Museu Republicano de Itu abre exposição “Antonio Candido na coleção Edgard Carone”

Marisa Midori Deaecto é professora da Escola de Comunicações e Artes e pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados-USP

 11/09/2018 - Publicado há 6 anos
Foto: Marcos Santos/USP Imagens

No capítulo dos agradecimentos, devo começar pelo meu fraternal companheiro Edgard Carone, a quem devo a oportunidade das estadias em Bofete e uma infatigável solicitude, que tornou possível a pesquisa*.

Os Parceiros do Rio Bonito, estudo clássico de Antonio Candido sobre os meios de vida caipira, foi concebido no município de Bofete, no interior do Estado de São Paulo. Os trabalhos e os dias na Fazenda Bela Aliança, passados, com intervalos, entre os anos de 1948 e 1954, renderam ao autor a vivência necessária entre a gente simples, o que lhe permitiu colher a matéria bruta de sua pesquisa de campo, mas também o aprofundamento de uma amizade semeada há, pelo menos, uma década.

O encontro de Edgard Carone com Antonio Candido se deu em 1942, quando estava em vigor o Estado Novo, implantado por Getúlio Vargas. Nessa época, seu irmão mais velho, o historiador e militante comunista Maxim Tolstói Carone, fora preso. Edgard, um jovem estudante do curso de História e Geografia da USP, passa a acompanhar sua cunhada pelas casas de parentes e amigos em busca de socorro. Como ele mesmo relata em uma entrevista: “Mas a desgraça de um, é a felicidade do outro […] Nós fomos à casa de Paulo Emílio Sales Gomes […] Fomos à do Antonio Candido, do Azis Simão, do Costa Correa e de uma série de outras pessoas conhecidas”[1].

Nasceu desse primeiro encontro uma amizade longeva, que atravessou mais de meio século de história. No interlúdio vivido na Fazenda Bela Aliança – que Edgard Carone herdara de seu pai, e onde viveu com sua família por doze anos – germinaram leituras, pesquisas, livros e um projeto de estudos que se concretizaria na mais completa e original história da república brasileira, publicada em 13 volumes.

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O recado dos livros

Nesses 30 anos recebi doações de Paulo Emílio, Antonio Costa Corrêa e a de muitos outros. O grosso do conjunto são os adquiridos no Brasil e no estrangeiro, catados um a um em livrarias e sebos. Só assim é possível a organização de uma biblioteca ampla, com trabalhos editados no passado e no presente*.

Edgard Carone logrou colecionar duas bibliotecas notáveis, tanto por sua coerência temática, quanto pela quantidade de volumes reunidos. A primeira nasceu no final da década de 1950, na Fazenda Bela Aliança. Entre a lida no campo e as leituras desinteressadas, nasce o projeto de estudo da história do tenentismo, o qual se converterá em uma história da república brasileira. Assim, não demorava a tomar forma sua coleção republicana.

Mais tarde, o interesse do historiador se amplia para a história do movimento operário, brasileira e internacional. Os resultados dessas investigações foram apresentados em publicações várias e, evidentemente, eles também se converteram em uma coleção bibliográfica e documental de fôlego.

Mas podemos dizer que a Biblioteca Edgard Carone conforma sistemas de interesses bastante heterodoxos, que vão do cinema à literatura.

Cumpre igualmente ressaltar que os amigos habitam esse espaço extremamente rico e democrático de sua biblioteca.

Assim, as publicacões de Antonio Candido, não raro dedicadas ao casal Edgard e Flávia Carone, guardam no registro certeiro e firme da escrita à mão, aquele momento singular e ritualístico do anúncio de um exemplar quentinho, que acabara de sair do prelo. Não, não se trata do ritual público do lançamento, mas do gesto contido de uma visita, de reconhecimento e elogio à amizade que se estende a toda a família.

Nessa bela exposição, destinada a celebrar os livros e os amigos, somos convidados a conhecer um pouco da produção bibliográfica de Antonio Candido. Um pouco, porque, afinal de contas, o autor de Formação da Literatura Brasileira, Literatura e Sociedade, entre tantos outros livros e textos de intervenção, deixou uma produção substanciosa, cujas referências ocupariam bem alguns volumes.

Portanto, mais vale se deixar levar pelos próprios livros, ver e ouvir os recados que eles têm para nos dar.

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Serviço

O Museu Republicano de Itu/USP convida para a abertura da exposição:

Antonio Candido na Coleção Edgard Carone, em 18/9/2018, às 19h

  • Palestra: Candido e Carone: um elogio à amizade, pela profª drª Marisa Midori Deaecto (ECA/USP).

* Antonio Candido, “Prefácio”, Os Parceiros do Rio Bonito. Tese apresentada ao concurso da cadeira de Literatura Brasileira da FFCL da USP. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1945, 224 p.

[1] Entrevista concedida a Marisa Midori Deaecto e Andrea Paula dos Santos, Revista Temporaes – Dossiê “Intelectualidade e Militância”, 1995.

 


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