Luis Antonio Bittar Venturi – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
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Segundo Platão, “a mesma luz (Sol) que ilumina, cega”. Será que nos cegamos para esta luminosa insensatez? Ou estaríamos tão cabisbaixos que não enxergamos o que se passa acima de nossas cabeças…? Se este problema ocorre de forma premeditada para aumentar a arrecadação das empresas, então não podemos chamar de insensatez, mas de uma “racionalidade perversa”. Mas se ele deriva da incompetência dos gestores (públicos e contratados)… então, pobres de nós que, afinal de contas, pagamos as contas.
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A ineficiência energética pode ser gerada no projeto, na manutenção ou na operação dos sistemas. Neste nosso caso, o projeto é bom, pois usa lâmpadas mais econômicas com sensores que programam o acionamento ou desligamento das lâmpadas; a manutenção também parece ser boa, e assim deve ser já que o sistema só vai gerar lucro se funcionar. O problema reside, então, na operação, pois os sensores deveriam ser regulados para que as lâmpadas se apaguem no crepúsculo matutino e se acendam no ocaso. Mas parece que não é o caso… Este fenômeno de ineficiência energética também foi eficientemente constatado em diversas outras cidades do País, como Rio de Janeiro, Guarujá, Teresina, Brasília… mostrando que esse é um problema generalizado e constante.
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A quem recai a responsabilidade é uma questão complexa e meio… obscura. Segundo Ricardo Guedes, da Secretaria de Energia e Mineração do Estado de São Paulo, a Constituição Federal atribui a responsabilidade da iluminação pública às prefeituras. Estas, porém, podem escolher se fazem a manutenção elas próprias, ou se contratam uma empresa para cuidar disso, ou ainda se repassam essa responsabilidade para uma concessionária distribuidora. Assim, para cada município deve-se saber como a iluminação pública é gerida para se conhecer os responsáveis pela má gestão. Contudo, segundo Guedes, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), por meio das Resoluções 414/10 e 479/12, buscou fazer valer a Constituição e, atualmente, a grande maioria dos municípios brasileiros assume diretamente a gestão e manutenção da iluminação pública, restando às concessionárias apenas a distribuição. Ressalta-se, porém, que está no Congresso Nacional o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 1428/13, do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), que suspende essa obrigatoriedade de transferência da iluminação pública aos municípios.
No caso do município de São Paulo, a prefeitura atribuiu à empresa ILUME (tel. 0800 779 0156) essa responsabilidade, que envolve trocas de lâmpadas, regulagens de sensores etc. A AES Eletropaulo seria responsável apenas pela distribuição da energia elétrica e pelos reparos de problemas de cortes, como fios partidos, enfim, falta de energia em geral. No caso de Itapecerica da Serra, a prefeitura contratou a ENGELUZ (tel. 0800-7792000) para fazer essa manutenção.
Ocorre que o problema não parece ser de manutenção, já que o sistema funciona, ou seja, as luzes acendem. Só que não acendem nem apagam na hora certa, o que configura uma ineficiência de operação do sistema. De qualquer forma, ao contatarmos a ENGELUZ (cuja sede fica no interior do Estado do Paraná!), fomos requisitados a abrir um pedido de serviço com dados detalhados, como local, horário etc., para que enviassem uma equipe técnica.
Tudo bem que cada cidadão deva fazer sua parte, mas não seria a prefeitura quem deveria fiscalizar os serviços da empresa que contrata e paga? Imaginem se a cada vez que virmos lâmpadas de postes acesas durante o dia precisarmos, ali mesmo, ligar e abrir um pedido de reparo. Além disso, como é que uma companhia responsável pela manutenção da iluminação pública não dispõe da informação de onde as luzes estão acesas e onde estão apagadas?
Reparem que nas nossas contas de luz, no campo “Outros produtos e serviços” há um item (CIP) que se refere a uma taxa de iluminação pública, cujo valor é decidido pelas prefeituras. A AES Eletropaulo, concessionária da região, apenas arrecada esta taxa e a repassa para a prefeitura, a qual deverá (ou deveria) usar este recurso apenas para a melhoria da iluminação pública. Ou seja, quem paga a conta é sempre o usuário final. Os cidadãos são cobrados a economizar e a usar racionalmente os recursos (água, em época de crise de gestão hídrica) e energia (como na época do apagão elétrico de 2001). Mas o poder público parece não fazer sua parte, nem mesmo o setor privado.
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Uma vez que arcar com custos de luzes que ficam acesas durante o dia configura mau uso de dinheiro público, caberia aqui uma ação civil pública e uma ampla campanha pelo uso racional e justo da energia elétrica. Quando estiver na rua, comece a reparar e você se surpreenderá com a claridade do problema. Denuncie! Mande suas fotos, se possível com endereço, dia e horário. Precisamos trazer à luz essa eficiente irracionalidade energética!
Uma luz no fim do túnel
De acordo com Marco Aurélio L. Villela, geógrafo e analista de políticas públicas e gestão governamental da prefeitura, São Paulo ainda está longe de ser uma cidade inteligente, no sentido de monitorar em um SIG (Sistema de Informação Geográfica) todas as redes de infraestrutura urbana, incluindo a iluminação pública, com informações sobre o tipo de lâmpada, idade, problemas que já ocorreram naquele ponto, se está acesa ou apagada etc.
Todos estes dados alimentariam um cadastro consistente que seria atualizado permanentemente ao se registrar cada serviço realizado em determinado local. Porém, ainda temos que obter as informações pessoalmente, in loco, o que é pouco eficiente, razão pela qual os reparos são demorados.
Mas no meio desse obscurantismo, há uma luz no fim do túnel. Segundo Villela, o Guia de Serviços da Prefeitura de São Paulo, criado na gestão de Luiza Erundina, foi recentemente atualizado e incrementado, transformando-se no Portal SP156, que dispõe de muitos serviços úteis, inclusive o de “Reparo de Lâmpada” (https://sp156.prefeitura.sp.gov.br/portal/?tema=559&assunto=667&servico=853) que pode ser acionado quando houver lâmpada apagada, oscilando ou acesa durante o dia! Esse portal dispõe de um aplicativo de mesmo nome que pode ser baixado em smartphones, pelo qual o cidadão pode acionar o serviço da rua mesmo, inclusive anexando fotos do local com problema.
Se nossa cidade ainda não é inteligente, pelo menos nossos telefones já o são, e se transformam em um interessante instrumento para o exercício da cidadania, ao facilitar a participação do cidadão, ajudando a prefeitura a ser mais eficiente.