Livro resgata luta judicial indígena contra colonização

Pesquisa da USP analisa os meios jurídicos empregados por povos indígenas no século 18 para alcançar a liberdade

 20/03/2024 - Publicado há 1 mês
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Capa do livro Cativas litigantes, de Luma Ribeiro Prado – Foto: Divulgação/Elefante

 

Na próxima sexta-feira (22), a partir das 18h30, na livraria Tapera Taperá, em São Paulo, acontecerá o evento de lançamento do livro Cativas litigantes. A obra é resultado da dissertação de mestrado da historiadora Luma Ribeiro Prado, apresentada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Em 2020, Luma foi a vencedora do Prêmio História Social da USP com a apresentação de seu estudo intitulado Cativos litigantes: demandas indígenas por liberdade na Amazônia portuguesa, 1706-1759. Publicado pela Editora Elefante, o livro aborda os meios pelos quais os indígenas conseguiam recorrer à justiça em busca de melhores condições de vida, trabalho e, até mesmo, liberdade no século 18. 

Para entrar na justiça, os indígenas precisavam de um representante, o procurador dos índios. A descoberta dessa categoria inspirou o tema do estudo a partir da leitura de um artigo da professora Beatriz Perrone-Moisés no livro História dos Índios no Brasil. Ao encontrar esse cargo da administração portuguesa, ficou evidente que os indígenas moviam ações na justiça, levando ao tema da pesquisa.

Luma Ribeiro Prado, historiadora – Foto: Currículo Lattes

O livro serve como componente da memória e resistência dos povos indígenas, que moviam processos nas cortes coloniais desde 1706, buscando libertar a si e seus parentes da escravidão, à qual estavam submetidos nas regiões do Pará e do Maranhão. A pesquisa traz informações a respeito da incompletude jurídica atribuída aos indígenas no período colonial. O enquadramento nessa categoria impedia que os indígenas entrassem na justiça por conta própria, pois não eram reconhecidos pela lei como sujeitos de direito. Sobre isso, Luma explica que “um ponto importante do acesso indígena à justiça no século 18 é que ele deveria ser mediado pela figura do procurador dos índios, uma vez que os nativos da Amazônia foram considerados ‘miseráveis em direito’. Eles foram enquadrados na sociedade do Antigo Regime portuguesa numa categoria jurídica de incompletude”. 

Demandas por liberdade

A autora consultou documentos nos arquivos do Norte do Brasil, no Arquivo Público do Estado do Maranhão (Apem) e no Arquivo Público do Estado do Pará (Apep). E também registros guardados em Portugal, no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), publicados pelo Projeto Resgate, responsável por catalogar documentação histórica referente ao Brasil no período anterior à Independência, e na Biblioteca Nacional de Portugal (BNP). Desses documentos, ela analisou 160 registros de demandas por liberdade, o que corresponde a pelo menos 330 litigantes, já que um pedido poderia incluir mais de uma pessoa. A documentação reunia petições, requerimentos, apelações, indicações de processos e autos fragmentados.

Ao longo da obra, Luma investiga como os indígenas usavam as leis de regulação da escravidão para reivindicar liberdade, denunciar senhores infratores e expor cativeiros clandestinos. O uso dos aparatos jurídicos envolvia uma série de questões, como o domínio da linguagem corrente, a oportunidade de estabelecer redes de aliança com indivíduos em situação semelhante e o conhecimento de determinadas leis e processos jurídicos. A preferência pela via institucional se devia ao fato de que, muitas vezes, a fuga não era uma possibilidade segura, além do perigo da reescravização.

Serviço

O lançamento será às 18h30, na livraria Tapera Taperá, localizada na Galeria Metrópole, Av. São Luís, 187 – Centro, Loja 29, 2º andar, e contará com a participação de Eloy Terena, advogado indígena e assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Márcia Mura, doutora em História Social pela USP, e Samuel Barbosa, docente da Faculdade de Direito da USP. 

Mais informações: rprado.luma@gmail.com

*Estagiária sob supervisão de Antonio Carlos Quinto


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