Em sua quinta edição, o Simpósio Internacional sobre Linguagem e Cognição (Lincog) se iniciou no dia 6 de novembro com o tema Diversidades, Percepções, Acessos e Integração. O evento foi até o dia 9 com atividades na Cidade Universitária da USP, em São Paulo. Pela primeira vez pessoas com deficiência, especialmente pessoas cegas, fizeram parte da programação. As discussões se pautaram na acessibilidade, além da divulgação de trabalhos e pesquisas sobre processos de aprendizagem e tecnologias assistivas.
O evento foi organizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, sob coordenação dos professores Paulo Eduardo Capel, da Faculdade de Odontologia (FO) da USP, e Maria Célia Lima-Hernandes, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. O Lincog também é resultado de uma colaboração entre a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), o Instituto Federal de São Paulo (IFSP), a Universidade Federal Fluminense (UFF), o Instituto de Psicologia (IP) da USP e a Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP.
Iniciativas de acessibilidade
A mesa de abertura do simpósio, com intérprete de Libras, tratou das iniciativas da USP para promover a inclusão de pessoas com deficiência. O secretário de Estado de Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo, Marcos da Costa, destacou a criação de uma nova disciplina para graduação, resultado de uma colaboração entre a Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência e as universidades estaduais. A Disciplina Paulista de Acessibilidade e Inclusão será oferecida na USP, na Universidade Estadual Paulista (Unesp), na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp).
Também participaram da mesa a professora Marli Leite, pró-reitora de Cultura e Extensão Universitária da USP, Fraulein Vidigal de Paula, do IP e presidente do Lincog, Cristina Lopomo, do IFSP e vice-presidente do evento, Silvia Grecco, secretária Municipal da Pessoa com Deficiência de São Paulo, Bernardete Gatti, do Conselho Estadual de Educação, Susana Torresi, do Instituto de Química (IQ) da USP, e Carlos Eduardo Procópio, pró-reitor de Ensino do IFSP.
Em seguida, houve uma conferência de abertura sobre a integração de pessoas com deficiência na universidade. Os convidados, grande maioria com deficiência visual, falaram sobre suas trajetórias acadêmicas e sobre o capacitismo, além dos desafios para educação.
Quatro pessoas fizeram parte da conferência. Gelson dos Santos, cego congênito com especialização em Educação Inclusiva, Fabiana Bonilha, cega congênita e servidora pública no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), José Vitor Hansen, diplomata com baixa visão, e Cleyton Ferrarini, professor de Engenharia na Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), que desenvolve projetos de tecnologia assistiva.
Algumas instituições especializadas no atendimento de pessoas com deficiência, como a fundação Dorina Nowill, Laramara, Centro de Reabilitação Visual (CRV), Lar das Moças Cegas e Instituto Luiz Braille participaram do segundo dia do evento.
Divulgação científica
No dia inicial do evento, um grupo de pesquisadores apresentou os resultados preliminares do projeto de pesquisa interdisciplinar Recursos Inferenciais na Metáfora Situada e Audiodescrição, coordenado pela professora Maria Célia. As metáforas são expressões usadas no sentido figurado para descrever determinada ação ou objeto.
O projeto busca mapear o cérebro das pessoas com deficiência visual por meio do uso de uma máquina de ressonância magnética a fim de descobrir qual parte do cérebro é ativada durante esse processo de identificação de metáforas. Além disso, o experimento também foi feito com pessoas que enxergam para entender se o processamento ocorre nas mesmas regiões.
“A máquina de ressonância tem dois botões. Se for metáfora, ele aperta um e, se não for, aperta o outro. O objetivo é entender como eles compreendem as metáforas, a gente quer ver onde ocorre o processamento, por isso tem a máquina. Isso vai ter impacto na educação, ajudando a melhorar a vida das pessoas com deficiência e aprimorar recursos de audiodescrição”, explica a coordenadora.
O projeto também investiga o tempo de processamento das metáforas pelo cego congênito. Esse tempo compreende o intervalo entre a audição das frases audiodescritivas e a identificação da metáfora. O professor Saulo Silva, um dos pesquisadores do projeto que estuda esse tempo de processamento, identificou que o tempo médio de resposta foi de seis segundos.
Arte como forma de inclusão
Para o evento, a artista Karen Montija, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, idealizou a mostra COMtornos, inaugurada no espaço da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. A exposição trouxe várias esculturas de silhuetas de pessoas com deficiência, com a proposta de ser uma experiência multissensorial. As obras consistem em contornos de figuras de uma pessoa autista, com deficiência visual, deficiência auditiva e mobilidade reduzida.
Para Marcelo Venturini, estudante de Letras da USP com deficiência visual, a exposição permite o entendimento da ideia dos traços, já que transforma os contornos do desenho, geralmente feitos em papel, em uma estrutura sólida, possibilitando que pessoas com baixa visão toquem no material.
“A exposição foi construída para ser tocada, que é uma ideia importante para aproximar a gente dessa linguagem. Os desenhos em relevo são uma forma de familiarizar a gente com a representação de imagens. É também uma forma de trazer a gente para mais perto das artes plásticas, que, em geral, acabamos nos distanciando. Às vezes, a gente nem tem contato ou, quando tem, é de uma forma tão abstrata que não significa muito para nós. Então, essa exposição é uma forma de aproximar”, pontua o estudante, que também desenvolve projetos de acessibilidade digital na Superintendência de Tecnologia da Informação (STI) da USP.
*Estagiária supervisionada por Silvana Salles