Colorindo a engenharia: coletivo LGBTQIA+ da Poli promove a oitava “Semana da Diversidade”

Em edição inédita, o evento contará com a participação de 13 empresas para discutir representatividade e políticas de inclusão no mercado profissional e palestras sobre as vivências de personalidades negras e 60+ da comunidade; semana ocorrerá entre os dias 24 e 27 de outubro

 21/10/2022 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 24/10/2022 as 6:47
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Fotomontagem com imagens de Marcos Santos/USP Imagens, Reprodução/Frente PoliPride e Texturelabs por Rebeca Fonseca

 

Qual perfil de pessoa você imagina quando ouve falar em engenharia? Na maioria das vezes, vem logo a ideia de ser um curso ocupado somente por homens, sobretudo, brancos, e mais ricos. Historicamente, essa é uma verdade. Em 2004, a Escola Politécnica (Poli) da USP possuía somente 43 docentes mulheres. Menos de dez por cento de um total de 470 professores. Já em 2018, Liedi Bernucci foi eleita a primeira mulher a ocupar o cargo de diretora da unidade, o que representou um marco na trajetória da participação feminina e inspirou outras mulheres a adentrar o campo da engenharia.

Liedi Bernucci – Foto: Poli

De acordo com a professora Liedi, que também foi a primeira mulher homenageada pela Associação dos Professores Politécnicos (AEP), em 2016, a pauta da inclusão e diversidade será um passo importante para fomentar uma Universidade mais rica a partir de diferentes perfis de estudantes que a ocupam. “A igualdade de gênero, a tolerância e a construção do respeito pela diversidade e inclusão precisam estar no cotidiano das atitudes e devem ser fonte de constante reflexão individual e coletiva. Sem este caminho, não há bem-estar social pleno, ambiente saudável e construtivo nas escolas, no trabalho, no convívio social”, diz.

Após a implementação da Lei de Cotas, esse perfil homogêneo, sobretudo nos cursos de ciências exatas, está sendo alterado. Entidades vêm surgindo na Universidade para fortalecer a ideia de que essas áreas devem e podem ser ocupadas por quaisquer pessoas. Na USP, recentemente a Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) foi criada com o objetivo de apoiar  e desenvolver políticas inclusivas e de permanência, pautadas sob a ótica da equidade e da interseccionalidade. 

Já nas entidades estudantis, movimentos como a Frente PoliPride, coletivo LGBTQIA+ da Poli, estão realizando atividades para apoiar a diversidade. A proposta é politizar as demandas de estudantes da comunidade a partir de uma frente ampla que trabalhe para a afirmação do grupo e para que suas pautas sejam apresentadas de forma conjunta entre os alunos.

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Desta vez, o coletivo de diversidade sexual e de gênero da Poli realiza, entre os dias 24 e 27 de outubro, a oitava edição da Semana de Diversidade da Escola Politécnica (Sedep). O evento é organizado anualmente pelo coletivo e tem o objetivo de promover a diversidade dentro da Poli, discutindo temas importantes para a comunidade LGBTQIA+, como a atuação da psicologia no auxílio do processo de aceitação sexual e vivências de personalidades transgênero e pretas da comunidade no mercado profissional.

As inscrições podem ser realizadas neste link. Este ano, também haverá um kit disponibilizado pelo coletivo para todos os participantes inscritos e um coffee break ao final de cada palestra.

Em edições anteriores, a Sedep reuniu diversos nomes de relevância política, como Eduardo Suplicy, Rita Von Hunty, Bryanna Naske e Erika Hilton, ativista dos direitos LGBTQIA+ e recém-eleita ao cargo de deputada federal. Este ano, o evento retoma a modalidade presencial, mas também será transmitido simultaneamente pelo canal de Youtube do coletivo. 

Como contam os organizadores da Sedep, esse momento é importante não só para os jovens universitários, mas também para a comunidade externa, pois será um espaço no qual haverá palestras, mesas-redondas, minicursos, entre outras atividades que abordam e ampliam o debate em torno dos temas que envolvem diversidades e a comunidade LGBTQIA+. 

Gabriella Ferreira – Foto: Arquivo pessoal

Para Gabriella Ferreira, coordenadora do PoliPride e estudante de Engenharia de Materiais, “estar à frente e participar do coletivo permite que se tenha um contato direto com as pessoas LGBTQIA+ da faculdade, bem como com outros coletivos que possuem lutas similares; é uma posição de solidariedade e resistência. A luta por nosso espaço e direito é necessária e poder contribuir com a comunidade, propiciar um espaço em que as pessoas possam ser quem são, é muito gratificante.”

