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Pesquisa explora a diversidade evolutiva da flora em condições extremas
Estudo analisa biodiversidade e idade evolutiva da vegetação dos ecossistemas rupestres, assim como impactos gerados pelas alterações climáticas
Cânion Fortaleza no Parque Nacional da Serra Geral, que fica em Cambará do Sul (RS) - Foto: Wikimedia Commons
Paisagens que escapam das visões clássicas de diversidade biológica também guardam informações valiosas sobre a vida no Planeta. Este é o caso dos ecossistemas rupestres, que se desenvolvem em condições consideradas extremas. Entre eles estão os campos rupestres, como os que crescem nos solos ácidos da Chapada Diamantina (BA); as cangas, vegetação das crostas de ferro da Serra dos Carajás (PA); e os campos de altitude, encontrados na Serra Geral, no Sul do País. Pesquisa do Instituto de Biociências (IB) da USP, do Instituto Tecnológico Vale e da University of Tartu, da Estônia, buscou analisar a diversidade evolutiva da vegetação de ambientes como estes. Os pesquisadores constataram que, mesmo com suas adaptações, a flora sofre impactos das mudanças climáticas.
A diversidade evolutiva, ou filogenética, diz respeito a uma medida de biodiversidade que se baseia nas relações evolutivas entre um grupo de espécies. “Não existe tanta informação disponível sobre biomas rupestres. Então, quando surgiu a oportunidade de estudar esse assunto, achei que seria interessante tentar entender a diversidade evolutiva de plantas e sua relação com o clima”, explica Johnny Massante, pós-doutorando no IB, ao Jornal da USP.
Foram realizados testes de correlações para verificar o impacto das alterações climáticas nos índices de diversidade. A vegetação instalada nas áreas estudadas são próximas evolutivamente – o que implica em um compartilhamento de características importantes que asseguram sua sobrevivência em tais ambientes. Contudo, com a alteração de clima, espécies de outros tipos de vegetação e com diferentes aspectos podem se estabelecer nas localidades.
Johnny Massante - Foto: Arquivo Pessoal
“Isso pode gerar problemas como invasão biológica. Se espécies que ocorrem naturalmente fora desses ambientes encontram condições para se estabelecer e formar populações viáveis, as espécies locais podem ter suas populações reduzidas, já que há outras espécies competindo pelos mesmos recursos e nutrientes e as condições climáticas já não são mais ideais para sua manutenção”, diz Massante. Ele ainda alerta para o perigo de extinção de espécies endêmicas – aquelas próprias de tais áreas e que detém características muito específicas de sobrevivência.
A imagem exemplifica a flora analisada pelo estudo. No canto superior esquerdo temos o campo rupestre; no superior direito, a canga; no inferior esquerdo, campo de altitude; e no inferior direto, o inselbergue - Imagem: Reprodução/Whendel Silva
O estudo levou em consideração quase 6 mil espécies vegetais lenhosas e ervas de 129 localidades de paisagens antigas, climaticamente estáveis e com solos inférteis – OCBILs, em inglês. Foram analisadas áreas de campos rupestres, campos de altitude, cangas e inselbergues (formações rochosas isoladas em meio a superfícies planas, como os monólitos de Quixadá, no sertão do Ceará). Além disso, dados de variação de temperatura e precipitação foram levados em consideração para calcular métricas de biodiversidade para cada área. Traçada a estrutura, foi possível inferir que em ecossistemas rupestres, a vegetação não possui uma grande idade e diversidade evolutivas, e que as espécies possuem um alto grau de parentesco.
“Geralmente ambientes montanhosos são considerados verdadeiras arenas de rápida e recente evolução porque pesquisas já mostraram que a taxa de geração de novas espécies nesses ambientes é muito alta. A literatura também sugere que ambientes climaticamente mais estáveis permitem a persistência de linhagens de plantas diversificadas em tempos mais remotos”, explica o pesquisador.
Serra do Espinhaço, em Diamantina (BA) - Foto: Glauco Umbelino/Wikimedia Commons
Conservação e preservação
Os biomas rupestres são conhecidos pela sua flora de características marcantes: árvores com folhas pequenas, espessas e quebradiças. Essas são adaptações que dificultam a perda de nutrientes e água, assim auxiliando as plantas a viverem em um ambiente onde tais elementos são escassos. Essas áreas ainda contam com um alto grau de endemismo e são essenciais para a manutenção de múltiplos rios e nascentes.
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), há uma probabilidade de 66% de a média anual de aquecimento ultrapassar o limite de 1,5°C nos próximos cinco anos. O aumento da temperatura mundial pode ocasionar graves consequências para a fauna e a flora mundial em larga escala. Dentro desse preocupante cenário, o pesquisador destaca a necessidade de estudos sobre tais impactos negativos sobre essas vegetações a fim de se traçar estratégias de conservação e restauração.
Além disso, o baixo número de pesquisas que exploram a biodiversidade de ecossistemas rupestres também desperta preocupação no especialista. “A quantidade de estudos nessas regiões é comparativamente menor do que comparada à florestas. No entanto, as vegetações rupestres são cruciais, comparáveis em importância com as florestas. Sua diversidade extraordinária de plantas desempenha funções essenciais nos ecossistemas, como a preservação de rios”, explica Massante.
Os resultados do estudo foram publicados no artigo Looking similar but all different: Phylogenetic signature of Brazilian rocky outcrops and the influence of temperature variability on their phylogenetic structure, na revista Journal of Ecology.
Mais informações: email jhonny.massante@usp.br, com Jhonny Capichoni Massante
*Sob supervisão de Fabiana Mariz e Luiza Caires
**Sob supervisão de Moisés Dorado e Simone Gomes de Sá
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