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O caso Marielle Franco, vereadora da cidade do Rio de Janeiro assassinada juntamente com seu motorista, Anderson Gomes, em 2018, chegou a uma conclusão com a condenação dos mandantes, os irmãos Francisco e Domingos Brazão, além do ex-chefe da polícia civil do Rio, Rivaldo Barbosa. Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP e autor do livro e podcast República das Milícias, explica melhor o contexto e as motivações do crime, o que são as milícias do Rio e se elas podem se expandir para o restante do País.
Como surgiram as milícias?
As investigações da Polícia Federal mostraram que o assassinato de Marielle foi executado por uma milícia, grupo armado que disputa o território do Rio de Janeiro. O pesquisador explica melhor como as milícias, também chamadas de grupos de extermínio ou polícias mineiras, surgiram: “Tem uma ligação muito antiga da polícia com a contravenção, desde os anos 40, 50, quando o Rio de Janeiro era Capital Federal. Com a chegada do tráfico de drogas, houve um acirramento do controle territorial armado como modelo de negócio do crime, várias facções controlando territórios da cidade para vender drogas no varejo”.
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Os grupos armados paramilitares então surgem como um modelo de “defesa comunitária” armada contra o tráfico em expansão: “A milícia surge nesse processo histórico nos anos 2000, tentando exercer um controle territorial armado a partir de uma série de negócios na Zona Oeste do Rio, argumentando que assim faria uma autodefesa comunitária contra a expansão das facções, que estavam mais concentradas nas zonas Norte, Sul e Centro do Rio de Janeiro”, explica Paes Manso.
A partir disso, os grupos passaram a participar da disputa de territórios da cidade com as facções, usando da construção e venda de empreendimentos imobiliários, aliciamento de moradores e comerciantes, “gatonet” e outras formas características de controle paramilitar. Os grupos também passaram a exercer influência política na Câmara Municipal do Rio, com o controle de votos e a formação de currais eleitorais.
A motivação do crime
Embora seja certo que o crime tenha ligação com as milícias, a Polícia Federal ainda trabalha para apurar a motivação exata. Para o ministro da Justiça Ricardo Lewandowski, a execução ocorreu por um atrito entre Marielle e o grupo paramilitar na Câmara: “A vereadora teria pedido para a população não aderir aos novos loteamentos situados em áreas de milícia. Ao que tudo indica, ela se opunha claramente a esse grupo na Câmara Municipal do Rio, que iria regularizar essas terras para usá-las com fins comerciais, enquanto o grupo da vereadora queria utilizar essas terras para fins sociais, moradias populares”, explica o pesquisador do NEV.
Mas Bruno explica que apenas a oposição à regularização desses loteamentos controlados pela milícia pode não ser motivação suficiente para o assassinato: “Ela não apresentava uma ameaça de curto prazo em relação aos negócios mais concretos da milícia, mas havia todo um contexto de disputa política que ajuda a compreender algum tipo de recado que eles tentassem passar. A proximidade de eleição ou uma disputa que o PSOL [partido de Marielle] vinha fazendo na Assembleia Legislativa formam um contexto político amplo. O próprio Domingos Brazão tinha sido afastado por algumas operações da Polícia Federal”, expõe Bruno.
As milícias podem se expandir?
Segundo o pesquisador, a expansão das milícias está intimamente relacionada com a disputa contra o crime organizado e as zonas de tráfico de drogas no Brasil: “O Brasil vem exercendo um papel como corredor de renda de drogas para o resto do mundo, e a partir da articulação das facções com bases prisionais isso aumentou. Você tem uma maior capacidade do Brasil de vender drogas para o resto do mundo. Está entrando dinheiro em dólar, isso entra na economia, é lavado e esquentado, passa a financiar a campanha e passa a gerar emprego”, expõe o autor.
Com a expansão dessas facções criminosas, o modelo de combate atual gera polícias cada vez mais letais, o que contribui para a formação de grupos policiais paramilitares: “As próprias polícias, em decorrência do aumento de dinheiro entrando nesse mercado, estão sendo desviadas e participando de quadrilhas. Por outro lado, há descontrole das polícias. Uma força policial que mata muito, o passo seguinte é que ela adentre o mercado do crime. É um poder muito forte, que faz uma diferença muito grande na cena criminal, essa carta branca para matar, o poder sobre a vida e a morte das pessoas”. explica Bruno.
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