Nos últimos dias, a mídia internacional deu muita ênfase ao golpe no Níger. Essa é a questão. Por que a reviravolta em um pequeno país africano ganhou tanto destaque? Porque o golpe militar que depôs o presidente Bazoum sinaliza uma trágica possibilidade: o nascimento de um “pan-Estado clandestino”, a “Wagnerlândia”. Isto é, a instauração de regimes tutelados por Prigozhin e seus asseclas do grupo Wagner. E a ampliação da esfera de influência do Kremlin no continente (pois Putin e Prigozhin continuam irmãos siameses, apesar da encenação do motim e da briga entre eles).
É por isso que se vê tanta bandeira russa nas manifestações de rua em apoio ao golpe, em Níger. E que tantos países estão alarmados. Principalmente os africanos (como Nigéria e Senegal), que deram um ultimato, fracassado, para os golpistas recuarem (as exceções são Burkina Faso e Mali, ditaduras que apoiam o golpe e cujos PIBs são um grão de areia). A junta militar de Níger, porém, fechou o espaço aéreo e não quer conversa com delegações da ONU, da União Africana ou do Cedeao (a comunidade econômica dos países da África Ocidental).
O que seria esta “Wagnerlândia”? A consolidação de um poder paralelo que o Wagner vem construindo, há anos, na África. O regime da Wagnerlândia é uma meridiana aberração: os mercenários do Wagner protegem os golpistas em troca de pagamento em extração de minérios, tolerando e até acobertando grupos terroristas como o Daesh (Isis) e congêneres. O risco imediato é o de que haja uma contaminação de toda região do Sahel (aquele cinturão abaixo do deserto do Saara que vai do Atlântico ao Mar Vermelho) e uma propagação, para os países vizinhos, do terrorismo islâmico sunita (que, insistimos, não deve ser confundido com o Islã). Pior: Níger, agora um protetorado do Wagner, é rico em urânio, indispensável para bombas atômicas.
Conflito e Diálogo
A coluna Conflito e Diálogo, com a professora Marília Fiorillo, vai ao ar quinzenalmente sexta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9 ) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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