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Casos de psicose em Ribeirão Preto e região estão ligados à cor da pele e às adversidades sociais
Constatação é feita em estudo realizado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, que avaliou pacientes em Ribeirão Preto e em outras 25 cidades da região
A psicose pode ser identificada quando o paciente apresenta sintomas como alucinações, delírios, comportamento e fala desorganizados - Ilustração: storyset/Freepik
Na cidade de Ribeirão Preto e região, as pessoas que se autodeclaram negras e que convivem com as adversidades sociais estão mais sujeitas a desenvolverem um primeiro episódio de psicose. De acordo com o estudo de mestrado Interação entre cor de pele autodeclarada e adversidades sociais como fator de risco para as psicoses, de autoria da médica psiquiatra Fernanda Naira Zambelli Ramalho, num universo de 197 pessoas diagnosticadas com um quadro de primeiro episódio psicótico, 49,8% (98) se autodeclararam como não brancas . “No nosso estudo tivemos um grupo controle composto de 302 pessoas saudáveis, não diagnosticadas com o problema. Dentre elas, 68,5% (207) se autodeclararam brancas e 31,5% (95) não brancas”, diz Fernanda, que desenvolveu sua pesquisa no Programa de Mestrado Profissional da FMRP, sob a orientação da professora Cristina Marta Del-Ben.
Fernanda conta que foi detectada uma maior incidência de psicose nos municípios menores que ficam nos arredores da cidade de Ribeirão Preto. Ao todo, o estudo envolveu outras 25 cidades menores da região, compreendendo uma área de 9.300 quilômetros quadrados (km2) e uma população de aproximadamente 1,3 milhão de pessoas. “Fica claro que o desenvolvimento socioeconômico é um fator de risco, visto que os municípios analisados possuem piores indicadores socioeconômicos em relação a Ribeirão Preto”, analisa a médica em entrevista ao Jornal da USP. Lembrando que os municípios analisados, em sua maioria, têm as atividades rurais e agrícolas como principal fonte de renda. O levantamento de dados, como informa Fernanda, foi realizado entre os anos de 2012 e 2015.
Fernanda Naira Zambelli Ramalho - Foto: Arquivo Pessoal
Questionários
Para o levantamento e análise dos dados e com o consentimento de todos os participantes e responsáveis, os pesquisadores aplicaram questionários aos pacientes que eram atendidos via ambulatórios, pronto-atendimentos e enfermarias. “A medida de vulnerabilidade social utilizada foi o índice de desvantagem social, que foi calculado pela somatória de indicadores sociodemográficos como escolaridade, situação empregatícia, estado civil e apoio social”, descreve a médica psiquiatra.
Segundo a pesquisadora, cerca de 22% do risco aumentado de psicose na população negra (ou não branca) pode ser explicado pela desvantagem social. “Os outros cerca de 80% correspondem a fatores ambientais e genéticos, sendo eles alvos de investigação intensa do nosso grupo de pesquisa coordenado pela professora Cristina Del-Ben”, aponta Fernanda.
O tratamento básico para um primeiro surto de psicose consiste em medicações antipsicóticas. “É também recomendável que se tomem medidas socioeducativas de psicoeducação junto às famílias para que se combata o estigma do diagnóstico psiquiátrico e se tenha regularidade na administração das medicações e nas consultas de reavaliação médica periódica ”, recomenda Fernanda. “E o não tratamento adequado para um primeiro surto de psicose pode ocasionar a piora progressiva dos sintomas e a falha da resposta à medicação, levando até a consequências sociais, pois pode colocar em perigo a própria pessoa ou terceiros, devido ao risco de episódios de agressividade e agitação psicomotora quando o quadro não é tratado.”
Identificando a doença
Como explica Fernanda, a psicose pode ser identificada quando o paciente apresenta sintomas como alucinações, delírios e comportamento e fala desorganizados. Ocorre mais comumente entre as idades de 15 e 30 anos e pode ser precedida por sinais sutis na infância. Ela pode evoluir para sintomas mais graves como agressividade, agitação psicomotora e tentativas de suicídio. Além disso, pode acarretar comprometimento funcional de forma crônica.
As dificuldades
O estudo de Fernanda também mostra as principais dificuldades para que tais situações sejam amenizadas. Há a falta de contratação de profissionais habilitados nas unidades de atendimento e, por conta disso, os pacientes chegam a esperar entre três e quatro meses para serem atendidos. “Isso sem contar que os medicamentos, no caso os antipsicóticos, são fornecidos pelas farmácias de alto custo e frequentemente estão em falta na rede pública”, destaca Fernanda.
O estudo da médica psiquiatra foi realizado num grupo de pesquisa que é coordenado pela sua orientadora, professora Cristina Del-Ben. O estudo, como informa Fernanda, integrou um consórcio multicêntrico internacional de pesquisa em esquizofrenia e outras psicoses denominado EU-GEI (European Network of National Schizophrenia Networks Studying Gene-Environment Interactions – https://www.eu-gei.eu/), cujo objetivo é investigar a etiologia, mecanismos e prognóstico da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. “O consórcio envolve 17 centros de pesquisas em seis países: Espanha, França, Holanda, Inglaterra, Itália e Brasil, que é representado pela FMRP”, descreve Fernanda.
Fernanda Zambelli e Cristina Del-Ben - Foto: Arquivo Pessoal
Mais informações: fernandaramalhopsiquiatria@gmail.com
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