O papel da água na homeopatia

Alvaro Vannucci é professor Livre Docente aposentado do Instituto de Física da USP

 19/05/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 26/05/2017 as 12:02
Alvaro Vannucci – Foto: via Youtube

Prezado Colega (Beny Spira),

Li no jornal O Estado de S. Paulo (na Internet) seus comentários sobre Homeopatia.

Pela opinião expressada, creio que o caro professor provavelmente não conhece muito a fundo o assunto que, sem dúvida, é bastante controverso.

Penso, porém, que eu poderei ajudar a refletirmos mais profundamente sobre o tema, trazendo ao seu conhecimento trabalhos e publicações científicas relevantes.

Em primeiro lugar, o que a grande maioria das pessoas desconhece – incluindo aí os cientistas de várias áreas – é que a substância “água” não pode ser considerada simplesmente como moléculas H2O sem interação mútua de qualquer espécie. Na verdade, essa molécula é fortemente polar e forma conglomerados (clusters) de diferentes configurações, que alteram profundamente suas propriedades físico-químicas (ver refs. 1 e 2 abaixo).

Já se contam às centenas os artigos publicados nas mais conceituadas revistas internacionais que buscam estudar a estrutura intrínseca da água, tanto por simulações computacionais e estudos teóricos (refs. 3 e 4, por ex.), como através de trabalhos experimentais (refs. 5 e 6, por ex.).

No caso particular de estudos que mostram que soluções ultradiluídas (até 10^-30, base para a confecção de medicamentos homeopáticos) possuem propriedades físicas bastante diferentes comparativemente à água pura (refs. 7 a 10, por ex). No Instituto de Física da USP, uma Tese de Doutorado foi produzida abordando esse assunto e os resultados foram aceitos para publicação (ref. 11).

Mais recentemente foi também publicado o artigo do prêmio Nobel de Medicina (de 2008) Prof. Luc Montagnier, que mostra resultados experimentais seguros, atestando que uma solução ultradiluída pode apresentar comportamento bastante surpreendente (ref. 12).
Agora, com respeito à atuação medicamentosa das soluções homeopáticas, que correspondem a soluções ultradiluídas, constatamos que há diversos trabalhos publicados a favor e contra, estimulando um debate científico  que, a meu ver, está longe de chegar ao fim. Mais estudos e pesquisas científicas ainda são necessários.

Ainda, se lembrarmos que quantidades extremamente diminutas de substâncias tidas como inofensivas (como o amendoim, por ex.) pode levar a complicações orgânicas extremamente severas em pessoas sensíveis (ref. 13, por ex.) ou que feromônios (praticamente indetectáveis) alteram vigorosamente o comportamento de animais e pessoas (ref. 14, por ex.), por que descartar apressadamente a possibilidade da Homeopatia ser de fato um tipo de Medicina que funciona, inclusive, sem os efeitos colaterais observados em vários tratamentos Alopáticos?

Espero ter ajudado.

REFERÊNCIAS:

1) Ball P. – “Water – an Enduring Mystery”, Nature 452 (2008) 291-292.
2) Stillinger F. H. – “Water Revisited”, Science 209 (1980) 451-457.
3) Silva E.S.A., Duarte H.A. and Belchior J.C. – “An Approach Based on Genetic Algorithms and DFT for Studying Clusters:
(H2O)n  (2≤n≤13) Cluster Analysis”, Chemical Physics 323 (2006) 553-562.
4) Giudice E.D. – “Water as a Free Electric Dipole Laser”, Physical Review Letter 61 (1988) 1085-1088.
5) Stewart G.W. – “X-Ray Diffraction in Water: The Nature of Molecular Association”, Physical Review 37 (1931) 9-16.
6) Saito S. and Ohmine I. – “Translational and Orientational Dynamics of a Water Cluster (H2O)108 and Liquid Water:
Analysis of Neutron Scattering and Depolarized Light Scattering”, The Journal of Chem. Physics 102 (1995) 3566-3579.
7) Elia V. and Niccoli M. – “New Physico-Chemical Properties of Extremely Diluted Aqueous Solutions”, Journal of Thermal Analysis and Calorimetry 75 (2004) 815-836.
8) Rey L. – “Thermoluminescence of Ultra-High Dilutions of Lithium Chloride and Sodium Chloride”, Physica A 323 (2003) 67-74.
9) Roy R., Tiller W.A., Bell I. and Hoover M.R. – “The Structure of Liquid Water; Novel Insight from Materials Research; Potential Relevance to Homeopathy”, Materials Research Innovation 9 (2006) 98-103.
10) Lobyshev V.I., Shikhlinskaya R.E. and Ryzhikov B.D. – “Experimental Evidence for Intrinsic Luminescence of Water“, Journal of Molecular Liquids 82 (1999) 73-81.
11) Miranda A.R., Vannucci A. and Pontuschka W.M. – “Impedance Spectroscopy of Water in Comparison to High Dilutions of Lithium Chloride”, Materials Research Innovations vol 15 no 5 (2011) 302-309.
12) L. Montagnier, J. Aissa, S. Ferris, et al. – “Electromagnetic Signals are Produced by Aqueous Nanostructures Derived from Bacterial DNA Sequences“, Interdisciplinary Science Comput. Life Science 1 (2009) 81-90.
13) Hourihane J.O.B., Kilburn S.A. et al. – “An Evaluation of The Sensitivity of Subjects with Peanut Allergy to Very Low Doses of Peanut Protein: A Randomized, Double-Blind, Placebo-Controlled Food Challenge Study”, Journal of Allergy and Clinical Immunology 100 (1997) 596-600.
14) Takahashi L.K., Nakashima B.R. and Watanabe K. – “The Smell of Danger: A Behavioral and Neural Analysis of Predator Odor-Induced Fear”, Neuroscience and Biobehavioral Reviews 29 (2005) 1157–1167.


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.