Base Nacional Comum Curricular ainda precisa de alterações para colocar objetivo em prática

“Muito precisa ser feito para que alcancemos uma educação pública de qualidade para todas as pessoas”, afirma Cláudia Galian

 03/07/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 31/07/2023 às 11:24
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A Base Nacional Comum Curricular funciona como o documento base ao qual todas as propostas curriculares elaboradas por Estados e municípios devem se adequar – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

 

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A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento normativo obrigatório nos currículos dos sistemas e redes de ensino brasileiras. A BNCC é aplicada no território nacional em propostas pedagógicas de escolas públicas e privadas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, níveis da educação básica.

Prevista na Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) e o Plano Nacional de Educação de 2014, a BNCC estabelece que todas as políticas educacionais devem tomá-la como referência no que se refere à produção de materiais didáticos, formação inicial e continuada de professores e mecanismos de avaliação da aprendizagem dos estudantes da educação básica, por exemplo. Sua elaboração passou, ainda, por audiências públicas de caráter consultivo por todo o País.

O documento na prática

Cláudia Galian, professora da Faculdade de Educação USP, afirma que a Base Nacional Comum Curricular funciona como o documento base ao qual todas as propostas curriculares elaboradas por Estados e municípios devem se adequar. “Mas não só isso, ela também propõe uma sequência para o ensino e o nível de aprofundamento a ser atingido em cada etapa da escolarização”, adiciona.

Cláudia Galian – Foto: Arquivo Pessoal

Publicados pelo então Ministério da Educação e do Desporto (MEC) em 1997 e 1998, os Parâmetros Curriculares Nacionais se apresentavam como referências adotadas arbitrariamente pelos Estados e municípios. Com a instituição da BNCC por instrumentos legislativos, todas as 26 unidades federativas e o Distrito Federal se alinham nas mesmas diretrizes de projeto educacional.

No entanto, a oficialização de parâmetros nacionais não deixa de apresentar contestações. A professora relembra a Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 2, de 20 de dezembro de 2019, que define as diretrizes nacionais e institui a Base Nacional Comum para a formação inicial de professores para a educação básica. Nas palavras de Cláudia, a medida “altera a natureza da formação de professores e confere centralidade nos cursos de licenciatura ao estudo dos conteúdos a serem ensinados na base”.

Ela argumenta que, com a resolução, parte significativa dos cursos de licenciatura se destina à busca por metodologias que facilitem a sua implementação, em detrimento de disciplinas relevantes para a formação educacional e pedagógica de profissionais, por serem consideradas excessivamente teóricas pelo CNE. “Trata-se de uma mudança amplamente rejeitada pelo campo da educação, mas que, sob a pressão de setores interessados, foi novamente aprovada, por unanimidade, pelo conselho e aguarda a homologação”, conta.

“Ela tem limites evidentes”

Na apresentação da BNCC, o Ministério da Educação garante que o documento é valioso para reafirmar o compromisso de todos com a redução das desigualdades educacionais no Brasil e a promoção da equidade e da qualidade das aprendizagens dos estudantes brasileiros. A professora Cláudia avalia que, pela urgência com que foram encaminhadas as discussões e pelo tratamento conferido às manifestações sobre ela, não se conferiu consideração suficiente às escolas e seus agentes, ao que já se faz e principalmente às condições desiguais sob as quais professores e estudantes desenvolvem o seu trabalho.

Desde sua implementação, em 2017, a base recebeu modificações na carga horária do estudantes, inserção de tecnologias, modificação de metodologias e espaços de professor e aluno. Nos mais de cinco anos depois, o Brasil passou por dois presidentes da República, cinco ministros da Educação e uma pandemia que alterou as dinâmicas educacionais. A professora coloca tais obstáculos em análise: “O tempo nos mostra que um novo documento curricular não tem o poder de sozinho resolver os problemas da educação de um país. Embora a Base Nacional Curricular tenha sido apresentada como a panaceia para todos os problemas educacionais acumulados ao longo do tempo, ela tem limites evidentes”.

A pandemia de covid-19 marcou um período em que as desigualdades profundas se explicitaram, de modo que o campo da educação tenha sido atingido. “Muito precisa ser feito para que alcancemos uma educação pública de qualidade para todas as pessoas”, indica Cláudia. Na sua visão, a base curricular tem a obrigação de compreender a educação escolar como uma questão complexa que exige soluções igualmente complexas e abrangentes, além de definir escolhas com uma lógica temporária e de criticidade.

“Esses documentos são fruto de determinadas configurações de poder e, portanto, sempre tenderam a favorecer ou desfavorecer  determinados grupos. A criação da BNCC não era o único caminho possível. Na verdade, foi o caminho possibilitado pela configuração de poder vigente que resultou num documento explícito que foi acordado entre grupos de interesses muito distintos”, conclui.


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