Sociedade precisa pensar o quão disposta está a abrir mão de sua saúde pelo uso de agrotóxicos

Tatiane Moraes comenta pesquisa que apontou uma forte relação entre municípios com agropecuária mais forte e problemas crônicos de saúde em decorrência dos químicos

 12/09/2024 - Publicado há 2 meses
Imagem de um trabalhador do campo injetando agrotóxico numa plantação de hortaliças
A relação entre o consumo de agrotóxicos com problemas graves de saúde já é consolidada e provada – Foto: Ibadah Mimpi/Unsplash
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Uma análise recente aponta que o risco de condições graves de saúde aumenta em cidades com 5% ou mais da área dedicada a plantações. A razão é o intenso uso de agrotóxicos, sendo o Brasil o país que mais usa químicos do tipo no mundo. Regionalmente, a pesquisa concluiu que o Mato Grosso, Estado marcado pela agropecuária, é campeão em uso de agrotóxicos e tem municípios agrícolas com maior risco de mortes fetais e anomalias em bebês.

Tatiane Moraes, pós-doutoranda do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e que integra o Observatório Clima e Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), comenta que a tendência é de aumento de preocupação: “Nos últimos quatro anos, o Brasil foi campeão de autorização de agrotóxicos”. Segundo ela, o País segue a linha de flexibilização e menos controle da saúde e meio ambiente, indo na contramão do que é feito em vários países mais desenvolvidos.

Riscos para saúde

A relação entre o consumo de agrotóxicos com problemas graves de saúde já é consolidada e provada. Há indícios fortes com associação desses químicos com malformações congênitas, óbitos fetais e câncer. Além dos alimentos com agrotóxicos que atravessam municípios e estão na mesa de todo o País, a pesquisa focou no impacto que eles têm na própria região.

Tatiane Moraes Sousa – Foto: Sandra Sedini/IEA-USP

Municípios com mais de 5% de sua área dedicada à agricultura tendem a ser territórios de produções em larga escala. “Embora muitos pequenos produtores também usem agrotóxico em alguma medida, o grande impacto vem das monoculturas. Então, os Estados que têm essa proporção maior de municípios, com grande parte do seu território dedicado à agricultura, são aqueles onde também encontramos maior porção de monocultura”, afirma a especialista. Ela dá os exemplos de Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.

O recorte populacional mais vulnerável são os trabalhadores rurais, que naturalmente são expostos diretamente aos químicos. Mas mesmo aqueles que nada têm a ver com isso também sofrem: com a técnica de pulverização aérea e a penetração dos agrotóxicos no solo ninguém foge dos impactos. Os produtos acabam por infectar principalmente as bacias hidrográficas da região, que, por sua vez, disseminam os químicos para toda a população.

Reflexões para a sociedade

O uso de agrotóxicos é polêmico: por um lado, há os óbvios efeitos colaterais e, por outro, há o argumento dos agricultores de que não é viável abrir mão deles. Mas o que Tatiana Moraes propõe é que haja uma reflexão crítica de até que ponto a sociedade está disposta a ceder em termos de qualidade de vida: “Já passou um pouco do momento de sentarmos e discutirmos se só temos essa lógica de produção. Do ponto de vista econômico, de dependência de commodity. Mas qual é a commodity e como queremos produzir essa commodity?”.

O Brasil é o país que mais utiliza agrotóxicos no mundo e anda na direção de mais liberação. Alguns dos químicos mais utilizados aqui são até proibidos na União Europeia por razões de saúde. Em média, o brasileiro consome 5,2 litros de agrotóxicos ao ano, a maior média do mundo.


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