sala do Co foi acompanhada de seus padrinhos, os eméritos Gabriel Cohn e Sergio Miceli, sob aplausos de uma plateia lotada. 

Na mesa, o diretor da FFLCH, Paulo Martins, abriu o evento destacando o significado desse título devido à importância de Maria Hermínia tanto no plano intelectual, pela relevância de suas pesquisas, como também no lado institucional, com as contribuições trazidas pela homenageada na organização do Departamento de Ciência Política e na gestão dos programas da unidade. 

A fala foi corroborada pelo chefe daquele Departamento, Rafael Duarte Villa, que também buscou destacar Maria Hermínia em suas várias dimensões: “Uma pesquisadora que é construtora de instituições, que transitou pela Unicamp, pela FFLCH e pelo IRI e em todas essas instituições foi fundamental para estabelecer bases da ciência política em uma enorme empreitada que não foi endógena, mas se espalhou nacional e internacionalmente”. Villa ressaltou também o caráter pluralista e de diálogo da professora, que “sempre soube escutar, mesmo nos embates, as diferentes posições e vozes que transitam pela Universidade. Não é por acaso que sua última posição na USP foi a de ouvidora”. 

Coube ao professor do Departamento de Ciência Política, Fernando de Magalhães Papaterra Limongi, resumir ao público presente a trajetória de Maria Hermínia, lembrando que, em meio às impossibilidades trazidas na época do regime militar, ela não pôde seguir carreira acadêmica na USP após sua formatura, em 1969. Em 1974, começou a lecionar na Unicamp, onde teve papel fundamental nos programas de Ciências Sociais e de Ciências Políticas. Mais tarde, já na USP, liderou a formação e chefiou o Departamento de Ciência Política da FFLCH (leia texto completo abaixo). 

A vice-reitora, Maria Arminda do Nascimento Arruda, encerrou a cerimônia enaltecendo a história da homenageada: “É com imensa alegria que participo desta cerimônia, porque essa homenagem celebra a condição de uma professora, intelectual e cientista política da mais alta envergadura, que construiu uma biografia exemplar, na sua geração e nas gerações que sucederam a sua. Trata-se de uma referência insuperável da nossa melhor ciência social. A relevância do seu trabalho e a qualidade da sua atuação nos mais diversos campos da vida acadêmica e intelectual são impressionantes. Muito raramente encontra-se no nosso meio, no Brasil ou no exterior, uma cientista social com essa qualidade e que atua em diversos campos”. Maria Arminda destacou também o compromisso da nova Professora Emérita com o espírito público: “Sempre comprometida com as questões do Estado, como o federalismo, a democracia, o sindicalismo, os partidos, as eleições, enfim, os problemas fundamentais do Brasil estão sempre em sua busca”, pontuou.

Confira abaixo texto do professor Fernando Limongi:

“A professora Maria Hermínia Brandão Tavares de Almeida desempenhou papel central na formatação e desenvolvimento da Ciência Política no Brasil. Sua contribuição para a implantação do Departamento de Ciência Política é incomensurável. Assim, a concessão do título de Professora Emérita a Maria Hermínia é um reconhecimento natural de sua liderança e papel dentro da Universidade de São Paulo e no mundo acadêmico nacional e internacional.

Em sua carreira, a professora Maria Hermínia se destacou pela sua contribuição acadêmica e pelo desempenho de várias posições institucionais. Graduada em Ciências Sociais pela USP nos fins dos anos sessenta, Maria Hermínia completou sua formação no Chile, na Facultad Latino Americana de Ciências Sociales – FLACSO. Retornou ao Brasil e ao DCP para obter o título de doutora em 1979. O seu trabalho de doutorado se insere em uma profícua e original linha de investigações sobre as especificidades da formação e da atuação política da classe trabalhadora no Brasil moderno.

Sua tese, intitulada Estado e Classes Trabalhadoras no Brasil (1930-1945), orientada por Francisco Weffort, dialoga e complementa a agenda de pesquisa de seu orientador e de alguns de seus mestres mais ilustres, como Leôncio Martins Rodrigues, Azis Simão, Juarez Lopes Brandão, para citar apenas os mais diretamente relacionados à temática tratada. Se alargarmos o foco, o trabalho pode ser situado dentro da agenda de trabalhos da primeira geração de pesquisadores formados dentro da tradição das cadeiras de Sociologia II e de Política, a saber, a de identificar as peculiaridades da formação histórica do Brasil e, mais especificamente, do processo de formação das classes sociais e da ordem industrial no País. Maria Hermínia contribuiu decisivamente para esse debate por meio de uma leitura mais atenta e historicamente situada da interação entre as estruturas estatais e o movimento sindical, abrindo as portas para o abandono de visões reducionistas do papel do Estado. 

As restrições políticas vigentes impediram que Maria Hermínia iniciasse sua carreira acadêmica na USP, forçando-a a buscar abrigo na recém-criada Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde permaneceu entre 1974 e 1987. Nesta instituição, foi responsável direta pela montagem do curso de graduação e, mais importante, pela estruturação da pós-graduação. Esse trabalho pioneiro e verdadeiramente inovador se provou fundamental para a incorporação da ciência política à Unicamp à USP. Do ponto de vista institucional, Hermínia contribuiu ainda naquele momento para a criação e consolidação da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais – Anpocs.

No plano acadêmico, em sua passagem pela Unicamp, Hermínia se destacou pela introdução e disseminação dos estudos de políticas públicas. Sua contribuição para a implantação desse campo de estudos no Brasil foi e continua a ser enorme. No interior do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas – NEPP, por ela criado e dirigido, formou-se uma geração de pesquisadores que contribuiu decisivamente para a definição da agenda de pesquisas que marcou esse campo. 

Em 1988, com a criação do Departamento de Ciência Polícia, transferiu-se para a USP, onde deu continuidade às suas atividades acadêmicas, além de manter sua inesgotável e notável capacidade de construção institucional. Basta dizer que Maria Hermínia foi responsável direta pela bem-sucedida estratégia de renovação geracional do departamento e, ao mesmo tempo, pela ampliação dos enfoques e perspectivas contempladas pelo Departamento. Seu investimento institucional também pode ser reconhecido na liderança na sua participação na criação, no início da década de 1990, do Programa de Política Internacional e Comparada. 

Dentre seus trabalhos acadêmicos, destaca-se sua contribuição decisiva para integrar os estudos sobre políticas públicas, federalismo e reformas do Estado pós-redemocratização. Basta dizer que seu artigo seminal sobre o tema, “Federalismo e Políticas Sociais”, publicado em 1995 na Revista Brasileira de Ciências Sociais, é o artigo nacional de ciência política com o maior número de citações acadêmicas. Seu livro Crise Econômica e Interesses Organizados, publicado em 1997 pela Edusp, resultado da tese de Livre Docência defendida na USP dois anos antes, discute de forma aprofundada os dilemas enfrentados pela nascente ordem democrática brasileira.

Em resumo, por sua inestimável contribuição à Ciência Política brasileira, Maria Hermínia Brandão Tavares de Almeida faz jus ao reconhecimento de seus pares com a concessão do título de Professora Emérita.”

Assista à íntegra da cerimônia abaixo:


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