Pesquisadores da USP propõem nova metodologia para melhorar identificação de substâncias psicoativas

A cada semana uma nova substância psicoativa é notificada e o fenômeno se estende por 135 países e territórios de diversas partes do mundo

 14/12/2023 - Publicado há 7 meses
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Análises in silico permitem a obtenção de milhares de dados estruturais em pouco tempo – Foto: Freepik/Fotomontagem Jornal da USP

 

As Novas Substâncias Psicoativas (NSP), conforme definidas pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), são moléculas desenvolvidas com finalidades ilícitas, visando a burlar as regulamentações nacionais e internacionais sobre substâncias já controladas. Essas substâncias tentam replicar ou disfarçar efeitos comparáveis aos de outras drogas, como a maconha, cocaína, heroína, LSD, ecstasy ou metanfetamina.

Estudo recente do químico Caio Henrique Pinke Rodrigues durante seu doutorado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, orientado pela professora Aline Thaís Bruni, propõe uma nova maneira de analisar essas substâncias.

A fim de melhorar a identificação das NPS, um dos pilares do estudo é a aplicação da Teoria do Funcional da Densidade (DFT), que Aline descreveu como “um método de química quântica computacional capaz de determinar a estrutura eletrônica de átomos e moléculas”. Essa abordagem fornece informações químicas que seriam difíceis de obter em laboratórios convencionais através das análises tradicionais.

Aline Bruni – Foto: Arquivo Pessoal

Além disso, as metodologias in silico – realizadas através de análises computacionais dispensam a necessidade de realizar testes em animais, cultivo de células e preparação de diferentes padrões laboratoriais, oferecendo uma alternativa mais versátil e econômica, uma vez que são realizadas através de simulações computacionais para a obtenção de informações. Os métodos in silico foram aplicados em três vertentes: detecção de substâncias, identificação estrutural e previsão de toxicidade. 

Essas informações são vitais para investigações criminais, análises forenses e avaliação dos riscos à saúde e conforme afirma Aline o “grupo de pesquisa tem vários resultados para essas substâncias como, por exemplo, as referências analíticas para anfetaminas, catinonas canabinoides sintéticos, opioides benzodiazepínicos, feniletilaminas e outras substâncias de interesse forense, além de alguns resultados toxicológicos relacionados à detecção dessas substâncias”.

A principal motivação para o estudo, diz a orientadora, “foi realmente a ausência de dados químicos relacionados a essas substâncias, pelo fato de não serem regulamentadas nem necessariamente proibidas muitas vezes. Existe aí uma lacuna de informação química sobre as principais propriedades, principalmente relacionadas à identificação e à compreensão de suas propriedades complexas, pois laboratórios convencionais carecem de padrões e regulamentações para sua síntese”.

Alterações na estrutura molecular

As NPS “não são novas em sua essência, mas resultam de alterações estruturais de drogas já conhecidas, visando a obter efeitos semelhantes aos desejados pelos usuários”, explica Rodrigues. A peculiaridade dessas substâncias é que não estão sujeitas a restrições legais, tanto em âmbito nacional quanto internacional.

Caio Henrique Pinke Rodrigues – Foto: Arquivo Pessoal

Dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que, entre 2009 e janeiro de 2021, foram identificadas 1.124 substâncias diferentes, indicando uma média de mais de uma nova substância surgindo a cada semana.

Entre as substâncias existem, por exemplo, a anfetamina e as catinonas. “As anfetaminas  são mais conhecidas do público em geral como o êxtase e o rebite, que já são conhecidas há muito tempo. A diferença entre as anfetaminas e as catinonas foi uma alteração estrutural da molécula. Sendo a anfetamina uma estrutura mais simples, ela serve de base para as catinonas sintéticas com a inserção de um átomo de oxigênio em sua estrutura”, ressalta Rodrigues.

Para a identificação das NPS, Rodrigues destaca a importância das fontes de informação confiáveis, como os relatórios da ONU, que são referências globais para o monitoramento dessas substâncias. No Brasil, o Subsistema de Alerta Rápido, criado pelo governo federal, fornece informações cruciais, orientando a compreensão do cenário nacional.

Fruto do grupo de pesquisa

O estudo da USP já produziu resultados significativos, fornecendo referências analíticas para diversas substâncias de interesse forense, como anfetaminas, catinonas, canabinoides sintéticos e outros compostos. 

Como resultado dos trabalhos do grupo, surgiu a startup Sci-Prediction, incubada no Supera Parque em Ribeirão Preto, formada por três alunos do laboratório da professora Aline. Além disso, o grupo de pesquisa formalizou um pedido de patente com potencial inovador, relacionado aos bancos de dados sobre informações químicas através de análises computacionais, não apenas para substâncias psicoativas, mas para diversos compostos químicos com dados insuficientes.

O trabalho de doutorado foi defendido em março de 2023 com o título: Química a serviço da inteligência forense: estudo de novas substâncias psicoativas por metodologia in silico.

Mais informações: caio.pinke.rodrigues@usp.br

*Estagiário sob supervisão de Rose Talamone e Rita Stella

Confira a entrevista com os pesquisadores no player abaixo:

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