Brasil precisa criar condições para que a indústria nacional se torne competitiva

Setor tem perdido espaço na composição do Produto Interno Bruto (PIB); especialistas alertam para excesso de burocracia, mão de obra pouco qualificada e altos custos operacionais

 16/08/2023 - Publicado há 9 meses

Texto: Hugo Luque*

Arte: Joyce Tenório**

Retração histórica da indústria na composição do PIB tem relação com mão de obra, altos custos operacionais e burocracia excessiva, afirma especialista - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: Freepik

Como já aconteceu em diversos países atualmente desenvolvidos, a indústria no Brasil tem perdido espaço na composição do seu Produto Interno Bruto (PIB). Entretanto, as razões que levam a isso são diferentes das de outras nações. Entre elas, estão o excesso de burocracia, a falta de mão de obra qualificada, o longo tempo necessário para abrir uma empresa, sem contar os altos custos operacionais, como o acesso à energia.

Para melhorar esse cenário, o professor Luciano Nakabashi, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, diz que o Brasil precisa investir e criar as condições ideais para que as empresas consigam, de fato, ser competitivas. Segundo ele, isso também envolve “integrar a nossa indústria com o resto do mundo, e não ficar protegendo. É criar as condições para que ela seja competitiva, investir em infraestrutura ou atrair investimento para estrutura do País, melhorar a qualificação da mão de obra, o aprendizado das crianças na escola, criar regras que façam sentido”, afirma.

Nakabashi também aposta na Reforma Tributária, aprovada no início de julho, como um apoio essencial para o crescimento do setor. De acordo com ele, o projeto “vai nesse sentido de melhorar a eficiência da economia brasileira e gastar menos tempo com o sistema burocrático tributário, que é muito complexo”.

Um concorrente de peso

No primeiro trimestre de 2023, a indústria foi responsável por 11% do PIB do Brasil, muito diferente dos 36% registrados há quase 40 anos, em 1985. Além de todos os fatores que interferem no setor manufatureiro, o crescimento do terciário, ou setor de comércio e serviços, também entra na equação. O especialista compara o movimento à história de outros países, como Alemanha, Inglaterra e Japão. Anteriormente pobres e agropecuárias, essas nações ganharam destaque a partir da Revolução Industrial e passaram a absorver a mão de obra oriunda do campo. “Foi quando começou a aumentar a produtividade, porque a indústria tem uma produtividade muito mais alta do que a agropecuária. Tinha no passado e ainda tem hoje”, explica.

Luciano Nakabashi - Foto: Arquivo Pessoal
Luciano Nakabashi - Foto: Arquivo Pessoal

Contudo, ao longo das décadas e dos séculos, as regiões hoje desenvolvidas passaram também pela alta do setor terciário, algo que até hoje não é exclusividade do Brasil. “Depois, o [setor de] serviços começou a ganhar mais participação. As pessoas foram ganhando renda e começaram a demandar mais serviços. Começa a aumentar a participação desse setor e a indústria começa a perder espaço. Isso tem acontecido em vários países. Acho que até a China já está passando por esse processo, e é um país muito forte em termos industriais no mundo inteiro.”

Mão de obra

Atualmente, o setor de serviços representa 70% da riqueza produzida em território nacional e lidera o ranking com grande distância para a indústria. Por outro lado, o professor ressalta que o terciário brasileiro tem baixa produtividade, causada por atividades de baixo dinamismo, como o comércio. De qualquer forma, isso não significa que o terciário seja o inimigo, mas que as condições também não são favoráveis, assim como no caso das fábricas. “Acho que é muito mais pela questão da qualificação da mão de obra, do ambiente de negócio do que, de fato, o setor de serviços ser um problema. Ele não é. Nós vimos que, em vários países desenvolvidos, o setor de serviços tem uma participação maior do que no Brasil, e eles continuam com uma renda elevada, porque a produtividade é alta, independentemente do setor.”

Alex Ferreira - Foto: Arquivo pessoal
Alex Ferreira - Foto: Arquivo pessoal

Segundo o especialista, fazer a transição para atividades mais produtivas no setor terciário, como as áreas de finanças e da computação, exige “mão de obra, trabalhadores capacitados, que vão possibilitar que esse serviço mais produtivo apareça, ter um ambiente de negócios que vai favorecer esses setores de serviço”.

O professor Alex Ferreira, também da FEA-RP, vai na mesma direção e observa que a solução se aplica a mais de uma frente. Para ele, “uma economia e uma indústria forte, mesmo que essa indústria tenha uma menor participação relativa, vão depender dos mesmos fatores que levam ao crescimento econômico”. Portanto, para que o setor fabril volte a crescer na composição do PIB do Brasil, será necessário investir em itens como “nível educacional, facilidade de empreender no País, de inovar, a qualidade da saúde, da mão de obra, a estabilidade institucional”.

Entretanto, Ferreira ressalta que não basta apenas intervenção estatal e que a mudança precisa ocorrer em conjunto. “Não é argumento para política industrial, para que se tenha uma alocação de recursos dirigida pelo Estado, mas sim que se tenha uma alocação eficiente de recursos entre os diversos setores da economia, guiada pelos mecanismos de mercado e de preços”, completa.

*Estagiário sob supervisão de Ferraz Jr.

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado


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