USP é classificada em desafio de tecnologia alimentar da Nasa e Agência Espacial Canadense

Projeto da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz com morango e taioba foi adaptado de estudos já realizados pelos pesquisadores para as condições de vida durante uma viagem espacial a Marte

Uma equipe formada por alunos de graduação e pós-graduação da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, liderada pelo professor Paulo Hercílio Viegas Rodrigues, foi uma das selecionadas para a segunda etapa do Deep Space Food Challenge, desafio internacional de tecnologia alimentar proposto pela Nasa (a agência espacial estadunidense) e a Agência Espacial Canadense (CSA). Dividida nas categorias “US” e “International”, a competição selecionou 28 equipes para participar da segunda etapa, sendo 18 grupos dos Estados Unidos e 10 estrangeiros.

Um dos objetivos das agências espaciais com o desafio é encontrar meios para que os astronautas consumam alimentos frescos durante viagens mais longas, tanto por conta da autonomia alimentar quanto para a saúde dos viajantes. Foram disponibilizados aos participantes do desafio alguns estudos que indicavam danos fisiológicos e psicológicos em pessoas que consomem apenas alimentos ultraprocessados por um longo período.

Paulo Hercílio Viegas Rodrigues – Foto: Arquivo pessoal

Dessa forma, o cultivo de vegetais no espaço permitiria uma alimentação mais saudável para os astronautas, minimizando problemas de saúde mental, além de servir como atividade terapêutica, fazendo parte da rotina ao ser adaptada para as condições adversas por eles enfrentadas. “Durante o projeto nós precisamos calcular inclusive o tempo que o cuidado com cada planta levaria diariamente para que se encaixasse no dia a dia dos astronautas”, conta ao Jornal da USP o professor Paulo Hercílio Viegas Rodrigues, do Laboratório de Cultivo de Tecidos de Plantas Ornamentais (LCTPO).

Rodrigues realiza estudos com plantas ornamentais através da cultura de tecidos vegetais, sendo a especialidade dele a floricultura. Porém, para a participar da competição, foi preciso desenvolver um projeto voltado à alimentação com vegetais in natura que beneficiassem tanto os astronautas quanto a produção alimentar no planeta Terra.

Também foi necessário balancear diversos fatores, como a necessidade de intensidade luminosa para o crescimento, riqueza de nutrientes e o espaço disponível para o desenvolvimento das plantas na hora de escolher quais fariam parte do projeto. Dessa forma, duas culturas vegetais diferentes foram apresentadas na proposta: morango e taioba.

Rodrigues conta que o morango havia sido uma das últimas plantas produzidas por eles na ausência de luz natural quando ficaram sabendo do desafio. Estudos anteriores realizados por Rodrigues com terpenos durante o cultivo de tomate, fez com que a concentração de carotenóides tivesse taxas mais altas do que o comum nos frutos. Os terpenos, também conhecidos como óleos essenciais, são substâncias naturalmente produzidas por alguns vegetais e que podem funcionar como defensivos agrícolas naturais.

O aumento significativo que os frutos apresentaram em relação aos nutrientes é algo novo e foi incluído no projeto que foi premiado. Segundo o pesquisador, “provavelmente esse foi o diferencial que levou nosso projeto para a segunda fase, porque o modelo do jardim vertical também foi utilizado por outros participantes, mas melhorar a qualidade nutricional dos vegetais de forma natural foi uma descoberta importante”, diz.

Rodrigues também acredita que essas melhorias agrícolas podem contribuir para uma nova linha de pesquisas dentro da universidade que seria refletida para a população na forma de alimentos com valores nutricionais mais altos.

O desafio

Outra questão importante do desafio é a divisão da viagem em etapas. A produção de alimentos precisa abranger cerca de seis meses dentro da espaçonave durante o percurso de ida, o tempo da estada em Marte, cerca de 18 meses, e a volta, que levaria o mesmo tempo da ida. Por esse motivo, existem condições diferentes a serem levadas em conta na escolha daquilo que será plantado.

A taioba, por exemplo, não poderia ser plantada durante a viagem por conta do espaço de 2 metros cúbicos (m³) permitido pelo desafio, mas Rodrigues acredita que o vegetal se daria bem no cultivo em Marte. “É uma planta considerada o ‘espinafre brasileiro’. Ela é proteica e rica em ferro, vitaminas do complexo B, além de ter uma superfície foliar grande que não necessita de tanta intensidade luminosa para se desenvolver, o que seria muito benéfico para os astronautas.”

O objetivo do desafio não é obter um sistema alimentar completo, mas uma proposta nutritiva que possa compor a alimentação dos tripulantes pelo maior tempo possível nas condições adversas do chamado “espaço profundo”. Dessa forma, o projeto da Esalq se concentrou em garantir nutrientes de qualidade por meio de plantas de fácil manutenção para esses astronautas.

Próxima etapa

“A USP terá um projeto ativo técnico e científico internacional com a Nasa e a CSA durante, pelo menos, 12 meses, entre janeiro e dezembro de 2022”

De acordo com o professor, no último dia 15 de novembro as regras e a inscrição da Fase 2 foram divulgadas, tendo seu início em janeiro de 2022 com o término em dezembro de 2022. “Na Fase 2 teremos que desenvolver o projeto que foi proposto pelo nosso time. Serão selecionados, então, cinco finalistas para Fase 3, que ainda não foi divulgada. A Fase 3 só ocorrerá em 2023. Portanto, a USP terá um projeto ativo técnico e científico internacional com a Nasa e a CSA durante, pelo menos, 12 meses”, informa Rodrigues. Os concorrentes da categoria Internacional não recebem prêmios em dinheiro, mas sim o reconhecimento técnico e científico, além de acesso a parcerias nessa área de conhecimento.

Ao longo da primeira fase do desafio, o grupo contou apenas com as bolsas de pesquisa que os participantes já recebiam. Com o anúncio da classificação para a próxima fase eles já começaram a buscar financiamentos para o projeto, que envolve a montagem de um protótipo daquilo que foi apresentado na primeira fase. “O projeto é teórico, portanto, não existe nada físico em funcionamento. Por isso, nossa preocupação com recursos, já que vamos representar o Brasil nesse desafio e estamos sem recursos para montar o protótipo”, diz.

Muitas das equipes classificadas para a nova etapa estão ligadas a empresas e têm mais recursos tecnológicos e financeiros para o desenvolvimento do projeto. Segundo o pesquisador, o acesso aos equipamentos de alta tecnologia pode ser um grande desafio para a equipe que coordena. Apesar disso, ele está esperançoso com relação às novas possibilidades de descobertas que esse processo deve promover.

Participam da equipe os alunos de graduação Christian Aparecido Demétrio, Enrico Stephano Oliveira Mucciolo, Laura Minatel Bortolato, e os de pós-graduação Lilia Castro Pereira e Jéssica Fernanda de Oliveira Jacob.

Mais informações: e-mail phrviegas@usp.br, com o professor Paulo Hercílio Viegas Rodrigues

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