A arte na luta para preservar a Amazônia. E salvar o planeta

Hugo Fortes, professor da USP, desenvolve um trabalho coletivo para apresentar, no Brasil e em outros países, a arte na defesa da vida das florestas

 04/08/2023 - Publicado há 9 meses

Texto: Leila Kiyomura
Arte: Carolina Borin (estagiária)*

Em cartaz nos Estados Unidos até 8 de setembro, a exposição será apresentada no Brasil a partir de outubro - Foto: Reprodução/Hugo Fortes

Foi ouvindo e sentindo o pulsar do coração da floresta amazônica que os artistas Darlene Farris-LaBar, Hugo Fortes, Nivalda Assunção e Sissi Fonseca decidiram fazer um projeto coletivo de arte aliada à natureza. Além de sentir a flora e a fauna, eles conheceram as comunidades ribeirinhas e trafegaram de canoa pelos igarapés e igapós. Uma história vivida em 2022, na reserva Mamirauá, no centro do Estado do Amazonas, na região do Rio Solimões, inspirou a exposição Amazon F.LO.W (Forest Life on Water). Hoje, a mostra está sendo apresentada, até 8 de setembro, na Universidade de East Stroudsburg, na Pensilvânia, Estados Unidos. Mas, a partir de outubro e no decorrer de 2024, segue para Minas Gerais, onde será exibida no Museu Universitário de Uberlândia (Muna), e depois para São Paulo, e a expectativa do grupo é que siga renovada para todo o Brasil e outros países.

“A ideia de desenvolver um trabalho coletivo veio das relações estabelecidas entre os artistas há cerca de dez anos, através dos encontros promovidos pelos Seminários Internacionais Arte e Natureza, que organizei na USP entre 2011 e 2017”, explica Hugo Fortes, artista, cineasta e professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. “Há vários anos temos colaborado com as professoras Darlene Farris-Labar, da East Stroudsburg University, e Nivalda Assunção, da Universidade de Brasília (UnB), e com a Sissi Fonseca, que é também artista e minha esposa.”

Nas imagens desta reportagem, os leitores podem ter uma noção da mostra que os artistas vão oferecer para o público brasileiro. Um trabalho que está surpreendendo os visitantes norte-americanos, os estudantes e especialmente as crianças. Através das telas de Hugo Fortes, da instalação que traz paisagens com as folhas verde-escuras da vitória-régia boiando nos rios da Amazônia, das flores brancas e rosadas que só abrem à noite, a floresta vai se impondo. Também a performance de Sissi Fonseca, pequenina e delicada, sugere o ser natureza. O conhecimento e a vivência na floresta é o que os artistas oferecem. Como bem lembra Fortes: “A floresta é uma imensa instalação já pronta”.

Nivalda Assunção, Sissi Fonseca, Hugo Fortes e Darlene Farris-LaBar - Foto: Divulgação

"Acreditamos que, além dos aspectos artísticos, a exposição também serve para despertar a consciência sobre a beleza da floresta e a necessidade de preservação da Amazônia"

“O público tem se mostrado muito interessado em nosso trabalho. No dia seguinte à abertura, tivemos a oportunidade de conversar com um grupo de crianças do projeto ESU for Kids, que leva crianças para conhecer várias atividades da East Stroudsburg University. A performance de Sissi Fonseca também foi reapresentada e as crianças interagiram com bastante entusiasmo”, conta Fortes. “Acreditamos que, além dos aspectos artísticos, a mostra também serve para despertar a consciência sobre a beleza da floresta e a necessidade de preservação da Amazônia.”

Grupo de crianças do projeto ESU for Kids visitando a exposição - Foto: Hugo Fortes

Hugo Fortes tem razão na luta coletiva para despertar a consciência especialmente dos jovens e crianças. Um valor incomparável. Muito além da verba de R$ 3,2 bilhões prometida em prol do Fundo Amazônia pelos Estados Unidos, Alemanha e União Europeia, que ainda não chegou. Mas o que existe e tem resultados positivos é a importância da união da arte e natureza para divulgar e proteger os povos indígenas e a floresta de todos. “Como professor e artista, vejo as atividades de forma integrada e complementar, pois tanto através da educação como através da arte é possível tocar outros indivíduos para fazê-los refletir sobre nossa responsabilidade como humanos em relação aos outros humanos e também aos não humanos, como os animais, os vegetais e todo o ambiente que nos cerca”, acredita Fortes. “Embora a arte e a educação possam ter limitações e até mesmo aspectos utópicos, é justamente essa capacidade de imaginar futuros possíveis e mais conscientes que lhes confere sua potência transformadora.”

Essa potência transformadora conta com a experiência de Fortes e a sensibilidade de Sissi Fonseca, que desde 1994  vem realizando performances em vários países, como França, Alemanha, Índia, Brasil e Estados Unidos. Nivalda Assunção, professora do Departamento de Artes Visuais da UnB, faz pesquisas relacionadas com o corpo, a paisagem e principalmente a natureza em ações e instalações artísticas. Já as pesquisas de Darlene Farris-LaBar, professora do Departamento de Arte, Mídia e Design da East Stroudsburg University, se concentram na preservação de espécies de plantas e flores por meio de várias mídias e tecnologias, como a impressão 3D. Realiza um trabalho de arte e tecnologia, mostrando a interação ambiental e o estudo de ecossistemas, que vem sendo exibido em todo o mundo. 

Performance de Sissi Fonseca na exposição - Foto: Hugo Fortes

“A arte, por sua capacidade de afetar os indivíduos através dos afetos e da sensibilidade, pode, sim, contribuir para ampliar a consciência ecológica e aumentar o engajamento social na proteção da natureza”

Fortes vê o presente e o futuro com otimismo. “Acredito que a consciência dos jovens sobre as questões ecológicas vem aumentando cada vez mais. Quando iniciei minhas pesquisas sobre arte e natureza, no início dos anos 2000, embora já tivéssemos artistas significativos que tratavam dessas questões, o interesse pelo assunto ainda era pequeno e havia pouca discussão no ambiente acadêmico brasileiro sobre isso. Creio que o Seminário Internacional Arte e Natureza, que teve três edições, se tornou uma referência na área.”

Importante destacar também a disciplina Visões da Natureza, que o professor ministra no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da ECA, que vem atraindo cada vez  mais um número maior de alunos. “Nos últimos anos, muitos textos de autores como Donna Haraway, Bruno Latour, Emanuelle Coccia e Stefano Mancuso têm sido traduzidos, contribuindo para as discussões nesse campo.”

O professor lembra a importância da diversidade. “Vozes indígenas e participações ativas como a de Ailton Krenak, além de artistas de diversas etnias, têm contribuído para o desenvolvimento de uma nova consciência ecológica. Acredito que as crescentes ameaças ao mundo natural em virtude do aquecimento global, do desmatamento e da poluição, como um todo, têm despertado uma necessidade urgente de debatermos esses assuntos. A arte, por sua capacidade de afetar os indivíduos através dos afetos e da sensibilidade, pode, sim, contribuir para ampliar a consciência ecológica e aumentar o engajamento social na proteção da natureza.”

*Sob supervisão de Moisés Dorado 


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