A Agência Nacional do Cinema (Ancine) promoveu uma ação regulatória em 2020 que implementou a obrigatoriedade, sob pena de multa, aos cinemas nacionais de oferecerem aparelhos de acessibilidade para pessoas com deficiência visual e auditiva, através dos recursos de legendagem descritiva, libras e audiodescrição. A determinação está na Instrução Normativa 128/2016. Dados da Ancine revelaram que, em 2019, das 3.300 salas de cinema do Brasil, apenas 269 teriam alguns desses mecanismos, o que representa 8% do total.
Rosaria Ono, professora do Departamento de Tecnologia da Arquitetura da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, explica o panorama internacional em relação à acessibilidade no acesso às produções audiovisuais, as problemáticas no cenário brasileiro e o que pode ser feito para melhorar.
Conjuntura internacional de acessibilidade
Para promover a ação regulatória no Brasil, a Ancine estudou as experiências internacionais de promoção à acessibilidade visual e auditiva nos cinemas, principalmente nos Estados Unidos da América (EUA), Austrália e Reino Unido. Os norte-americanos analisaram opções de acessibilidade disponíveis, os custos-benefícios digitais e analógicos presentes nas salas de cinema e os custos das ferramentas acessíveis.
“Nos Estados Unidos, a regulamentação que exige acessibilidade nos cinemas é um tratado de 2018, é uma regulamentação nacional, emitida pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, e ela exige várias questões de acessibilidade para uma larga variedade de deficiências. Em relação à acessibilidade auditiva, existem alguns itens, principalmente vinculados à tecnologia assistiva,” explica Rosaria.
A exceção, no entanto, ocorreu na Austrália, onde a implementação dos recursos de acessibilidade foi executada sem a necessidade de aparato legal. O projeto foi realizado com a participação do comitê Grupo Conselheiro de Acessibilidade para Cinemas, formado pelos principais exibidores, distribuidores, ONGs de pessoas com deficiência e o governo.
Aparelhos acessíveis nos cinemas do Brasil
De acordo com Rosaria, o acesso às produções audiovisuais seria facilitado se os filmes e as sessões fossem distribuídos com legenda, esses recursos iriam fornecer condições de acesso mais universais. A professora explica que existem aparelhos que são ligados diretamente ao dispositivo individual do usuário e que existem equipamentos adicionais que podem ser solicitados para uso e disponibilizados pelos cinemas.
“A pessoa precisa se informar, solicitar com antecedência, testar o equipamento para poder utilizar, então depende muito efetivamente dos cinemas estarem preparados para prover os usuários desse equipamento. Então, certamente, a falta desses equipamentos pode afetar o acesso dessas pessoas, mas eu acho que, antes de tudo, falta uma comunicação efetiva de que existem esses equipamentos e que devem ser providos pelas salas de cinema,” afirma a professora.
Análise social de inclusão
Rosaria discorre que equipamentos auditivos e outros de tecnologia assistiva podem ser distribuídos nos cinemas, mas essa questão depende da demanda. O público que precisa desses aparelhos pode não saber que o cinema fornece essa acessibilidade e, portanto, não ir ao cinema. Com o público que detém deficiência visual e/ou auditiva deixando de acessar esses espaços, os exibidores não veem demanda para prover esses recursos.
A especialista ressalta que o problema é anterior às necessidades de aparelhagem e que advém da falta de pessoas deficientes nos cinemas. A questão se pauta também no acesso que esse público possui para usufruir do entretenimento. A professora afirma que falta uma comunicação mais assertiva de conscientização social.
“São elementos que vão sendo agregados à medida que nós tenhamos uma comunicação efetiva e uma conscientização de toda a sociedade. No entanto, talvez a questão seja sobre o quanto as pessoas têm acesso ao cinema, para poder usufruir das condições de acessibilidade nesse tipo de entretenimento. Existe um trabalho mais amplo a ser feito, para que se garanta que essas pessoas possam chegar ao cinema, que eu acho que é uma primeira questão,” reflete a professora.
Rádio USP
Ouça a entrevista sobre o tema levada ao ar na primeira edição do Jornal da USP no Ar desta segunda-feira (29/01) :
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
(Texto atualizado em 29/01, às 8h00)
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