Dando continuidade à série em comemoração ao Dia Mundial da Água, a Rádio USP traz mais um episódio para expor a importância desse recurso vital para a vida no planeta. Desta vez, o foco recai sobre as primeiras iniciativas para o uso ordenado da água, delineadas durante a transição do Brasil rural para o Brasil urbano, ocorrida entre a segunda metade do século 19 e a primeira metade do século 20.
Nesse período, a preocupação predominante não era ambiental, mas sim a necessidade de gerar energia hidrelétrica para suprir as demandas das cidades em rápido crescimento e industrialização. Esse cenário marcou o surgimento das primeiras regulamentações sobre o uso dos recursos hídricos.
Em 1934 foi publicado o Decreto 24.643, que aprovou o Código de Águas Brasileiro, documento que priorizava, sobretudo, a geração de energia elétrica. “Naquela época, a produção de bens era a principal prioridade. Foi a partir desse marco legal que começou a mudança nos conceitos relativos ao uso e à propriedade da água”, explica Ana Paula Pereira Carvalho, engenheira ambiental e pós-doutoranda do Programa USPSusten, sediado na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP em Pirassununga.
Durante seis décadas, o Código de Águas Brasileiro atendeu às necessidades do País. No entanto, nos anos de 1990, o assunto voltou a ser discutido pelas autoridades. Segundo Ana Paula, o Brasil percebeu que era necessário atualizar e formular uma legislação que fosse realmente destinada à gestão dos recursos hídricos.
Assim, baseado no modelo francês, foi publicada a Lei federal 9.433 de 1997, definida como a Política Nacional dos Recursos Hídricos, conhecida também como Lei das Águas. “Essa é uma lei bem completa, em seu artigo 5º ela traz seis instrumentos de gestão para assegurar o uso adequado dos recursos hídricos, dentre eles: os planos de recursos hídricos, o enquadramento dos corpos de água, a outorga dos direitos de uso, a cobrança pelo uso.”
Recursos para recuperar as bacias hidrográficas
Ana Paula destaca que a implementação completa da cobrança pelo uso da água ainda não foi alcançada, e enfatiza sua importância. “Seu propósito é direcionar recursos provenientes dessa cobrança para a recuperação das bacias hidrográficas, incentivando o investimento em despoluição e promovendo a adoção de tecnologias mais limpas.” Ela ressalta, ainda, que há muito a ser feito para garantir a efetiva implementação de todos os instrumentos da política nacional dos recursos hídricos no futuro.
A professora Tamara Maria Gomes, do Departamento de Engenharia de Biossistemas da FZEA, afirma que os valores cobrados são estabelecidos pelos Comitês de Bacias Hidrográficas e, para determinar o valor a ser cobrado, os comitês analisam as características da região e a finalidade de cada uso. “Os valores são simbólicos, em torno de um a dois centavos para cada mil litros de água e são aplicados para a retirada, para o consumo e também para o lançamento dos esgotos.”
No Estado de São Paulo, por exemplo, apenas no ano passado a cobrança do uso da água foi implementada por completo. Segundo Tamara, o Estado de São Paulo possui 22 unidades de gerenciamento de recursos hídricos e todas já implantaram a cobrança. “As duas primeiras a implantar a cobrança foram a Bacia do PCJ (Piracicaba, Capivari e Jundiaí) e a Bacia do Paraíba do Sul, ambas no ano de 2007. Já a última a implantar esse pagamento foi a Bacia do Litoral Norte, em 2023.”
Para concluir, Tamara ressalta a expectativa de que essa medida leve os usuários dos recursos hídricos a cultivarem uma nova mentalidade, reconhecendo a água como um recurso vital e finito.
Por: Rose Talamone e Ferraz Jr.
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