 

Colorindo a programação

De forma inédita, a oitava edição durará quatro dias e contará com debates sobre diversidade e iniciativas de inclusão a partir do ativismo digital, redes de acolhimento LGBTQIA+ e participação de personalidades da comunidade que compõem o mercado de trabalho em algumas das 13 empresas que estão patrocinando o evento. Dentre os convidados, participarão Jonas Maria, escritor e produtor de conteúdo on-line sobre transexualidade, e Bryanna Nask, selecionada pelo Youtube Next Up, programa de aceleração global do Youtube, após discutir não-binariedade na plataforma de maneira simples e acessível.

Também participa Thais de Azevedo, 73, contrariando a expectativa de vida de 35 anos da comunidade trans no Brasil. A presidenta do Grupo pela Vidda – ONG que promove a integração de pessoas vivendo com HIV, independente de gênero, orientação sexual, político-partidária ou religiosa – contará as suas vivências e os desafios, sobretudo na terceira idade, em ser uma mulher trans ativista em um dos países que mais mata essa população no mundo.

Debatendo a participação profissional da comunidade LGBTQIA+, estará Gerson Mella, executivo de recursos humanos, focado principalmente em gestão de talentos, diversidade, inclusão e equidade na Eastman Chemical do Brasil, uma das empresas patrocinadoras da Semana.

Gerson Mella – Foto: Reprodução

Formado em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Gerson conta que já na década de 1990 sentia naquela unidade um ambiente bem menos heteronormativo do que em outras faculdades da Universidade. Atuante na área de RH há 25 anos, ele conta ao Jornal da USP que infelizmente ainda existe um pensamento retrógrado da maior parte do empresariado puramente nacional, que continua a criar barreiras para programas de inclusão e diversidade na maioria das empresas. 

“Dentro da minha experiência, o que vejo é um preparo maior por parte das multinacionais, especialmente americanas e europeias, em ter processos seletivos e políticas internas que fomentem e suportem seus programas de diversidade e inclusão. A defesa das políticas internas nesses programas garante um ambiente acolhedor e de apoio às diferenças, ao novo, ao divergente. Por isso, tamanha importância dessa função para desenvolver esses talentos, auxiliando atingirem o seu potencial máximo, com impacto significativo nos resultados da empresa”, relata.

Participando desde outras edições, Gerson enxerga que a participação da Eastman na Semana de Diversidade da Poli acabou gerando uma série de oportunidades não só para fomentar essa política de diversidade e inclusão na empresa que ele atua, como também incentivando outras empresas a apoiarem iniciativas como essa. Além disso, foi possível ajudar e preparar os jovens nos desafios que virão pela frente, ao expor a realidade atual do mercado de trabalho e o que devem esperar do futuro.

 

Frente PoliPride

Dan Ni Lin – Foto: Arquivo pessoal

Criado em 2013, o coletivo PoliPride tem como objetivo acolher, integrar e empoderar a comunidade LGBTQIA+ na Poli. De acordo com Dan Ni Lin, estudante de Engenharia de Petróleo, a expectativa para o evento deste ano é possibilitar aos participantes aprenderem ao máximo sobre a pauta da diversidade a partir das inúmeras atrações que o coletivo organizou. De acordo com ela, “precisamos entender que a Poli não é composta somente por pessoas brancas inseridas no perfil heteronormativo. A Poli está cada vez mais diversa (pessoas negras, LGBTQIA+, asiáticos etc.) e acessível a todes, e é preciso estimular cada vez mais isso.”

O coletivo ressalta que a Poli também possui outros movimentos estudantis que colaboraram com a realização do evento, como a Poli Negra, coletivo negro da unidade, e a Poli Junior, empresa junior que atualmente possui uma frente de diversidade. A Diversi PJ promove reuniões contra a opressão e discriminação diante das minorias que compõem a empresa, que é formada somente por estudantes.

Junto com a Frente PoliPride, os núcleos desenvolveram uma parceria, durante a semana com os grupos de extensão da Poli, promovendo a Oficina Casulo, uma oficina com workshops voltados às minorias.

O coletivo desenvolve ações para estimular a permanência e a diversidade de gênero na engenharia – Foto: Reprodução/Frente PoliPride

 

O coletivo possui também projetos de pertencimento, sendo um deles responsável por mudanças no espaço universitário, como o Banheiro Para Todes, iniciativa de inclusão para alterar as placas dos banheiros de modo a abranger expressamente pessoas trans. Durante os anos de isolamento social causado pela pandemia, o PoliPride desenvolveu edições do Programa de Mentoria LGBTQIAP+, em que alunos de primeiro e segundo anos recebiam alunos dos últimos anos como mentores. 

Para mais informações:

https://www.sympla.com.br/evento/viii-semana-de-diversidade-da-escola-politecnica-da-usp/1739763 

@sedep.polipride

@frente.polipride


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