Anomalias climáticas vieram para ficar e têm levado a um aumento de casos de adoecimento

Paulo Saldiva diz que seria necessário uma política pública relacionada às mudanças de temperatura de precisão para alterar essa situação

 07/08/2023 - Publicado há 1 ano

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Acho que todos nós percebemos que a temperatura está mudando, alternando períodos de frio com dias de intenso calor. Essas anomalias climáticas vieram para ficar e têm levado a um aumento de casos de adoecimento que necessitam, por vezes, de admissões hospitalares e infelizmente levam também a um aumento da mortalidade. Quando saímos da nossa zona de conforto, quando chegamos no sistema de temperatura, o organismo lança mão de alguns mecanismos de adaptação. Isso implica rearranjo da frequência cardíaca, da taxa de filtração renal, da síntese dos hormônios reguladores, como o hormônio tireoidiano, adrenalina e cortisol. 

O pulmão tem uma grande superfície, mais ou menos 100 metros quadrados. Ele tem que lidar com essa, digamos, variabilidade de temperatura. Imagina nosso corpo a 37 graus e na rua está a 10°c. Como ele aquece o ar para isso chegar dentro dos alvéolos e fazer troca gasosa? Esse estresse fisiológico faz com que as pessoas que tenham doenças cardíacas, doenças respiratórias, doenças renais e sejam as vítimas principais dessas alterações temperaturas, chegando a adoecer e, eventualmente, morrer.

Há também os extremos de idade: as crianças, cujo sistema de regulação de temperatura ainda não esteja muito definido, muito maduro; e os idosos, onde por força do diabete, da aterosclerose, não conseguem regular o fluxo de sangue na pele e, eventualmente, tendo um coração comprometido, não vão poder fazer frente de forma adequada às demandas que lhe são impostas. Mas o mais importante é que além desses aspectos biológicos, ou seja, pertinentes à saúde de cada indivíduo, a cidade também varia a sua temperatura de superfície por força da ocupação do solo, da taxa de cobertura vegetal e também a vulnerabilidade dos seus habitantes, que normalmente têm mais dificuldade nas regiões vulneráveis da cidade de controlar as doenças crônicas que possuem. É uma equação complicada, mas cada cidade tem a sua zona de conforto térmico e dentro de uma cidade grande, como São Paulo, as suas regiões, seus distritos e algumas regiões dentro de cada distrito respondem com maior ou menor intensidade.

Assim como tem a medicina de precisão onde você vai fazer o tratamento de uma doença específica para uma pessoa, que nós tenhamos que fazer uma política pública relacionada às mudanças de temperatura também de precisão. A partir da cobertura vegetal, da taxa do vencimento, da distribuição demográfica, as medidas de proteção que têm que ser tomadas para aumentar a resiliência desses segmentos terão que ser personalizadas. Isso veio para ficar. Acredito que hoje existam métodos disponíveis em pesquisas para poder entender o que deve ser feito e eleger prioridades. O desafio é a implementação e isso é o que vai ser muito importante. Implementar o que já se sabe, visando ao resultado maior: a qualidade de vida, a saúde e o bem-estar dos nossos habitantes.


Saúde e Meio Ambiente
A coluna Saúde e Meio Ambiente, com o professor Paulo Saldiva, vai ao ar toda segunda-feira às 8h, quinzenalmente, na Rádio USP (São Paulo 93,7 ; Ribeirão Preto 107,9 ) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.

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