Em cartaz no Teatro da USP, peça faz refletir sobre afetos responsáveis

Adaptação do romance de Natalia Timerman, “Copo Vazio” faz curta temporada no Centro MariAntonia, com entrada grátis

 04/07/2024 - Publicado há 5 meses
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A atriz Carolina Haddad e o ator Vinícius Neri - Foto: Kim Leekyung

“É sempre bom lembrar/ Que um copo vazio/ Está cheio de ar”, canta Gilberto Gil numa música composta em 1974. Quase 50 anos depois, a letra inspiraria o livro Copo Vazio, primeiro romance da psiquiatra Natalia Timerman, que é mestre em Psicologia pela USP e doutoranda em Literatura, também pela USP. A partir desta sexta-feira, dia 5, a obra se transforma mais uma vez e chega aos palcos do Teatro da USP (Tusp), no Centro MariAntonia, desta vez em peça adaptada por Angela Ribeiro e dirigida por Bruno Perillo. Nesta temporada gratuita, até dia 21 de julho, a atriz Carolina Haddad – idealizadora da peça – contracena num roteiro não linear com o ator Vinícius Neri.

Copo Vazio relata a experiência do chamado ghosting: após três meses de relacionamento, Pedro decide sumir repentinamente da vida de Mirela, passando a ignorar suas mensagens, até desaparecer do mapa. Na adaptação, os amantes são reinterpretados em três instâncias: no papel, os personagens vivem a trama proposta no livro de Timerman; ao mesmo tempo, trocam comentários sobre a narrativa entre si e com o público; por vezes, os intérpretes ainda aparecem como os próprios atores, conversando sobre o roteiro enquanto simulam um ensaio. Assim, a sensação de desorientação vivida por Mirela chega ao espectador, não mais como um testemunho, mas como de um debate sobre a superficialidade dos amores líquidos.

Na primeira temporada, encenada em junho passado no Sesc Belenzinho, os fãs do livro esgotaram ingressos para assisti-lo no palco. O sucesso chega ao Tusp após o diretor Bruno Perillo ter acompanhado cada sessão e, diante da recepção do público, feito pequenos ajustes diários. ”Acho que pode ter surpresas para quem viu a peça no Sesc Belenzinho”, conta ao Jornal da USP. “Chegamos a um material com várias cenas que aparecem no livro e acabaram sendo cortadas da peça, mas que ficaram na nossa ‘gavetinha’. A qualquer momento, elas podem reaparecer.”

O diretor Bruno Perillo - Foto: Kim Leekyung/Cedida pelo entrevistado

No livro, publicado pela Editora Todavia em 2021, a história do casal é contada fora de ordem, mesclando as memórias do relacionamento passado e as suas possibilidades de futuro, não fosse o término silencioso. Atravessando a presença e a ausência virtuais dos personagens, as palavras de Natalia Timerman delineiam o tema da responsabilidade afetiva nos dias atuais — ela narra o abandono emocional de uma mulher que, mesmo sendo tão independente, se permite sofrer por amor, uma dor que não pode ser ultrapassada pela modernidade. “Quando você começa a ler, o livro é muito sutil nos detalhes e, nas releituras, vão aparecendo os que passaram batido”, relembra Perillo, que estudou o texto original com a atriz e dramaturga por meses.

A escritora Natalia Timerman, autora do livro adaptado para a peça Copo Vazio - Foto: Amanda Hoelzel/Wikimedia Commons/CC BY-SA 4.0

A autora de Copo Vazio usou as redes sociais para convidar seus leitores para assistir à peça no Centro MariAntonia, um espaço que faz parte do universo do livro. “Eu fico muito feliz com a localização da nova temporada, porque ela vai ser praticamente dentro do livro — há cenas que se passam na Rua Doutor Villanova, na frente do Sesc Consolação”, diz Natalia, citando a rua próxima ao Centro MariAntonia. Ela já esteve presente em cinco sessões da peça e até fez uma participação especial como figurante. “Eu acho divertidíssimo que as pessoas vão sair do teatro e ainda vão estar dentro do livro e da peça.”

A autora escreveu Copo Vazio a partir de uma experiência pessoal com o ghosting - Fotos: Kim Leekyung

Para transformar o texto em cena, a videoprojeção é o recurso mais aproveitado pela dramaturga Angela Ribeiro. O diretor Bruno Perillo afirma que, com as projeções, a equipe mantém a estrutura cronológica do livro. “Começa no depois, então vem o antes, o hoje, o ‘e se’, todos os tempos fora de ordem vão se misturando na cabeça da Mirela, porque ela imagina e projeta coisas para o futuro, enquanto não consegue se libertar do passado”, diz Perillo. “É um caldeirão de tempos misturados e a gente tenta trazer isso na encenação. Os vídeos ajudam a fazer essa ‘salada’ um pouco mais didática.”

A trilha sonora conduzida por Pedro Semeghini completa a atmosfera melancólica da peça, com os atores estrelando atos musicais a partir da lista de músicas com que, no livro, Mirela presenteia Pedro. No original, as canções passam por Bob Marley, The Rolling Stone e Gilberto Gil, que sintetiza o espetáculo com a música Copo Vazio. Na liberdade dos palcos, também entram sonorizações originais de Semeghini e até a “sofrência” da sertaneja Marília Mendonça, reiterando o tom atual da produção.

A peça Copo Vazio fica em cartaz entre 5 e 21 de julho, às sextas-feiras e sábados, às 20 horas, e aos domingos, às 18 horas, na sala do Teatro da USP (Tusp) no Centro MariAntonia da USP (Rua Maria Antônia, 294, Vila Buarque, em São Paulo, próximo às estações Santa Cecília e Higienópolis-Mackenzie do Metrô). Entrada grátis. Os ingressos serão distribuídos uma hora antes de cada sessão.

* Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro


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