Escolha do novo presidente da Câmara não garante harmonia entre Executivo e Legislativo

Para Glauco Peres da Silva, questões como enxugamento de gastos, reforma tributária e o auxílio emergencial deverão ser revistas. “Essas são questões importantes que precisam ser decididas e que o governo deve prestar contas quanto a elas”

 04/02/2021 - Publicado há 3 anos

 

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O presidente Jair Bolsonaro apresentou uma lista de 35 propostas a serem priorizadas pelo Congresso no retorno aos trabalhos – Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados via Fotos Públicas

Após se empenhar muito na eleição de aliados nos comandos da Câmara e do Senado, o presidente Jair Bolsonaro apresentou uma lista de 35 propostas a serem priorizadas pelo Congresso no retorno aos trabalhos. Como será a nova relação? Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, o professor Glauco Peres da Silva, do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, discute o tópico.

Peres da Silva afirma que, “se por um lado, esperávamos que o governo tivesse formado uma coalizão no início do mandato, como os outros presidentes faziam e Bolsonaro se recusou a fazer, agora esta aproximação não acontece exatamente por iniciativa do Executivo”. Sendo assim, então, não seria o presidente a liderar a formação de uma coalizão, mas o Poder Legislativo se organizando para trazer o Executivo para perto.

Para o professor, esse arranjo, nunca antes visto, parece muito mais uma tentativa de fugir de problemas do que de criar uma agenda, pois considera que o governo Bolsonaro nem possui uma agenda muito clara, em diversas pautas. A aproximação é estratégica, portanto, no sentido de “se salvar”, como coloca Peres da Silva. Assim, o Poder Executivo evita que processos como CPI’s ou impeachments sejam encaminhados. Para isso, Jair Bolsonaro precisava de um presidente da Câmara que fosse seu aliado.

“Arthur Lira não é exatamente um aliado, é um aliado de última hora, mas também não é alguém que fará oposição, assim como Rodrigo Maia também não fez. Maia não era um opositor ao governo Bolsonaro, mas Lira é menos ainda”, diz o professor. Em sua visão, a relação não será harmoniosa e estável e é necessário acompanhar o caso para ver os resultados.

Bolsonaro abriu mão de um acordo partidário com o Legislativo e criou uma percepção de que este seria um vilão que o impedia de realizar seus projetos. “Isso não existe em um regime democrático. Não fazemos um ditador, elegemos um presidente que tem que respeitar as regras e há outros representantes legítimos como ele que serão respeitados e possuem um papel a cumprir. Isso não cabia na noção de nova política que ele propôs”, coloca Peres da Silva.

Como isso tudo afeta a população? Questões como enxugamento de gastos, reforma tributária e o auxílio emergencial serão revistas a partir de agora. Sobre isso, o professor diz que “essas são questões importantes que precisam ser decididas e o governo deve prestar contas quanto a elas”. “O cidadão tem capacidade de pressionar, de se manifestar. Vimos isso no Brasil nos últimos anos. A gente tem que ficar de olho e acompanhar, mostrar a insatisfação da forma que puder.”

O professor lembra que o exercício da democracia é um processo contínuo e não se dá apenas nas eleições. “Precisamos continuar prestando atenção, continuar cobrando para que tudo se encaminhe para um bom lugar, para que a população se veja mais satisfeita com o que acontece ali”, afirma.

Por fim, diz que, ao se aproximar dos parlamentares para conseguir a votação nos candidatos, Bolsonaro prometeu recursos, fez acordos – sejam legais ou ilegais – e agora deve começar a cumprir com sua palavra. “Os deputados vão cobrar, se ele não cumprir, o confronto começará a surgir. Isso que vamos ver nos próximos meses e isso será muito importante para certas medidas, como a do auxílio emergencial e a reforma tributária”.


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