Universidade, inclusão e justiça social

Por Vahan Agopyan, reitor da USP

 23/11/2021 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 24/11/2021 as 18:00
Vahan Agopyan – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

 

 

As discussões para a renovação da Lei de Cotas (Lei 12.711, de 29 de agosto de 2012), com duração prevista de dez anos, as comemorações do mês da Consciência Negra e a outorga, pela Universidade de São Paulo, do título de Doutor Honoris Causa para o abolicionista Luiz Gama jogam luz ao debate sobre a importância de ações afirmativas e proativas para o combate à desigualdade.

A adoção de cotas sociais e étnicas para o ingresso nas universidades não é assistencialismo, nem esmola, tampouco concessão de privilégios a uma parcela da sociedade. Tem, sim, dois objetivos principais que não são devidamente expostos.

Sob o aspecto de justiça social, procura-se oferecer, a jovens promissores, condições de competição para ingressarem na universidade, preservando o mérito acadêmico. Não podemos frustrar esses jovens, e por isso, em particular a USP, por meio de ações de extensão universitária e em parceria com o governo do Estado, oferece oportunidades aos estudantes das escolas públicas para se prepararem melhor para os exames de ingresso (Fuvest e Enem).

Sob o ponto de vista acadêmico, é importante para a Universidade atrair os jovens talentosos, independentemente da classe social ou etnia. Como a legislação é extremamente restritiva em relação aos exames de seleção, a reserva de vagas é o meio viável. Além disso, as universidades que se preocupam com a formação cidadã dos alunos precisam ter corpos discentes heterogêneos e, por isso, as principais instituições do exterior, mesmo as que cobram anuidades elevadas, mantêm alunos bolsistas para garantir a diversidade.

As cotas são uma obrigação da sociedade com a atual geração de jovens e igualmente importantes para a melhor formação dos futuros profissionais e líderes nas universidades de destaque.

A USP implantou as ações proativas em 2006; a aceitação de ingressantes pelo Sisu em 2015, e depois de forma mais efetiva com as reservas de vagas, em 2017. É importante ressaltar que a Universidade adota, na seleção, o mérito acadêmico.

Nesse particular, estudo realizado pela professora Marta Arretche acompanhou 90 alunos cotistas, ingressantes em 2018 e escolhidos por sorteio, para não haver nenhum direcionamento. Esses alunos receberam bolsa de R$ 800 por mês, oferecidas por um banco, para se dedicarem aos estudos. A avaliação do aluno foi feita a partir de seu desempenho acadêmico e por relatórios regulares.

O resultado, até o momento, é promissor. A evasão ficou muito baixa entre os alunos cotistas —​ menor que a média — e o desempenho acadêmico foi destacado. No segundo semestre de 2019, na maioria dos cursos, a média de notas dos alunos bolsistas foi superior à dos ingressantes pela Fuvest não cotistas.

Conclui-se, então, que estamos selecionando alunos muito capazes e bons. Esses jovens precisam apenas de oportunidades para que possam demonstrar suas competências.

Outro ponto importante sobre esse tema diz respeito à permanência e à retenção desses estudantes na Universidade após sua admissão. A USP tem proporcionado condições para que eles possam concluir adequadamente seu curso de graduação. Para o próximo ano, está sendo proposto investimento de R$ 260 milhões em permanência estudantil. Atualmente, 15 mil alunos recebem algum tipo de bolsa, de um total de 25 mil benefícios oferecidos. Portanto, mais de 25% do alunato de graduação têm algum tipo de apoio. Além disso, a Universidade está buscando mais parcerias com empresas para patrocinar mais bolsas de estudo.

A adoção de reservas de vagas é uma consequência direta da situação atual de ensino público, principalmente do ensino médio. Nossa meta como sociedade deve ser a de lutar pela melhoria do ensino público, fundamental e médio, sempre considerando a reserva de vagas como um subterfúgio pontual e temporário.

(Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo, editoria Tendências / Debates, em 23/11/2021)


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